Um documento com 15 Recomendações prioritárias para o fortalecimento do ecossistema das finanças sociais no Brasil foi divulgado nesta quarta-feira (14) em São Paulo pela Força-Tarefa Brasileira de Finanças Sociais (FTFS). A proposta é movimentar R$ 50 bilhões para financiar soluções inovadoras para problemas sociais até 2020. Além de promover as melhores práticas e fomentar a troca de informações entre as principais organizações interessadas no setor, o documento pretende “mostrar aos não convertidos as vantagens de alocar recursos para investimentos de alto impacto social”, como definiu Leonardo Letelier, CEO da Sitawi Finanças do Bem, organização que integra a força-tarefa e participou ativamente da redação do estudo.
Depois de dois anos de estudos, pesquisas e debates que envolveram mais de 500 especialistas de diversas organizações e instituições, e empreendedores, a Força Tarefa Brasileira de Finanças Sociais (FTFS) está lançando hoje o documento “Finanças Sociais: soluções para desafios sociais e ambientais – uma nova mentalidade para gerenciar recursos e necessidades na sociedade”, que traz 15 Recomendações prioritárias para a expansão e fortalecimento do campo das finanças sociais no país, durante o seminário Finanças Sociais, Tendências Globais e Recomendações para o Brasil, realizado no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo. A meta é elevar os investimentos de impacto no Brasil de R$ 13 bilhões, em 2014, para R$ 50 bilhões até 2020, em ações e negócios que atrelam impacto social e sustentabilidade financeira, ou seja, que ampliam a oferta de produtos e serviços que resolvem problemas sociais e que têm desempenho financeiro positivo. Integram a Força Tarefa Brasileira de Finanças Sociais André Degenszajn, Antônio Ermírio de Moraes Neto, Ary Oswaldo Mattos Filho, Fábio Barbosa, Guilherme Affonso Ferreira, Luiz Lara, Maria Alice Setúbal, Pedro Parente e Vera Cordeiro. Antônio Ermírio de Moraes Neto representa a Força Tarefa Brasileira no Grupo de Gestão Global de Investimento de Impacto Social (Global Steering Group on Social Impact Investment, GSGSII), formado no âmbito dos países do G20, que tem como chairman Sir Ronald Cohen.
O documento de 44 páginas definiu 15 Recomendações prioritárias, com as respectivas sugestões de metas para os próximos cinco anos, e nomeou atores-chave do campo das finanças sociais que devem se envolver diretamente em sua realização. São recomendações que se propõem a mover quatro Alavancas consideradas essenciais para o fortalecimento do ecossistema das Finanças Sociais no Brasil: (1) A ampliação da oferta de capital; (2) O aumento do número de negócios de impacto qualificados e com alto potencial de crescimento; (3) Ofortalecimento das organizações intermediárias; e (4) A promoção de um macroambiente favorável para as finanças sociais.
Inspirada pela trajetória de outros países, a Força Tarefa Brasileira de Finanças Sociais nasceu de um conjunto de 20 organizações, que em 2013 constituíram um grupo em prol do desenvolvimento das finanças sociais no Brasil. Lançada em maio de 2014, a FTFS atua como catalisadora e articuladora para esse campo, com o envolvimento de representantes de diferentes setores, com o firme propósito de ampliar o capital privado e público para o desenvolvimento de mecanismos e negócios de impacto que contribuam para a resolução dos problemas sociais brasileiros. O desafio é disseminar modelos de negócios inovadores que inspirem mudanças na lógica de atuação, deixando claro que impacto social e performance financeira podem sim caminhar juntos com vantagens para investidores, empreendedores e sociedade.
