Por Dal Marcondes, para a Fundação Konrad Adenauer –
A pauta ambiental é apenas tangenciada na eleição deste ano. Citações vagas e algumas promessas vazias com declarações de boa vontade sem dados, datas, método ou recursos
Existem dois Brasis antagônicos quando o tema é meio ambiente. Um onde as pessoas acreditam que a questão ambiental é apenas uma externalidade da vida urbana, e não tem peso real no palco das grandes decisões econômicas ou de infraestrutura, ou pior, que o cuidado com o meio ambiente atrapalha as atividades econômicas; outro, onde as pessoas creem que a preservação ambiental é uma condição estrutural para a relevância do Brasil no cenário internacional e para a sobrevivência da humanidade. Pode ser que haja ainda mais um viés, onde as pessoas enxergam a complexidade das relações ser humano/natureza e, no entanto, se mantêm em silêncio. Por algum motivo, não querem se “envolver em política”.
Como de hábito nas eleições no Brasil, há uma grande diversidade de candidatos, mas agenda ambiental apenas tangencia os discursos políticos dos diversos partidos. E, mesmo aqueles que já ocuparam a presidência, olham para estas questões de maneira defensiva. Estão preocupados com repercussões internacionais negativas pela falta de cuidado com o patrimônio ambiental do país.
As eleições deste ano são muito mais abrangentes do que simplesmente para a Presidência da República. Serão eleitos também 27 governadores, 27 senadores, 513 deputados federais e 1.059 deputados para todas as assembleias estaduais. Com a concentração do foco da propaganda para os cargos majoritários há pouca atenção dos eleitores com a formação dos legislativos federal e estaduais, onde são formuladas as leis de proteção e uso dos recursos naturais do país. São nesses espaços legislativos onde se trava a luta a favor ou contra políticas de garantias de direitos e preservação ambiental.
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Artigo 225 da Constituição Brasileira
Mesmo com as garantias explicitadas no Capítulo de Meio Ambiente da Constituição de 1988, considerado bastante avançado, muito se decide no dia a dia do Congresso e das assembleias estaduais, onde interesses paroquiais se sobrepõem às necessidades da sociedade e do país. Há setores econômicos que investem pesadamente na eleição de uma bancada forte para a defesa de seus interesses, como os poderosos do agronegócio e as congregações evangélicas, que espalham seus candidatos por vários partidos e, depois de eleitos, atuam em blocos parlamentares na defesa de suas pautas específicas.
A existência de 32 partidos políticos registrados para estas eleições apenas cria mais confusão entre os eleitores, que não enxergam as diferenças entre eles, não se dão ao trabalho de entender as plataformas políticas e propostas sociais, econômicas ou ambientais. Com isso as reais diferenças entre as plataformas políticas ficam turvadas por um ambiente de debates poluído por questões ideológicas e morais que não são o cerne de nenhum projeto de desenvolvimento para o país. Temas como religião, família, gênero e outros de maior insignificância assumem o protagonismo no debate político a não deixam espaço para mudanças climáticas, água e saneamento básico, direitos indígenas e de populações tradicionais, licenciamento de obras de infraestrutura em regiões biologicamente sensíveis e muitos outros, como saúde, educação, habitação etc.
A distorção política causada pelo excesso de partidos políticos, uma Constituição claramente parlamentarista e um governo presidencialista em nada facilita que os eleitos consigam estabelecer uma linha clara de projeto para o país. O permanente conflito entre o executivo e o legislativo, que deu origem ao que se convencionou chamar de “presidencialismo de coalizão”, exige do executivo negociações, nem sempre de maneira republicana, com os partidos e blocos no Congresso para aprovar suas pautas. Nesses casos os blocos parlamentares majoritários e fortes conseguem bloquear propostas de cunho ambiental, ou mesmo avançar com projetos que reduzem a proteção de florestas, animais ou populações tradicionais. Infelizmente os segmentos mais atrasados de setores importantes, como o agronegócio, tem muita força política, enquanto as empresas estruturadas e com compromissos globais em temas socioambientais se mantêm afastadas do embate político. Nada indica que neste ano será diferente, mesmo que o eleito para a Presidência da República seja de oposição ao atual mandatário.
