Emissão líquida zero em 2050, meta absoluta de corte de CO2 em 2030 e redução adicional de intensidade de carbono na energia poderiam compor compromisso do Brasil para o novo regime climático
Por Alfredo Sirkis* –
A definição da nossa INDC (Contribuição Nacionalmente Determinada Pretendida) é uma pedra angular no posicionamento do Brasil com vistas à COP-21, a conferência do clima de Paris. A primeira consideração é que não deve haver pressa. Convém promover o mais amplo debate possível para chegar ao melhor resultado, até o final de setembro. Como a INDC representa um “lance inicial”, ou seja, o ponto de partida de um esforço de décadas de corte de emissões, é sensato fazê-lo utilizando sempre dois cenários: um mais convencional, em que as políticas de mitigação dependam mais de compromissos governamentais e dos mecanismos clássicos de comando/controle, e um outro em que se estabeleça um pano de fundo de forte estímulo à transição para economias de baixo carbono mediante mecanismos como a “precificação positiva”, a taxação de carbono e, apenas acessoriamente, mecanismos ditos de “mercado de carbono”. É o que costumo chamar de uma “Bretton Woods do baixo carbono”.
Ao definirmos nossos “lances” utilizaríamos sempre esses dois cenários.
Na minha opinião, a nossa INDC deve incorporar os seguintes elementos:
1 – Um objetivo de longo prazo, com vistas a 2050:
1.1 – Cenário 1: uma redução em 80% das chamadas emissões líquidas em relação a 1990.
1.2 – Cenário 2: Emissões líquidas zero.
2 – Um processo de revisão quinquenal buscando mais ambição a cada rodada, começando por 2020.
3 – A implantação, gradual, de um sistema tributário de taxação progressiva do carbono (em substituição de outros tributos), eliminação de subsídios a combustíveis fósseis e estabelecimento de mercados regionais de carbono.
4 – A participação na articulação global de mecanismos relacionados com a “precificação positiva” da redução de carbono e remuneração de ações de mitigação antecipadas (antes do prazo) e adicionais (além da meta) e a implantação desses mecanismos internamente no que couber.
5 – Um limite no agregado para as emissões brasileiras no horizonte 2030.
5.1 – Cenário 1: 1,3 bilhão de toneladas de CO2 equivalente
5.2 – Cenário 2: 1 bilhão de toneladas de CO2 equivalente
Embora seja mais correto utilizar como ano base 1990, o Brasil pode continuar utilizando o ano 2005. Isso seria mais compatível com nossa posição em relação a “obrigações diferenciadas” e politicamente mais vantajoso para nossa diplomacia.
6 – Um objetivo adicional em relação a poluentes de efeito climático não-GEE.
Aqui me refiro ao black carbon (fuligem) outros poluentes que contribuem para a mudança do clima, mas não via efeito estufa. O México, de forma heterodoxa, atribuiu-lhes um valor carbono-equivalente. O mais correto e coerente com os critérios do IPCC, o painel do clima da ONU, é coloca-los fora do cálculo, como uma medida adicional. Vale a pena fazê-lo, porque é um problema que precisa ser atacado não apenas pelos efeitos climáticos, mas também pelos efeitos ambientais locais.
7 – Uma meta adicional de intensidade de carbono para o setor de energia e indústria.
É de esperar que surjam propostas de que a INDC do Brasil seja expressa apenas em “intensidade de carbono por ponto percentual do PIB”, sem uma meta no agregado. Seria um atraso e um retrocesso por parte de um país que já atingiu o “pico” de suas emissões em 1995 e, objetivamente, reduziu-as mais que qualquer outro. A intensidade de carbono poderia entrar de forma adicional referindo-se aos setores de energia e de indústria.
A INDC deveria incorporar também compromissos relativos à adaptação com a valorização do papel da governança local e metropolitana. Deveria também explicitar que os compromissos finais do Brasil a partir da COP-21, em Paris, serão consagrados na Lei de Mudança Climática, 12187/09. (Observatório do Clima/ #Envolverde)
* Alfredo Sirkis é escritor, jornalista e diretor-executivo do Centro Brasil no Clima.
** Publicado originalmente no site Observatório do Clima.