Opinião

Valor compartilhado com impacto social positivo nas economias emergentes

Por Ana Paula Mattar – 

O crescimento econômico sustentável continua sendo um caminho crítico para sair da pobreza e um motor central para uma sociedade atender as necessidades básicas de seus cidadãos – assim como na qualidade de vida e nas condições para as comunidades atingirem seu pleno potencial.

Nos países emergentes como Brasil, a profundidade do desequilíbrio socioambiental e a emergência de alternativas para o enfrentamento dessa realidade trazem à tona a discussão sobre a responsabilidade das empresas privadas. Neste contexto, emerge um novo tipo de organização, que combina dois objetivos (antes vistos como incompatíveis): lucro e geração de impacto positivo.

A compreensão de que o Estado é o grande responsável por equacionar situações oriundas da pobreza extrema, da falta de habitação, do analfabetismo funcional, das questões ambientais etc., se mostrou pouco eficiente. Afinal, dado o crescimento populacional, para fazer frente aos desafios socioambientais faz-se necessário um crescente investimento, atributo este que o Estado não tem como gerar, dado que sua receita é limitada aos impostos, multas e demais taxas pagas pela sociedade.

Considerando-se ainda que grande parte das economias, dentre as quais a do Brasil, está diante de uma profunda crise fiscal, agravada pela pandemia da Covid19, o que podemos afirmar é que não há como esperar que os Estados tenham capacidade de investir para impulsionar o progresso social das Nações.

Mas, se por um lado, o Estado não gera riqueza, por outro o setor privado, este sim, gera. Neste contexto, emerge a questão: qual é o papel dos negócios frente a tantos desafios?

Em análise, Dane Smith, diretor geral da consultoria americana FSG, comenta que durante esses tempos desafiadores, muitos líderes empresariais estão concluindo que precisam se concentrar em seu core business e apenas se concentrar em seus clientes, seus produtos e seus serviços. Mas isso é míope.

“Os líderes empresariais mais sofisticados reconhecem que as empresas só podem prosperar em longo prazo em uma sociedade saudável e próspera e estão ajustando suas estratégias para colocar o propósito no centro de seus modelos de negócios. Ao fazer isso, estão aumentando as receitas e demonstrando que não é necessário haver uma opção entre lucros e ajudar a sociedade a resolver seus desafios”.

Torna-se, assim, imperativo o papel de organizações que combinam dois objetivos antes vistos como incompatíveis: lucro e impacto socioambiental positivo. Somente a partir de modelos de negócio lucrativos que resolvam uma real necessidade da sociedade se pode gerar impacto positivo – e em escala – de forma sustentável ao longo do tempo.

Criar uma área de responsabilidade social e investir em atividades filantrópicas são altamente relevantes para as companhias, mas insuficientes para fazer frente às necessidades sociais e ambientais. Por isso, a implementação de estratégias que gerem valor compartilhado simultaneamente para o negócio e para a sociedade são não apenas relevantes e urgentes, mas condicionantes de competitividade e sobrevivência.

Estamos diante de uma mudança de paradigma em que os negócios passam a se posicionar como parte das soluções dos desafios sociais e, com isso, se fortalecem.

Este modelo já ganhou tração em países desenvolvidos, todavia a cultura de corporações com um real propósito ainda precisa ser melhor trabalhada em emergentes. Especificamente no Brasil, ainda hoje vemos resquícios de uma classe empresarial que pensa apenas em maximizar o retorno financeiro dos acionistas no curto prazo. Não é mais possível permanecer indiferente à constante degradação da vida humana, de valores éticos universais e do ambiente natural – e esta condição não é apenas desejável, se trata de uma verdadeira condicionante de sobrevivência.

Se a pandemia por um lado agravou ainda mais a crise fiscal, por outro também acelerou um movimento que já vem ocorrendo. Com a Covid-19, muitas empresas declararam ter um propósito e repensaram suas estratégias de atuação e desenvolvimento em relação às comunidades que as cercam – e das quais são obtidos os recursos necessários para a manutenção da atividade empresarial.

No entanto, declarar um propósito apenas não é o suficiente. Visando apoiar líderes empresais a colocar o propósito em prática, a FSG lançou em abril de 2020 o Purpose Playbook, o mais importante manual de negócios que trata COMO colocar o propósito em prática com valor compartilhado. O Parsifal21, com vistas à ampliar o acesso a esse material para o ecossistema de negócios brasileiros, o traduziu para o Português

Juntas, essas organizações fizeram o lançamento desse e-book no Brasil via webinar para os empresários brasileiros em novembro de 2020. O Purpose Playbook em Português pode ser baixado gratuitamente em www.sharedvalue.org/resource/purpose-playbook-portuguese-translation/

Acreditamos que essa é a chave que irá abrir a próxima onda de inovação, impacto coletivo e crescimento nas empresas de países emergentes, além de gerar grande vantagem competitiva para os negócios. Afinal, não se pode perder de vista que o consumidor exige cada vez mais responsabilidade corporativa das empresas. Esperamos também que a publicação do Purpose Playbook em Português encoraje os líderes empresariais a colocarem seu propósito em prática com geração de valor compartilhado.

* Ana Paula Mattar é administradora de empresas pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo e cofundadora do Parsifal21. Atualmente atua apoiando a criação e transformação de negócios que criam impacto positivo no mundo”