A história recente do Brasil mostra que a relação entre executivo e legislativo é um permanente foco de relações espúrias, com escândalos de corrupção que impedem que o país, entre as dez maiores economias do planeta, assuma um lugar entre as nações plenamente desenvolvidas. Desde os anos 1990 foram vários os processos de apuração de corrupção, como o Mensalão, que garantia uma mesada a deputados que votassem com o governo, ou o Petrolão, que deu origem à Operação Lava Jato, que por sua vez também foi uma deturpação da institucionalidade do Poder Judiciário em várias instâncias, e não apenas na Vara de Curitiba, que abrigou a maior parte das ações e culminou com a prisão do ex-presidente Lula por 580 dias.
Durante muitos anos, principalmente entre 1995 e 2015, movimentos empresariais de responsabilidade social e ambiental reuniram grandes empresas nacionais e multinacionais para compor códigos de conduta de alta gradação civilizatória. Organizações como o Instituto Ethos de Responsabilidade Social, o Cebds – Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável e outras conseguiram construir pactos de caráter social e ambiental, como a Moratória da Soja (movimento que restringiu o acesso a mercados de soja plantada em áreas de desmatamento ilegal), ou o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, criado em 2005, que reuniu empresas brasileiras e multinacionais que assumiram o compromisso de não negociar com quem explora o trabalho escravo. Em 2014 esse pacto já havia sido assinado por 400 grandes empresas com atuação no Brasil.
O descompasso político e judiciário, e seus impactos na economia do país, com a destruição de importantes cadeias de valor e criminalização de atividades políticas e empresariais, acabaram por afastar muitas empresas de suas pautas tradicionais com foco em sustentabilidade. Manteve-se apenas um certo verniz de responsabilidade socioambiental para garantir a manutenção de uma boa reputação corporativa, principalmente em relação às suas matrizes e aos clientes.
A crise política que se instalou no país a partir de 2015, e culminou com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff em 2016, desmobilizou grande parte do ativismo socioambiental em organizações sociais para transferir a energia vital da cidadania para as ruas, em manifestações a favor e contra posições partidárias. Em 2018 a sociedade brasileira foi às urnas em um clima de extrema polarização política. A eleição foi pautada por discursos ideológicos e de pouca, ou nenhuma, consistência em termos de projeto. As instituições brasileiras não estavam preparadas para enfrentar o impacto do uso massivo das redes sociais em campanhas políticas e, principalmente, não tinham instrumentos para neutralizar o uso de narrativas mentirosas que ocuparam os grupos e plataformas como WhatsApp, Facebook, Instagram, Youtube e outras.
A polarização e a desinformação afastaram 42,1 milhões de eleitores de seu direito de escolher o Presidente da República nas eleições de 2018. Este número, que equivale a praticamente metade da população da Alemanha, é a soma dos votos brancos, nulos e dos eleitores que não compareceram para votar. Para 2022 o Poder Judiciário, especialmente a Justiça Eleitoral, promete mais agilidade no combate ao uso de plataformas de internet para a desinformação. No entanto, mais uma vez não se espera que as pautas de políticas públicas relevantes para questões ambientais e sociais ganhem espaço no debate público.
O Brasil perdeu muito de suas instituições públicas de gestão ambiental no atual governo. Em julgamento histórico no Supremo Tribunal Federal, no início de abril, a ministra Carmem Lúcia, relatora de seis processos sobre o desmonte das instituições de defesa da Amazônia, comparou o ataque aos órgãos de defesa ambiental a uma infestação de cupins, explicando que as instituições podem parecer inteiras por fora, mas por dentro estão corroídas: “É o cupim da corrupção, o cupim da defesa dos interesses pessoais, o cupim da criminalidade”.
Uma das características do governo eleito em 2018 é atuar com oportunismo, e argumentação de causar inveja aos grandes sofistas da antiguidade. Para justificar a abertura das terras homologadas aos povos indígenas à saga de mineradores e garimpeiras foi usado o argumento de que a guerra no Leste Europeu iria interromper cadeias de suprimento de insumos que só poderiam ser obtidos do subsolo dos territórios indígenas, o que cientistas e mesmo empresas de mineração negaram com veemência. Desde o início do mandato há uma tentativa de desqualificar atores que defendem a integridade dos territórios indígenas ou que se opõem à exploração desordenada dos recursos em áreas de preservação ou que ainda mantêm florestas, principalmente na Amazônia.
