O estudo, conduzido por especialistas da Universidade Estadual de Feira de Santana, Universidade Federal da Bahia, WRI Brasil, Universidade do Arizona e da Geodatin, utilizou dados do MapBiomas. “O trabalho mostra a necessidade urgente de iniciativas abrangentes de conservação, restauração e práticas sustentáveis de uso da solo para a Caatinga”, diz Washington Rocha, pesquisador da UEFS e autor do estudo. “E a ciência, os dados e o monitoramento devem estar no centro da tomada de decisão”, acrescenta.
Segundo Jefferson Ferreira-Ferreira, do WRI Brasil e também autor do estudo, é crucial adotar técnicas agrícolas sustentáveis para gerir eficazmente as demandas da produção agrícola e, ao mesmo tempo, salvaguardar o ecossistema do bioma Caatinga. “Conservar e restaurar a Caatinga requer esforços coordenados entre os decisores políticos, os gestores de terras e as comunidades locais”.
A redução da vegetação nativa na Caatinga se deu em todas as categorias: declínio de 12% (-430 mil hectares) de Formações Naturais Não Florestais, queda de 11% de Savanas (-5,79 milhões de hectares) e de 8% de Formações Florestais (-340 mil hectares) entre 1985 e 2019. Os pesquisadores também comprovaram uma redução de 24% na superfície de água.
A tendência de queda na vegetação natural é acompanhada por um aumento de 27% em áreas não naturais, que agora se espalham por 6,78 milhões de hectares, ou quase um terço (27%) da área total do bioma. O destaque fica para as pastagens, que passaram a ocupar 21,78 milhões de hectares, ou 25% do bioma – um aumento de 62% no período analisado. Em seguida vem a classe Mosaico Agrícola e Pastagem, que cobre 8% (6,68 milhões de hectares) e apresentou queda de 37%. O maior aumento percentual detectado foi na área de agricultura: embora ela cobrisse apenas 2,89 milhões de hectares, ou 3% da Caatinga em 2019, ano final da série histórica, ela teve um crescimento de 284% em relação a 1985. Por outro lado, as unidades de conservação cobrem apenas cerca de 8% do seu território e pouco mais de 1% recebe proteção completa.
A transformação na cobertura e uso da terra na Caatinga no período analisado mostram variações ao longo do tempo. As classes de vegetação natural registaram o seu declínio mais significativo no período 1985–1995, que foi também quando as áreas agrícolas registraram seu aumento mais significativo. Na sequência vêm os períodos de 1995–2005, 2005–2015 e 2015–2019, que são tanto intervalos de maior perda de cobertura vegetal e de maior expansão agropecuária. Com isso, o estudo confirma uma tendência de conversão constante e persistente da vegetação nativa, particularmente as savanas e outras áreas naturais não florestais, em terras cada vez mais utilizadas para agricultura e pastagem.
Restaurar a Caatinga para combater a desertificação
A expansão das terras agrícolas, o desmatamento e outras práticas de uso da terra, como as queimadas, causaram danos significativos ao bioma. Essas atividades resultam na salinização do solo, no aumento da evaporação da água. O uso persistente de queimadas para desmatamento agrava ainda mais esses problemas, intensificando o processo de desertificação no bioma Caatinga.
A restauração de paisagens e florestas pode ser uma ferramenta para combater esses riscos e adaptar o ambiente da Caatinga à mudanças climáticas. Estudo recente do Programa Raízes da Caatinga divulgado pelo WRI Brasil em julho mostrou oportunidade de restaurar 500 mil hectares em três estados do Nordeste, com benefícios sociais e econômicos para a agricultura familiar.
As regiões áridas e semi-áridas em todo o mundo enfrentam desafios complexos devido às alterações climáticas e às atividades humanas. A Caatinga – único bioma exclusivamente brasileiro, com aproximadamente 86,3 milhões de hectares, ou cerca de 10% do território nacional – é particularmente impactado pela influência humana. A recente detecção das primeiras regiões consideradas áridas no Brasil, nos mostra que a situação é preocupante.
A Conferência das Partes (COP16) da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (UNCCD) acontece no início de dezembro deste ano e o Brasil, país da Caatinga, tem o desafio de agregar e compartilhar os conhecimentos e aprendizados adquiridos para ampliar reforços. Trata-se de uma oportunidade crucial para se posicionar como protagonista em ações de geração de renda e combate à seca, marcando uma posição para a transição significativa nas tendências mostradas no estudo.
A conservação e a restauração da Caatinga só serão eficazes se houver engajamento das pessoas e ações sustentadas de gestão do uso da terra no bioma. Políticas públicas e regulamentação de leis são fundamentais para sustentar essas estratégias, garantindo os investimentos necessários para ampliar as ações e concretizar as oportunidades.