Vício silencioso: a tecnologia está roubando nossa atenção e precisamos assumir o controle

Vício silencioso: a tecnologia está roubando nossa atenção e precisamos assumir o controle

Por Charles Betito*

Estamos sempre ligados, mas nem sempre presentes. E com isso a atenção se tornou um dos recursos mais preciosos e escassos. Sabemos de todos os benefícios que a era digital nos trouxe, como comodidade e oportunidades de aprendizado, mas ainda não nos demos conta do aumento de estímulos diários, dificultando a capacidade de focar e até de concluir tarefas simples. Notificações incessantes, redes sociais e o fácil acesso a um fluxo interminável de informações estão, gradualmente, comprometendo nossa atenção e, com isso, impactando a produtividade, o bem-estar e a saúde mental.

Diversos estudos já publicados comprovam que a nossa atenção é limitada, mas o ritmo acelerado e os dispositivos ao nosso redor forçam o cérebro a se dividir entre diversas tarefas ao mesmo tempo. A psicóloga estadunidense Gloria Mark, ilustra em seu livro “Attention Span: A Groundbreaking Way to Restore Balance, Happiness and Productivity”, que em 2004, a média de atenção em uma tela era de dois minutos e meio. Anos depois, esse tempo caiu para 75 segundos. Quando a atenção é desviada de uma tarefa ativa, são necessários cerca de 25 minutos para se concentrar novamente na tarefa original. Isso significa que estamos constantemente pulando de uma tarefa para outra, acumulando um “custo de troca” que envolve o tempo necessário para reorientar-se, o que aumenta os erros e o estresse.

Essa sobrecarga acaba gerando o que especialistas chamam de “fadiga de decisão”. Esse termo, descrito no estudo “Decision Fatigue”, comandado pelos psicólogos Roy Baumeister e Kathleen Vohs, refere-se ao esgotamento mental causado pelo excesso de escolhas diárias. Como consequência, a mente se torna mais cansada, tem dificuldades para se concentrar por longos períodos e encontra obstáculos para armazenar e organizar.

Um problema cada vez maior

A constante exposição às telas e o bombardeio de informações fragmentadas causam um fenômeno conhecido como sobrecarga cognitiva. Quando o cérebro é forçado a processar muitas informações ao mesmo tempo, ele entra em estado de alerta, aumentando os níveis de estresse e dificultando a concentração em uma única tarefa. Um estudo da Microsoft intitulado “Attention Spans” revela que, com o aumento da utilização de smartphones e redes sociais, a duração média de atenção humana caiu para cerca de oito segundos, sendo menor que a atenção de um peixinho dourado, que é de nove segundos.

Outro fenômeno observado é o vício em estímulos rápidos, proporcionado pela navegação contínua nas redes sociais. Cada curtida, notificação ou novo conteúdo que aparece na tela ativa a liberação de dopamina, o neurotransmissor responsável pela sensação de prazer. Assim, ao passar mais tempo nesses ambientes, o cérebro passa a buscar cada vez mais esses estímulos instantâneos, comprometendo a paciência e a capacidade de sustentar o foco em tarefas menos estimulantes, mas igualmente importantes.

A realidade digital que vivemos também afeta a capacidade de memorização. Com informações chegando de todos os lados e a facilidade de “salvar para ver depois”, acabamos confiando excessivamente nos dispositivos, reduzindo o esforço de nossa memória. A consequência é uma redução na capacidade de recordar informações e até de aprender profundamente, o que gera uma sensação de superficialidade e falta de aprendizado significativo.

Recuperando o foco é possível?! Confira medidas!

Prática de mindfulness (Atenção plena): o mindfulness, ou atenção plena, ajuda a treinar o cérebro para focar no momento presente. Estudos mostram que essa prática pode reduzir o estresse e melhorar a concentração. Para começar, reserve cinco minutos diários para exercícios de respiração ou meditação, aumentando gradualmente conforme o conforto. O objetivo é evitar que a mente divague e treinar a capacidade de focar em uma tarefa de cada vez.

Controle do tempo de tela: limitar o tempo gasto nas redes sociais e nos aplicativos é uma medida prática para reduzir as distrações. Ferramentas como o “Tempo de Uso” (Screen Time) nos dispositivos Apple permitem monitorar o uso e estabelecer metas de redução. Também é útil definir momentos sem dispositivos, especialmente antes de dormir, já que a luz azul das telas afeta a qualidade do sono, agravando a fadiga mental.

Escolha atividades profundas:  atividades que exigem atenção continuada, como leitura de livros ou hobbies como pintura e escrita, são formas eficazes de treinar o cérebro a manter o foco. Ao dedicar-se a essas práticas, o cérebro se recondiciona para sustentar a atenção, reduzindo a dependência de estímulos rápidos.

Evitar a multitarefa: a multitarefa é inimiga da produtividade. Cada vez que o cérebro muda de uma atividade para outra, ele gasta energia e tempo para retomar o foco anterior. Focar em uma única tarefa até concluí-la é mais eficiente do que dividir a atenção entre várias coisas ao mesmo tempo.

Desativar notificações: as notificações são um dos maiores inimigos da atenção. A cada interrupção, o cérebro perde o fio da concentração, e pode levar minutos para retomar o raciocínio. Ajuste as configurações do celular e dos aplicativos para receber apenas o essencial, criando um ambiente mais tranquilo e propício ao foco.

* Charles Betito é fundador da MIND station e especialista em educação corporativa e saúde mental