Ainda antes de assumir, quando se formulava a estrutura de governo, uma das medidas aventadas foi a extinção do Ministério do Meio Ambiente e a incorporação de suas obrigações ao Ministério da Agricultura. Os apelos de ambientalistas de nada adiantaram e essa aberração apenas não prosperou porque os próprios ruralistas, prevendo os danos que a medida traria aos negócios internacionais do setor, bloquearam a iniciativa. Mesmo assim o governo não desistiu e passou a atacar as políticas preservacionistas a partir das instâncias do próprio Ministério do Meio Ambiente. Uma das primeiras medidas, ainda no início de 2019, foi paralisar o Fundo Amazônia, bloqueando um total de R$ 2,9 bilhões em dinheiro doado pelos governos da Noruega e da Alemanha, que poderiam ser aplicados em projetos para prevenção e combate ao desmatamento. Em seguida descredenciou organizações sociais (ONGs) que participavam de projetos em parceria com órgãos públicos e em conselhos dos mais diversos, chegando a criminalizar a atuação de organizações com trabalhos de décadas junto às populações tradicionais da Amazônia. Um dos mais importantes órgãos de participação social na construção de políticas públicas socioambientais, o Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), teve sua composição reduzida de 200 membros (100 titulares e 100 suplentes) para apenas 23, representando, em sua maioria, órgãos do governo.
A perspectiva com a eventual reeleição do atual presidente é a ampliação do desmonte ambiental com mais ataques à autonomia e proteção das áreas indígenas e a desconstrução das normas de licenciamento ambiental para obras de infraestrutura na Amazônia ou que impactem áreas de preservação em todo o país. Além disso, no campo internacional, o Brasil não deverá atuar para cumprir compromissos assumidos em relação à redução de emissões de gases estufa e o fomento de energias limpas. Há um descolamento entre a narrativa apresentada pelo governo na ONU e nas conferências internacionais e as ações efetivamente adotadas pelos órgãos reguladores e fiscalizadores do meio ambiente.
A falta de ação em relação ao controle de emissões e redução do desmatamento da Amazônia e no Cerrado, que cresceu muito nos últimos 3 anos, torna-se ainda mais crítica com a divulgação do relatório do IPCC no começo de abril, onde os cientistas apontam a necessidade de reduzir as emissões de carbono em 45% até o final desta década. Uma meta bastante difícil de ser alcançada com o aumento ano a ano das áreas de florestas desmatadas e queimadas no Brasil. Além disso, um dos debates recorrentes no Congresso e no Palácio do Planalto, é sobre a criação de mecanismos de subsídios para a redução de preços dos combustíveis fósseis, como diesel e gasolina.
Em março de 2022 houve importantes manifestações públicas contra as políticas de desmonte ambiental promovidas pelo governo de Jair Bolsonaro. Logo no início do mês aconteceu o “Ato pela Terra”. Promovido pelo cantor e compositor Caetano Veloso, uma das vozes mais respeitadas do cenário artístico do país. A manifestação reuniu na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, cerca de 15 mil manifestantes, 230 organizações e coletivos da sociedade civil e mais de 40 artistas contra um pacote de medidas de fragilização das garantias de direitos ambientais e de comunidades indígenas e tradicionais. O protesto foi uma forma de mostrar aos ministros do Supremo Tribunal Federal que a sociedade estava atenta ao julgamento em andamento naqueles dias que pode barrar retrocessos ambientais, ao mesmo tempo pretendia enviar um recado ao Congresso, onde se pedia urgência para a análise de proposta que amplia o acesso a terras indígenas por mineradoras e garimpeiros. Neste último caso, não deu certo, o requerimento de urgência para o projeto que fragiliza os territórios indígenas conseguiu ser aprovado por 278 votos contra 180.
Outra ação com grande repercussão foi a reunião de nove ex-ministros de Meio Ambiente, dos mais diversos governos dos últimos 30 anos, que solicitaram uma audiência com o presidente do Supremo Tribunal Federal para, em conjunto, alertar para o desmonte das instituições de defesa socioambiental do país e das consequências disso para o país e para as próximas gerações de brasileiros, além dos impactos globais da perda da capacidade de oferecer serviços ambientais por biomas fundamentais, como a Amazônia e o Pantanal brasileiro.
