Por Glauco Requião, advogado, consultor em sustentabilidade e criador do portal Postura Sustentável.
Constituição Federal Brasileira, em seu artigo 225, dispõe que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”. Isto segue justamente o pensamento ecológico majoritário, que sempre aludiu a natureza como algo a ser usado, tendo como única preocupação a sua forma de utilização. A economia convencional, chamada atualmente de “neoclássica”, também contribuiu e muito para a consideração do ambiente como algo a ser explorado.
As reações a esta exploração não demoraram a acontecer. Os professores Sarlet e Fensterseifer descrevem o movimento de reação à degradação ambiental como uma “crise ecológica com origem na intervenção do ser humano na Natureza”. Eles ainda propõem “profunda reflexão a respeito dos rumos civilizatórios que percorremos até hoje, bem como da direção que seguiremos no futuro. Nesse sentido, até mesmo para assegurar a possibilidade de um ‘futuro’ para as presentes e futuras gerações”[1] .
Seguindo a mesma linha de Sarlet e Fenterseifer é certo que o pensamento ecológico não se pode reduzir a uma série de respostas urgentes e parciais para os problemas que surgem por causa da degradação ambiental, do esgotamento das reservas naturais e da poluição. Mas sim, este pensamento deve se caracterizar como um olhar diferente. Será esse olhar diferente o caminho que o professor e filósofo britânico Roger Scruton, falecido no início de 2020, nos deixou como ensinamento?
Para ele a solução é o resgate do conceito grego de oikophilia. Ou seja, “a solução dos nossos problemas ambientais encontra-se aqui ou em lugar nenhum: ou nos voltamos para a contemplação do lar, e aprendemos a cuidar dele, ou continuaremos vagando sem rumo pelo tempestuoso mar de causas, agendas e pânicos, perseguindo objetivos pomposos”[2]
Logo, é a forma como nos relacionamos com o nosso ambiente que tem causado uma progressiva degradação e constante poluição ambiental, já que o que se vê é tudo em nome da evolução, bem-estar e progresso humano. E mais, sem limites territoriais, o que acabou por criar o que alguns estudiosos chamam de uma sociedade civil mundial
Diante de toda essa realidade, torna-se imprescindível que promovamos um intenso debate sobre a ecologia, abandonando a ideia de uso e de intervenção no meio ambiente, para dar lugar a uma realidade muito mais objetiva, advinda da nossa oikophilia, do nosso inseparável relacionamento com a natureza. As pessoas precisam debater e entender que um ecossistema em equilíbrio não quer dizer um ecossistema estático, mas sim um sistema dinâmico, que se modifica graças a interações entre as diversas espécies nele contidas, incluindo-nos, em um processo conhecido como coevolução.
Torna-se cada vez mais necessário ampliar o quadro de bem-estar humano para além dos espectros liberal e social, inserindo necessariamente a variável ecológica, somada à atribuição de valor intrínseco da natureza. Trata-se de uma abordagem conciliatória e integradora dos valores humanos e ecológicos, como duas faces da mesma moeda.
Nossa relação com a nossa casa comum e com todos que nela habitam deve despertar a consciência que devemos muito mais do que temos direitos. Essa nova proposta deve considerar ainda que atualmente é impossível que analisemos os problemas ambientais de forma autônoma, afinal impõe-se sua contextualização com as questões humanas, laborais, urbanas, sociais. Entendemos que uma nova ecologia deve ser integral, abordando claramente as dimensões humanas e sociais e que tenha como sua filha mais querida, a sustentabilidade.
[1] Direito Ambiental: introdução, fundamentos e teoria geral, pg. 35.
[2] Filosofia Verde: como pensar seriamente o planeta. pg 311