Política Nacional de Meio Ambiente completa 35 anos, mas Projeto de Lei 654/2015 pode impedir comemoração
Por Backer Ribeiro*
Este ano comemoramos 35 anos da Política Nacional do Meio Ambiente, lei ambiental criada em janeiro de 1981, a mais importante do gênero e um grande marco em termos de proteção ambiental. Essa política reconhece a importância do meio ambiente para a vida e para a qualidade da mesma, impondo ao poluidor a obrigação de compensar e/ou indenizar os prejuízos ambientais causados por ele.
A lei criou a obrigatoriedade dos estudos de avaliação do impacto ambiental, um avanço para um país em desenvolvimento. Entretanto, com discurso de combate a crise econômica, o Projeto de Lei 654/2015, de autoria do senador Romero Jucá (PMDB/RR), afrouxa as regras de licenciamento ambiental para obras consideradas estratégicas para o governo, como rodovias, hidrovias, portos, ferrovias, aeroportos e empreendimentos de telecomunicação e energia.
Na verdade, o que está propondo o Senado brasileiro é um retrocesso. Não se trata aqui de “flexibilizar” o licenciamento ambiental, e sim, de voltarmos a um tempo em que não existia licença ambiental, não existia lei que exigia um estudo ambiental para apontar quais os impactos previstos e como seriam compensados. Um tempo que a palavra “desenvolvimento” vinha cercada de grandes danos ambientais, até hoje irreversíveis, crimes que não encontraram seus responsáveis.
Lamentável que uma grande conquista brasileira esteja sendo destituída contrariando as lutas pela garantia dos direitos da população e uma melhor qualidade de vida. Que ditadura estão querendo implantar agora? Já que esse projeto de lei só interessa aos grandes grupos econômicos e aos políticos corruptos.
Não estamos tratando aqui de avanços na legislação ambiental brasileira, pressupondo proteção à vida e preservação do meio ambiente para o bem de todos. Estamos nos referindo a um projeto de lei que nem deveria ser chamado de “flexibilização ao licenciamento ambiental”, e sim de licenciamento puramente econômico, contrariando inclusive todos os avanços mundiais na luta pelo meio ambiente.
Historicamente, esses avanços nos remetem a junho de 1972, quando ocorreu a 1ª Conferência da ONU sobre o meio ambiente, que aprovou a Declaração Universal do Meio Ambiente, declarando que os recursos naturais, como a água, o ar, o solo, a flora e a fauna, devem ser conservados em benefício das gerações futuras. Após 10 anos é criada outra comissão na ONU que publica o documento “Our Common Future” (Nosso Futuro Comum), que apresentou um novo olhar sobre o desenvolvimento, definindo-o como o processo que “satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”.
Ao criar o conceito de desenvolvimento sustentável ele deveria ser a inspiração para o fortalecimento da legislação brasileira, o processo de licenciamento deveria caminhar para uma quebra de paradigma, para um “Licenciamento Socioambiental”, não retroceder! A partir desse resgate histórico, pode-se perceber o tamanho do retrocesso que o Senado brasileiro propõe.
O modelo de licenciamento ambiental no Brasil já carece de uma boa revisão, é obsoleto frente às necessidades do padrão de desenvolvimento atual, não se atualizou desde que foi implantado e não compreende em seu escopo as medidas para um modelo de desenvolvimento sustentável.
No modelo atual de desenvolvimento, onde o que importa é o crescimento econômico, as questões socioambientais são relevadas a um segundo plano, os estudos de impacto ambiental se esquecem das populações que são impactadas direta e indiretamente. As audiências públicas, que hoje são uma mera formalidade nos processos de licenciamento ambiental, na proposta do Senado passariam a deixar de ser obrigatórias.
Mas é preciso dar nome aos bois e fazer uma pergunta que não quer calar. Qual o conhecimento e vivencia do senador Romero Jucá, do PMDB de Roraima, para ser o relator do projeto? Por uma questão de coerência, não deveria ser nomeado relator um senador da região sudeste ou sul do país, as que mais sofrem com os impactos da urbanização e com a implantação das grandes obras de infraestrutura que tanto agrediram e agridem ao meio ambiente?
Quem irá cobrar o senador Romero Jucá em Roraima, um paraíso preservado com uma das melhores qualidades de vida no Brasil? Digo mais, os senadores de São Paulo, José Serra, Marta Suplicy e Aloisio Nunes, precisam assumir suas responsabilidades. Há uma linda história e luta ambiental surgida nos anos 80 que precisa ser preservada.
Há anos lecionando e trabalhando para o licenciamento ambiental de alguns empreendimentos em São Paulo, aprendi que um processo precisa da participação de todos para dividir responsabilidades. É importante discutir com todos os envolvidos os diferentes aspectos do empreendimento ao longo do processo, não somente nas audiências públicas.
É importante estabelecer desde o início uma relação de confiança entre todas as partes interessadas, com um relacionamento transparente e um bom plano de comunicação, um projeto de licenciamento ambiental poderá ser lapidado, e prevenir falhas ao longo da sua implantação. Só com esse trabalho conjunto é possível uma “licença social”, que garantirá um desenvolvimento sustentável. (Revista Ecológico/ #Envolverde)
* Backer Ribeiro é relações públicas e associado da Communità Comunicação Socioambiental.
** Publicado originalmente na Revista Ecológico.