“Há poucos anos”, diz a carta de apresentação das 15 Recomendações da FTFS, “estes investidores e empreendedores eram raros. Hoje, somados a grandes empresas, bancos, fundações, organismos multilaterais e governos, usando esta lógica de impacto e performance financeira, podem ser vistos como atores de um ecossistema em forte crescimento, que espera mover nos próximos anos US$ 1 trilhão no mundo e R$ 50 bilhões no Brasil”. Segundo Célia Cruz, do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), que ao lado da SITAWI integra a Diretoria Executiva da FTFS, “os membros da FTFS têm a convicção de que é necessário e possível atrair mais capital para chegar a soluções inovadoras que respondam aos problemas sociais numa escala de grandeza proporcional ao tamanho de seus desafios”.
Para a FTFS, o Brasil enfrenta problemas sociais complexos que impactam toda a população brasileira em áreas como educação, saúde, moradia, geração de emprego e distribuição de renda. As ações governamentais, investimentos de empresas e o dinheiro de pessoas físicas engajadas com a filantropia têm tido um papel importante na melhoria dos indicadores sociais, mas são insuficientes. “O campo das finanças sociais surge como resposta a essa necessidade, composto essencialmente por investimentos que geram, ao mesmo tempo, retorno social e rentabilidade financeira, e pelos negócios de impacto”, afirma Leonardo Letelier, da SITAWI.
Participam do campo das Finanças Sociais e Negócios de Impacto empreendedores que criam organizações para causar transformação social e obter retornos financeiros, investidores que incluíram a dimensão de impacto em sua análise de risco-retorno, ONGs que se sustentam a partir de um modelo de geração de receita pela própria organização, empresas inovadoras que já beneficiaram milhões de pessoas em situação de vulnerabilidade, governos que buscam fazer contratos que garantam impacto mensurável e filantropos que buscam a construção da infraestrutura no campo das Finanças Sociais como contrapartida para suas doações. Os negócios de impacto se diferenciam dos negócios tradicionais por atenderem a quatro princípios-chave: compromisso com uma missão social ou ambiental, compromisso com monitoramento e comunicação de seu impacto social e/ou ambiental, compromisso com a lógica econômica rentável e compromisso com uma governança efetiva e inclusiva.
Recomendação #07
O lançamento das 15 Recomendações foi acompanhado de uma boa notícia: a divulgação de edital do BNDES, no dia 7 de outubro – “Chamada Pública Multissetorial para a Seleção de Fundos de Investimento”. Na chamada, o BNDES afirma que: “Preferencialmente, os fundos devem ter foco nos seguintes setores de atuação/produtos: infraestrutura, base tecnológica, educação, saúde, economia criativa e fundos de impacto social. O percentual máximo de participação da BNDESPAR no patrimônio comprometido de cada fundo selecionado será de 40% para fundos de Venture Capital e de 20% para fundos de Private Equity”. Com a iniciativa, o BNDES atende à Recomendação #07 da FTFS – “Chamadas para fundos de investimento de impacto” –, segundo a qual a “FTFS recomenda que bancos e agências de fomento federais (como por exemplo, o BNDES e a FINEP), estaduais (como por exemplo, Desenvolve SP) e organismos multilaterais (como o BID-Fumin, IFC, DEG, etc.) incorporem o tema de Investimento de Impacto na definição de seus critérios para realizar chamadas para aportes em Fundos de Venture Capital e Private Equity”.
Com a inclusão dos fundos de impacto social, o BNDES dá um primeiro passo importante no sentido de ampliar a oferta de capital para investimentos de impacto. Experiências internacionais confirmam essa tendência positiva. Segundo relatório publicado pelo banco JPMorgan em maio de 2015, por exemplo – Eyes on the Horizon – The Impact Investor Survey –, a indústria de fundos de investimento no mundo tem um total de ativos de US$ 60 bilhões sob sua gestão, dos quais 18% têm como gestores organizações financeiras de desenvolvimento. Em pesquisas anteriores feitas pelo mesmo banco, estas organizações representavam a maior fatia dos ativos totais sob gestão no mundo. Para a FTFS, essa mudança de perfil sugere o papel indutor – atrair novos investidores – que este tipo de investidor tem na construção de um novo campo.