Em entrevista recente a este jornalista, a ex-ministra Izabella Teixeira, que atuou durante o governo de Dilma Rousseff, entre 2010 e 2016, afirmou que o principal trabalho de quem assumir o Ministério do Meio Ambiente em um próximo governo, será de reconstrução da institucionalidade e a capacidade de agir dos órgãos ambientais. Apesar do atual governo estar a pouco mais de 3 anos no poder, a destruição na área ambiental abrange mais de 30 anos de trabalho de sucessivas administrações.
Nenhum dos atuais candidatos de oposição tem em relação ao meio ambiente uma agenda tão destrutiva quanto o atual governo. Pelo contrário, há sinais de que poderá haver avanços em relação à pauta ambiental ou, ao menos, parece haver a disposição de não seguir com o atual desmonte das instituições ambientais e científicas, o que já seria um alento. Outro ganho seria o fim da perseguição de organizações sociais. O Brasil está entre os países onde mais ambientalistas foram assassinados em 2020. Foram 20 ativistas que perderam a vida por se oporem à degradação de ecossistemas.
Nos últimos anos organizações sociais que atuam a décadas em regiões normalmente fora do radar do poder público, em apoio a causas sociais e ambientais, foram falsamente acusadas de propagar fogo em áreas de floresta supostamente para obterem recursos de grandes doadores internacionais. Nenhuma dessas acusações se provou verdadeira, mas o processo de intimidação acabou por afastar algumas organizações de seu trabalho de frente, principalmente na Amazônia, por temerem pela segurança e integridade de dos militantes.
Estudos recentes do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e do Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV-USP) chegaram à conclusão de que existe na Amazônia uma associação do narcotráfico com crimes ambientais, como grilagem, garimpo ilegal e desmatamento. A ausência do Estado como garantidor de direitos e da Segurança Pública tem ampliado o espaço para a ação do crime organizado na região. Há estimativas de que cerca de 20 toneladas anuais de ouro extraído ilegalmente de terras indígenas e áreas protegidas saem do Brasil todos os anos, muito desse metal chega a empresas legalizadas de outros países através de mecanismos de “lavagem” dos papéis de exportação.
Para a eleição de 2022, mantendo-se a tendência apresentada por pesquisas eleitorais, haverá uma disputa direta entre o atual presidente, Jair Bolsonaro, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os indicadores ambientais dos oito anos em que Lula presidiu o Brasil foram melhores do que os números e dados do atual governo. Foi um período em que o Brasil assumiu um importante protagonismo em conferências internacionais e obteve resultados tangíveis no combate ao desmatamento principalmente na Amazônia.
Um dos fatores de impacto para as conquistas sociais e ambientais no período Lula foi o engajamento de organizações sociais na aplicação e controle de políticas públicas. O país foi ativo participante na difusão de dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e, também, foi protagonista em amplos debates para a formulação dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e suas 169 metas, aprovados em Assembleia Geral da ONU em dezembro de 2015. Também registrou avanços em políticas voltadas para controle e mitigação das mudanças climáticas.
O principal dilema em relação à eleição presidencial de 2022 certamente não é a eleição em si, mas sim suas consequências. Qualquer que seja o vencedor terá a missão de governar um país cindido por visões de mundo antagônicas. Isso deixará o Brasil muito próximo de rupturas institucionais importantes. Na presidência o voto majoritário entregará o governo a um homem. No Congresso o voto proporcional elegerá deputados e senadores membros de dezenas de partidos, aliados ou não do presidente eleito sem maioria clara. A disputa baseada em argumentos ideológicos e morais impede que temas relevantes de políticas públicas, como clima, direitos humanos, meio ambiente, educação, saúde e outros vinculados aos objetivos e metas dos ODS ganhem destaque no debate público.
Os pós eleição entregará ao país um estado de tensão e muitas dúvidas sobre os posicionamentos de diversos atores. O principal deles será o estamento militar. Quando o presidente Jair Bolsonaro assumiu o governo encontrou cerca de 1.900 militares ocupando cargos civis nos diversos órgãos de governo. Quando encerrar este mandato, estima-se que cerca de 6.500 militares estarão ocupando cargos na administração pública. É o maior número desde os governos militares pós 1964. A novidade é o grande número de egressos das Polícias Militares dos Estados a assumirem cargos principalmente em órgãos do Ministério do Meio Ambiente. O presidente da República chegou a dizer que esse Ministério estaria mais aparelhado pela esquerda do que o Ministério da Educação, também alvo de ações de desmonte de políticas públicas. E nos últimos meses as Polícias Militares dos Estados e do Distrito Federal têm sido beneficiárias de vários “pacotes de bondades” por parte do governo federal, certamente como parte de uma estratégia para garantir a lealdade do efetivo diante de aventuras pouco republicanas.
