Por Dal Marcondes, especial para a Synergia Socioambiental* –
O Observatório do Clima (OC) é a mais atuante organização brasileira no monitoramento e produção de estudos sobre mudanças climáticas no país. É uma entidade que reúne quase uma centena de outras organizações sociais comprometidas com o combate às mudanças do clima. Conversamos com o secretário executivo do OC, Márcio Astrini, um experiente participante das COPs climáticas, que, além de ter uma sólida formação em gestão pública, trabalhou por 13 anos no Greenpeace Brasil e é membro do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas.
Como você tem visto os avanços e retrocessos na COP28?
MA: Cada conferência tem suas metas próprias. Algumas decisões são tomadas na própria conferência, acordos são assinados e as coisas avançam. Há outras decisões que envolvem interesses de diferentes países, que precisam de mais negociação e amadurecimento. Nesse momento, quanto mais se conseguir aprovar o que vem pendente de outras conferências e limpar a pauta, melhor para o Brasil. Se esses acordos avançarem, poderemos caminhar para a COP de Belém, em 2025, com a agenda mais limpa e poderemos focar naquilo que realmente importa, que é o fim dos combustíveis fósseis.
E quais são os temas que precisam ser resolvidos para limpar a pauta?
MA: Nesta COP, avançou a criação do Fundo de Perdas e Danos, para apoiar os países e populações mais vulneráveis, mas ainda há que se negociar os recursos necessários para que esse fundo possa realmente atuar com efetividade. Há outros temas a serem discutidos até o final da conferência e o que não avançar aqui vai impactar nas pautas das próximas COPs.
O papel do Brasil nas COPs mudou?
MA: O Brasil começou a sentir o cheiro do que é uma COP, hospedar uma COP e, também, a expectativa que está sendo colocada em cima do país. O presidente Lula veio a Dubai e foi muito cobrado em relação à entrada do Brasil na Opep. Ele entendeu a contradição disso e já mudou a abordagem. Ouviu que não é só a pauta de floresta que vai mudar a realidade do clima. Se o país quer liderar a agenda climática global, precisa fazer a lição de casa e também falar de petróleo. O papel da sociedade civil para virar essa chave é fundamental.
O Brasil chegou a Dubai com uma pauta bastante objetiva, a criação do Fundo de Financiamento de Florestas. Essa ideia não vingou?
MA: O Fundo de Financiamento de Florestas defendido pelo Brasil estava tirando o foco do ponto principal dessa COP, que é conseguir um acordo para a descarbonização das economias com o fim do uso de combustíveis fósseis até 2050. Além disso, esse fundo precisaria de doadores e, por enquanto, é uma ideia. Não existe nada de muito concreto em relação a ele.
Há muitos representantes da indústria e de países petroleiros nesta COP. Isso está impactando as decisões de alguma forma?
MA: A ideia desta COP em um país produtor de petróleo deveria ser chamar a atenção para a necessidade de uma transição de modelo de negócios nesses países. Mas há uma reação do setor petroleiro em relação à meta de Net Zero 2050. Isso não é novidade, eles estão sempre atuando para atrapalhar as conferências e as negociações. Isso não é novidade.
Qual legado você acha que vai ficar da COP28?
MA: Realmente precisamos ver até o fim para ver como vai ficar. No entanto, não sou otimista. Acho que a gente tem cada vez menos tempo a perder, cada vez menos tempo para blá-blá-blá. Decisões muito importantes e urgentes precisam ser tomadas, e eu não sei se essas decisões vão sair daqui.
*Synergia Socioambiental e Envolverde na cobertura da COP28.