Por Douglas B. Trent*
O Brasil ratificou, neste mês de setembro, o novo acordo internacional sobre o clima – Acordo de Paris – que busca combater os efeitos das mudanças climáticas e reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Um dos objetivos do acordo propõe manter o aumento da temperatura média global bem abaixo dos 2 °C, quando comparada aos níveis pré-industriais, e buscar esforços para limitar o aquecimento global a 1,5 °C.
Este acordo é a nossa última chance. Com a ratificação dos Estados Unidos, China, Brasil, entre outros países que figuram na lista dos maiores emissores de GEE, agora temos uma oportunidade única, não de reverter os estragos já causados, mas de tentar evitar catástrofes maiores. Ao assinar o Acordo de Paris, o Brasil assumiu o compromisso de diminuir as emissões de GEE em 37% até 2025, e em 43% até 2030, tendo como base o ano de 2005.
No que diz respeito à realidade brasileira, o principal responsável pela emissão de gases de efeito estufa é o setor de mudanças de uso da terra – que inclui a alteração da cobertura vegetal por meio dos incêndios florestais e desmatamentos. Segundo dados do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), este setor contribuiu com 51% do total nacional de emissões entre os anos 1990 e 2014.
Apesar da melhora na redução das taxas de desmatamento na última década, o sistema de monitoramento de queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) mostra que os focos de incêndio no Brasil nunca ficaram abaixo dos 100 mil nos últimos 19 anos, chegando a atingir mais de 200 mil focos em alguns anos (como foi em 2015).
O fogo tem sido o meio para o desmatamento no Brasil (sendo o modo mais econômico de converter floresta em pasto ou terra para agricultura). A ameaça dos incêndios florestais está prestes a se tornar ainda mais grave nos próximos anos, uma vez que o aumento das áreas desmatadas e os efeitos das mudanças climáticas têm coincidido com um incremento dos extremos climáticos e, com eles, das secas, aumentando a suscetibilidade aos incêndios.
Diante dessa realidade, o que devemos fazer? Em minha opinião, a prevenção e o combate aos incêndios seria a maneira mais rápida e efetiva de reduzir as emissões de GEE, mitigar danos das mudanças climáticas e atingir a meta proposta pelo governo brasileiro no Acordo de Paris. Todavia, precisamos agora de projetos estruturantes de abrangência nacional, pois temos percebido que, mesmo com todos os pequenos projetos que existem no mundo, não estamos dando conta de implementar as mudanças necessárias para enfrentar a maior ameaça do século, o aquecimento global.
E é nesta perspectiva que está sendo construído o Clima Fund Brasil, uma proposta de estrutura de governança integrada, que tem como objetivo central a prevenção e o combate aos incêndios em Unidades de Conservação (UCs) e em outras áreas suscetíveis no Brasil. Embasado em critérios científicos e técnicos, o projeto pretende assegurar recursos financeiros e humanos, além de capacidade logística de apoio a equipes de brigadistas para que consigam chegar até os incêndios nos parques e terras que fazem fronteira com eles, em todo o território nacional, em prazo máximo de 24 horas.
Pela minha experiência de mais de 30 anos em iniciativas de desenvolvimento sustentável, outra estratégia central do projeto está no envolvimento das comunidades nas ações a serem empreendidas, de forma a associar a preservação da biodiversidade ao crescimento econômico local. Existem diversas atividades econômicas epráticas sustentáveis nas comunidades que estabelecem uma relação harmônica e equilibrada com a natureza e que podem ser fortalecidas e ampliadas com o projeto. Para isso, precisamos criar canais de diálogo, onde as populações locais possam trazer a sua experiência e dizer como deve ser a contribuição do ClimaFund Brasil.Pretende-se ainda desenvolver um amplo processo de educação ambiental, uma vez que quem conhece e se aproxima da natureza, a protege.
E como as ações serão financiadas? Os recursos para financiamento das ações de prevenção, mitigação e capacitação no combate aos incêndios serão originados de uma combinação de fundos, sendo o endowment a modalidade principal. Este tipo de fundo consiste na captação de recursos para criação de um patrimônio perpétuo, cujos rendimentos poderão ser utilizados continuamente para as atividades a serem desempenhadas.
Países como Peru, México, Equador e Costa Rica já possuem fundos como este operando em trabalhos para conservação da natureza, instalados em uma época quando a preocupação prioritária estava na proteção da biodiversidade. Hoje em dia, sabemos que se não reduzirmos a emissão de gases de efeito estufa, o aquecimento global trará prejuízos irreversíveis para o meio ambiente. Neste caso, a melhor forma de protegermos a biodiversidade é não deixando o planeta ferver. E não há razão para que o Brasil não faça isso! (#Envolverde)
* Douglas B. Trent é Ecólogo, citado no “Lonely Planet Brazil Guide” como o maior especialista em aves brasileiras e na Forbes Magazine como o “Birdman do Brasil”. Coordenador Internacional do Sustentar – 9º Fórum Internacional pelo Desenvolvimento Sustentável.