Clima

"É preciso dissociar o crescimento econômico de emissões"

Por Sonya Angelica Diehn, 

Ao medir o progresso humano, é preciso considerar o custo do desenvolvimento econômico para o meio ambiente, as sociedades e nossa saúde, diz Achim Steiner, diretor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.

A economia do futuro terá claramente menos carbono, menos poluentes e será mais eficiente em termos de recursos. É o que prevê o teuto-brasileiro Achim Steiner, diretor executivo do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

Em entrevista à DW, ele alerta que, se não dissociarmos o crescimento econômico das emissões, os efeitos das mudanças climáticas se tornarão irreversíveis. Segundo ele, o desenvolvimento da economia do futuro depende da rapidez com que a sociedade conseguirá se libertar do legado do passado.

DW: O desenvolvimento está intrinsecamente ligado ao crescimento econômico?

Achim Steiner: Esse tem sido certamente o paradigma do século 20. Crescimento econômico, Produto Interno Bruto (PIB), renda per capita: essas foram as principais variáveis com as quais tentamos medir o desenvolvimento, o progresso e o êxito de nossas sociedades. Mas isso também ocultou alguns elementos muito irracionais dessa medição por muito tempo.

Achim Steiner: “Estamos chegando aos limites do planeta”

Por exemplo, um grande vazamento de petróleo é muito bom para o crescimento econômico porque a limpeza custa muito dinheiro e isso contribui para o PIB. Mas a destruição que desencadeia nas comunidades, na natureza, nas espécies, nos ecossistemas que não se recuperam, nunca é captada.

Por essa razão, grande parte da disciplina econômica, mas também do desenvolvimento sustentável, tem tentado nos últimos anos encontrar melhores formas de medir o progresso humano.

A extinção de espécies, as 7 milhões de pessoas que morrem prematuramente a cada ano, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), devido à poluição. Esse é o preço de um parâmetro muito estreito para medir e informar as opções de desenvolvimento.

Como o desenvolvimento humano pode ser dissociado dos danos ambientais?

Como sempre, não há nem uma bala de prata nem uma ação singular. Mas, antes de mais nada, é preciso ver onde o desenvolvimento pode oferecer uma oportunidade e uma solução, em vez de agravar o problema. Prioridade máxima são claramente a descarbonização, que está movendo nossas economias em uma trajetória de baixo carbono para o futuro e, por fim, zerar as emissões. Você pode criar minirredes e realmente proporcionar às pessoas um motor fundamental do desenvolvimento, que é o acesso à energia e à eletricidade.

A segunda área tem que ser o modo como lidamos com nossa infra-estrutura natural e ecológica. Investir na natureza, na restauração da terra, parando a destruição, por exemplo, das florestas, mas também de nossos ecossistemas fluvial e aquático.

E, finalmente, temos que aceitar a ideia de que é preciso incorporar a contabilidade de custos totais em nossos sistemas nacionais de estatística econômica, porque, uma vez que o preço da perda desses bens ambientais faz parte de um balanço nacional, começam a surgir decisões bem diferentes e investimentos muito mais racionais e caminhos de desenvolvimento passam a ser evidentes.

A vontade política pode ser desenvolvida a tempo de implementar isso e mudar a situação em tempo hábil?

A vontade política é uma espécie de moeda ilusória. Podemos atribuir toda a responsabilidade aos líderes políticos − mas os líderes políticos, por exemplo nas democracias, estão vinculados a sentimentos de curtíssimo prazo. E assim os líderes políticos desenvolvem sua coragem e compromisso de ação quando acreditam que há apoio público para isso.

Para Steiner, os cidadãos podem influenciar os políticos: basta fazerem sua voz ser ouvida

Portanto, também cabe aos cidadãos fazer a parte do que um político pensa ser uma receita para o sucesso. No meio da covid-19, as pessoas em muitas de nossas sociedades estão dizendo: “Veja, não podemos simplesmente voltar para onde estávamos antes.” Muitos líderes políticos, primeiros-ministros e presidentes estão começando a falar de maneira muito transformadora.

Na classificação clássica do Índice de Desenvolvimento Humano, os países europeus e anglo-saxões estão desproporcionalmente representados no topo. Mas esses países também têm uma longa história de degradação ambiental para alcançar tal prosperidade. O que isso significa para os países que desejam melhorar o próprio nível de desenvolvimento?

Houve um ou dois séculos em que a industrialização e o colonialismo, vamos mencionar isso também, permitiram que vários países se desenvolvessem rapidamente, reduzindo sua própria base de recursos e contando com os recursos naturais de outros países para desenvolver suas economias. Existe uma injustiça que às vezes é extremamente difícil de aceitar, especialmente para os países em desenvolvimento de hoje.

Estamos chegando aos limites do planeta. Se não conseguirmos dissociar globalmente o crescimento econômico das emissões, estaremos condenados de várias maneiras, pois os efeitos das mudanças climáticas se tornam não apenas inevitáveis, mas também irreversíveis.

Acho que o mais interessante e talvez mais encorajador é que a economia de amanhã terá claramente menos carbono, será menos poluente e mais eficiente em termos de recursos. Portanto, do ponto de vista do planejamento de negócios, faz todo sentido investir nesses setores e tecnologias que permitam maior competitividade no mercado.

Basta olhar para os problemas das principais montadoras de carros − a maioria delas não conseguiu detectar este sinal. E, do nada, você tem uma empresa chamada Tesla, que agora é a fábrica automotiva mais valorizada do mundo. Os mercados financeiros não são leais. Eles mudam suas afinidades muito rapidamente.

A questão é com que rapidez podemos nos libertar do legado do passado em nossa economia e realmente criar a economia do futuro.

Achim Steiner é ambientalista e chefia o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Antes disso, foi diretor executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e também atuou como diretor-geral da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), e como secretário-geral da Comissão Mundial de Barragens.

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