As áreas ambiental e científica têm sido as mais atacadas em sua capacidade operacional e credibilidade. Responsável por monitorar o desmatamento no País, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) perdeu seu diretor, o cientista Ricardo Galvão, após divulgar os dados recordes de desmatamento em agosto de 2019, ainda no primeiro ano de governo. Quando o ex-ministro de Meio Ambiente Ricardo Salles iniciou o processo de substituição das chefias técnicas no Ibama – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente – e no ICMbio – Instituto Chico Mendes – por policiais militares.
Após mais de três anos de governo as instituições brasileiras pouco conseguiram fazer para deter o desmonte dos órgãos ambientais, mesmo existindo no Congresso a Frente Parlamentar Ambientalista, que apesar de nominalmente contar com mais de 200 membros, não tem a efetividade de um bloco parlamentar capaz de defender os direitos socioambientais e os deveres constitucionais. Por mais boa vontade que exista entre seus mentores e líderes, a participação nesta frente é mais uma teatralidade do que compromisso efetivo com os propósitos. Organizações sociais e personalidades ambientalistas têm usado as redes sociais para estimular a participação de ambientalistas nas eleições, os resultados não tem sido dos melhores.
Enfim, as eleições de 2022 serão um divisor de águas nas políticas socioambientais no Brasil. Em se mantendo a tendência de polarização, de um lado existe a perspectiva de continuar o desmonte das políticas construídas desde a Constituição de 1988 e até mesmo a extinção do Ministério do Meio Ambiente. De outro um esforço coletivo de reconstrução dessas mesmas políticas, com recuperação do protagonismo Soft Power que destacou a diplomacia brasileira em todos os grandes eventos ambientais desde a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, popularmente conhecida como ECO-92.
2022 é um ano emblemático para as causas ambientais em todo o mundo, mas especialmente no Brasil. É o ano em que completa 50 anos da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento e Meio Ambiente Humano, também conhecida como Conferência de Estocolmo, que ocorreu em junho de 1972, onde a posição brasileira ficou conhecida pela participação do então ministro do Interior, Costa Cavalcante, que declarou que o país deveria se “desenvolver primeiro e pagar os custos da poluição mais tarde”. 20 anos depois o Brasil torna-se o epicentro de uma verdadeira revolução nas políticas ambientais globais ao sediar a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, também conhecida como Eco-92, em junho de 1992, no Rio de Janeiro. Desta conferência saíram importantes passos em direção a uma institucionalidade global para o meio ambiente, como a Carta da Terra e a Agenda 21.
A expectativa dos movimentos sociais e empresariais em relação à eleição deste ano é a retomada dos processos de desenvolvimento sustentável do país. O reconhecimento da biodiversidade como um valor e o respeito aos povos tradicionais como reconhecimento de sua contribuição para a preservação do patrimônio ambiental do país.
O economista franco-polonês Ignacy Sachs, um estudioso do Brasil nos últimos 50 anos, explica que o país não participou de nenhuma das grandes revoluções da economia e da tecnologia dos últimos séculos. O país sempre esteve a reboque, como importador de ciência e tecnologias. Agora é a oportunidade de o Brasil liderar a revolução de uma economia baseada em biotecnologias e biodiversidade.
Qualquer que seja o governo nos próximos anos, o país não pode perder mais uma janela de oportunidade. O investimento em pesquisas e conhecimentos sobre a rica biodiversidade brasileira precisa estar entre as políticas públicas prioritárias. A bioeconomia é potencialmente o caminho do Brasil em direção ao futuro.
Dal Marcondes é jornalista com especialização em economia, ciência Ambiental e mestrado em jornalismo digital. É presidente do Instituto Envolverde, que publica o site Agência Envolverde (www.envolverde.org.br) e presidente da Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental.
*Artigo publicado originalmente no livro “Eleições 2022: expectativas e perspectivas”, publicado pela Fundação Konrad Adenauer no Brasil: https://www.kas.de/pt/web/brasilien/einzeltitel/-/content/wahlen-2022-erwartungen-und-perspektiven