À medida que os impactos climáticos se intensificam, o mundo continua fracassando em atingir as metas do Acordo de Paris, com nenhum caminho confiável para restringir em 1,5º C o aquecimento global até ao final do século (acima dos níveis pré-industriais). É o que conclui o Relatório de Lacuna de Emissões de 2022, produzido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio-Ambiente (Pnuma), e publicado nesta quinta-feira, 27 de outubro. A professora Joana Portugal Pereira, do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ, é uma das autoras do capítulo 4 (“The emissions gap”) do relatório The Closing Window – Climate crisis calls for rapid transformation of societies.
O relatório indica que a manutenção das políticas climáticas atualmente em curso sugere que o aquecimento global chegará a 2,8º C. A implementação de todas as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) com o acréscimo de compromissos de neutralidade de carbono (equiparar as emissões e a captura de gases de efeito estufa) assumidas pelos países aponta para um aquecimento global de 1,8º C. Contudo, este cenário não é considerado plausível, devido à discrepância entre as emissões atuais, as metas de curto prazo das NDCs e as metas de longo prazo de neutralidade de carbono.
Somente uma transformação urgente e sistêmica poderiam evitar a aceleração de um desastre climático. O relatório busca compreender como propiciar esta transformação pela ação na geração de eletricidade, na indústria, no transporte, na construção civil, na produção de alimentos e nos sistemas financeiros.
Apesar do chamado ao fortalecimento das NDCs para 2030, os autores consideram que o progresso feito desde a COP 26, realizada em Glasgow (Escócia), em 2021, tem sido “lamentavelmente inadequado”. As NDCs submetidas desde então reduziriam as emissões globais em apenas 0,5 gigatoneladas de equivalentes de carbono (GtCO2e), comparativamente com as propostas apresentadas o ano passado.
O relatório aponta que os países do G20 apenas começaram a implementar esforços para cumprir suas novas metas e a expectativa é que, como um conjunto, o G20 não consiga cumprir as suas promessas para 2030, caso não reforcem suas ações. Essa falta de progressos deixa o mundo a caminho de um aquecimento de 2,8C, muito acima do proposto pelo Acordo de Paris.
Segundo os autores, para cumprirem o Acordo de Paris, os países signatários precisam reduzir os GEE em níveis sem precedente nos próximos oito anos e as emissões devem seguir em queda rápida e constante após 2030 para não exaurir o orçamento de carbono disponível para manter o aquecimento global no limite até o final do século.
Mesmo que a transformação não seja concretizada plenamente, cada fração de grau centígrado importa, e vários benefícios climáticos e sociais podem ser obtidos no processo, como acesso universal à energia, ar mais limpo e mais empregos “verdes”.
O relatório aponta que a transformação global para uma economia de baixo carbono vai requerer investimentos da ordem de 4 a 6 trilhões de dólares por ano. Os autores indicam que este é um percentual relativamente pequeno (1,5 a 2%) do total de ativos financeiros, porém significativo (20 a 28%) em termos de recursos anuais adicionais necessários.
Proporcionar tamanho financiamento implicaria na transformação do sistema financeiro internacional, suas estruturas e processos, mobilizando governos, bancos centrais, bancos comerciais, investidores institucionais e demais agentes financeiros.
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