Por Júlio Ottoboni*
O ‘Velho Chico’ está cansado e não tem forças para caminhar até Atlântico. As águas salobras do mar já invadiram sua calha 24 quilômetros adentro, exatos 10% do trecho final com maior oferta de turismo sustentável e que tem colocado a região como o terceiro maior fluxo turístico de Alagoas. Há três anos a situação se complicou de vez, a estiagem e o desmatamento ao longo de se seus trechos mais altos no Sudeste reduziram drasticamente a vazão do rio.
A denúncia da agonia do baixo São Francisco surgiu no 1º Seminário Internacional de Turismo Caminhos de São Francisco, ocorrido no começo deste mês, e promovido pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustentabilidade (IABS), Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico e Turismo de Alagoas, Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, na cidade de Piranhas, em Alagoas. E foi feita para a secretária estadual de desenvolvimento econômico e turismo, Jeanine Pires.
“A água do mar entrou e o rio está azulado, na foz em Piaçabuçu estamos com dificuldades para ter água doce. Já tem tubarão, tartaruga marinha e outras espécies que só tem no mar. O pilombeta que é um peixe comum neste trecho do rio está desaparecendo”, alertou o ambientalista e integrante da Associação Olha o Chico, de Piaçabuçu, Jasiel Martins.
O peixe símbolo, o surubim, que tem uma enorme escultura na praça central de Piranhas, está ameaçado de extinção e praticamente sumiu do rio. A situação era de conhecimento do governo de Alagoas, que tem investido pesadamente no projeto Caminhos do São Francisco, com a grande alternativa turística sustentável e modelo para o país.
“ A questão da crise hídrica não é só o Estado eu irá resolver, os pescadores tem alertado para a questão do rio. Só vejo uma solução se for global, precisamos cumprir as metas estabelecidas em acordos internacionais tanto pelo governo federal como pelos Estados”, comentou Jeanine Pires.
Uma rede de empresários do segmento turístico tem buscado fazer sua parte, pois sabem que o Rio São Francisco é o grande maestro na regência deste novo momento para a economia regional. No hotel Pedra do Sino, em Piranhas, o proprietário Francisco de Assis Clemente, já fez tubulações independentes para captar a água dos quartos, inclusive do ar condicionado, para reaproveitamento. Também tem buscado saídas no uso de energia solar e na captação da água da chuva. “Temos que manter o foco na sustentabilidade”, afirmou.
A consciência preservacionista vai desde a conservação dos casarios históricos das 12 cidades do eixo do programa Caminhos do São Francisco até um processo de resistência cultural. O empresário Flávio Ferraz, dono da Pousada Trilha do Velho Chico, chegou como turismo do Recife e acabou ficando e empreendendo em Piranhas. E a pegada ambiental é hoje fundamental para a sobrevivência de seu negócio.
“Eu optei pelo turismo de esporte e de aventura. Os meus clientes tem essa consciência, usamos aqui reaproveitamento da água e energia solar, além da fossa verde. Seja na área dos quartos ou no espaço do camping. O que preocupa é ver o rio nesta condição, tem lugar que já temos que sair do caiaque e levar a embarcação no braço até outro ponto para continuar a navegação”, falava com ar sério, mesmo quando brincava com seu cão, de nome Chicão. (#Envolverde)
* Júlio Ottoboni é jornalista diplomado, pós graduado em jornalismo científico. Tem 30 anos de profissão, atuou na AE, Estadão, GZM, JB entre outros veículos. Tem diversos cursos na área de meio ambiente, tema ao qual se dedica atualmente.
** O jornalista viajou à região de Xingó, interior de Alagoas, a convite do IABS – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustentabilidade