Por Tharanga Yakupitiyage, da IPS –
Nações Unidas, 23/9/2016 – O Acordo de Paris sobre mudança climática está a ponto de entrar em vigor, depois que 31 Estados depositaram oficialmente seus instrumentos de ratificação na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), o que elevou para 60 o número de ratificações. Entretanto, esses 60 países representam apenas 48% das emissões globais de carbono e o acordo exige pelo menos 55 países que representem 55% dessas emissões para entrar em vigor.
Convocada pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, a Reunião de Alto Nível sobre a Entrada em Vigor do Acordo de Paris sobre mudança climática, realizada no dia 21, contou com a presença de governantes de todo o mundo para que confirmar os compromissos que assumiram em 2015 com a finalidade de reduzir as emissões de gases-estufa.
“O que antes parecia impossível agora parece inevitável. Quanto terminar este ano, espero que todos possamos olhar para trás com orgulho, sabendo que aproveitamos a oportunidade de proteger nosso lar comum”, afirmou Ban aos delegados presentes. Alden Meyer, da organização independente União de Cientistas Preocupados (UCS), destacou a importância do encontro. “Os líderes políticos veem isso como um tema importante para seu público”, apontou à IPS.
Do mesmo modo, Kaisa Kosonen, assessora do Greenpeace Internacional, considerou “uma inspiração” ver tantos países ratificarem o acordo com tal presteza. “Eu disse que os tempos mudaram. Se pegarmos o processo que tivemos em Copenhague e observarmos onde estamos hoje, quando é provável que o acordo entre em vigor, isso dá a esse documento um começo muito bom”, acrescentou.
Durante a 15ª Conferência das Partes (COP 15) da Convenção sobre Mudança Climática da ONU, em 2009, na Dinamarca, os governantes não assumiram ações concretas para reduzir as emissões. O Acordo de Paris, alcançado em dezembro de 2015, obriga os governos a manterem o aumento da temperatura média abaixo de dois graus Celsius em relação aos níveis pré-industriais, e a continuarem com o esforço para limitar esse aumento ainda mais, em 1,5 grau.
Muitos acreditam que o tratado será ratificado no final de 2016, menos de um ano após ser assinado em Paris, o que o converteria em um dos tratados de entrada em vigor mais rápida. “Não tem precedentes”, afirmou o porta-voz da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, Nick Nuttall.“Alcançar o acordo sobre mudança climática é uma das tarefas mais difíceis que o mundo enfrenta. Esse é um sinal político forte, de que todos os governos estão a bordo para cumprir seriamente suas promessas de Paris”, acrescentou.
China e Estados Unidos, responsáveis por mais de um terço das emissões mundiais de gases-estufa, estão entre os países que aderiram ao tratado. Muitos dos países signatários são pequenos Estados insulares, que veem a mudança climática como uma ameaça existencial, devido à maior ocorrência de desastres naturais e ao aumento do nível do mar, mas suas próprias emissões de carbono são mínimas na escala mundial.
A China, responsável por mais de 20% das emissões do planeta, se comprometeu a reduzir sua emissão de dióxido de carbono em 60% abaixo do nível de 2005, até 2030. O país mais povoado do mundo também pretende ampliar seu consumo de energia procedente de fontes renováveis em 20% no mesmo período.Já os Estados Unidos preveem reduzir em até 28% suas emissões em relação aos níveis de 2005, até 2025.
Meyer se referiu à importância dessa decisão: “Os Estados Unidos são um país muito rico, mas obviamente não está imune à mudança climática, como vimos com as recentes inundações em Luisiana e as secas e ondas de calor no oeste. Nenhum país, nenhuma comunidade está imune”.
Espera-se que mais países ratifiquem o acordo até o final deste ano, entre eles Austrália, Canadá e os 28 membros da União Europeia (UE). Se isso acontecer, o tratado entrará em vigor 30 dias depois das ratificações.Mas esse é apenas o princípio. “O Acordo de Paris é um tratado marco para combater a mudança climática, mas necessita de alguns ajustes”, pontuou Nuttall. Meyer compartilha dessa opinião. O Acordo “só tem sentido se os países o aplicarem. Na verdade, são as medidas práticas que fazem a diferença e isso ainda temos que ver”, ponderou.
Nuttall destacou a necessidade de os Estados contarem com um “livro de regulamentos” para aplicar o tratado. Muitos esperam que isso ocorra na próxima Conferência sobre o Clima (COP 22), que acontecerá em novembro no Marrocos. Meyer se referiu em particular ao desafio que implica conseguir a meta dos dois graus Celsius, e observou que, mesmo que a comunidade internacional consiga atingir esse objetivo, os efeitos da mudança climática aumentarão drasticamente, o que exigirá mais medidas.
“O outro lado dessa discussão tem de ser como aumentar a resistência aos impactos climáticos e como ajudar os países e as comunidades que enfrentam os impactos a lidarem com eles”,, argumentou Meyer. Segundo ele, “este é um momento para comemorar, brindar com champanhe, mas também para voltar a trabalhar pela manhã, porque ainda há muito por fazer”.
E surgem obstáculos na medida em que as políticas comerciais entram em conflito com as medidas contra a mudança climática.“Fica claro que todas as políticas que ainda favorecem os combustíveis fósseis, ou impedem que os países priorizem a energia limpa e renovável, são prejudiciais e não devem ser apoiadas”, ressaltou Kosonen, se referindo a um novo e controverso tratado de comércio sobre os serviços, conhecido como Tisa.
Segundo documentos vazados, o Tisa, em processo de negociação entre a UE e 22 países, poderia arriscar a expansão da energia limpa e renovável, o que prejudicaria o cumprimento do Acordo de Paris. Meyer enfatizou que é importante os chefes de Estado assegurarem que os acordos comerciais sejam “compatíveis” com os esforços contra a mudança climática. Envolverde/IPS