Recomendação #01
Na Recomendação #01, sobre “Investimento de indivíduos de alta renda em produtos financeiros de impacto” a FTFS recomenda a indivíduos de alta renda que, direta ou indiretamente (por exemplo, via Family Offices), incentivem as instituições financeiras das quais são clientes, bem como os gestores de fundos de investimentos que administram seu patrimônio, a criar produtos financeiros de investimento com impacto social, e/ou definir, para produtos existentes, um porcentual de alocação nesse tipo de investimento.
Na prática, o que já vem acontecendo no Brasil é que a ausência de produtos financeiros de impacto no sistema bancário moveu famílias interessadas em realizar investimentos em negócios de impacto a criar suas próprias estruturas de investimento e suporte ao ecossistema. Ana Lúcia Villela, por exemplo – que participou do seminário promovido pela Força Tarefa Brasileira de Finanças Sociais –, além de criar o Instituto Alana, que é um dos principais quotistas da VOX Capital (que investe em empresas causam impacto social positivo), também criou a empresa Alana Participações, Alanapar, com o objetivo de apoiar a criação e o fortalecimento de negócios de impacto e investir diretamente nestes negócios. O Alanapar moverá parte de seus investimentos nos próximos anos, para mapear e apoiar a criação e o fortalecimento de negócios de impacto. Esses investimentos ultrapassam a esfera do financeiro, pois o Alanapar entra apoiando também a gestão desses novos negócios.
A meta sugerida pela FTFS para a Recomendação #01 é a de que indivíduos ou seus respectivos Family Offices direcionem de 1% a 3% do montante de seus investimentos para fundos/produtos financeiros de impacto social até 2020.
Pesquisa realizada pela gerente-executiva do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), Fernanda Bombardi, com base em uma amostra de oito famílias de alto poder aquisitivo (sete fazem parte da lista de bilionários do país), revela que seis famílias já atuam no campo de negócios de impacto, seja doando recursos, investindo em fundos de investimento de impacto ou empreendendo negócios de impacto. No total, essas famílias deverão destinar, em 2015, R$ 79 milhões a investimentos sociais. Entre as principais modalidades para o investimento com expectativa de retorno financeiro, segundo a pesquisa, estão: investimento direto em negócios de impacto – equity ou dívida conversível; investimento direto em negócios de impacto – empréstimo; e investimento via fundo de investimento de impacto.
Outros exemplos de Recomendações
- Na Recomendação #05 – “Inclusão de negócios de impacto na cadeia de valor das empresas” – a Força Tarefa Brasileira de Finanças Sociais “recomenda a empresários, executivos e membros dos conselhos de administração que assimilem e adotem o conceito e a visão de negócios de impacto como parte da estratégia de suas empresas e que solicitem a suas equipes ações práticas de incentivo a esses empreendimentos em seus planos de ação”.
A meta sugerida é de que as “empresas criem estratégias e políticas internas para viabilizar, até 2020, que 5% de suas compras corporativas sejam feitas de negócios de impacto, e reportem periodicamente seu avanço em direção à meta”.
- Na Recomendação #06 – “Criação de modelos para inclusão de negócios de impacto nas compras governamentais” – a FTFS “recomenda à Academia, FTFS, ONGs que atuam na gestão pública, Institutos e Fundações que deem visibilidade a iniciativas já existentes e ajudem na consolidação de modelos alternativos de compras de produtos e serviços de negócios de impacto que possam ser replicáveis e escaláveis por diferentes governos”.
- Para a Recomendação #15 – “Princípios para negócios de impacto no Brasil”, aForça Tarefa Brasileira de Finanças Sociais, com o apoio de organizações do ecossistema, está lançando também a Carta de Princípios para Negócios de Impacto no Brasil, produzida com o apoio de mais de 50 pessoas e organizações, que além de define os princípios-chave que diferenciam os negócios de impacto das ONGs ou dos negócios tradicionais.
Acesse aqui a íntegra da Carta de Princípios.
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