Ambiente

Compromisso para proteção das florestas deveria tratar direitos indígenas como prioridade, afirmam especialistas

Ambientalistas brasileiros comentam acordo histórico pelas florestas e pedem transparência na aplicação de recursos financeiros

Nesta terça-feira (2), mais de 100 líderes mundiais assinaram um compromisso para deter e reverter a perda florestal e a degradação da terra até 2030, em evento convocado pelo primeiro-ministro britânico durante a COP 26, Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que acontece em Glasgow, na Escócia. A promessa, considerada histórica, é apoiada por quase £14 bilhões (US$ 19,2 bilhões) em financiamento público e privado. Especialistas brasileiros elogiam a iniciativa por promover a pauta da conservação em período de avanço de desmatamento, mas alertam para a importância de priorizar os direitos indígenas e incorporar o apoio financeiro à convenção para o clima.

“A declaração, apesar de não ser um acordo global vinculante, mostra a relevância do combate ao desmatamento para o centro do debate. Isso nos lembra como o governo Bolsonaro vem tratando nossas florestas e os povos da floresta, destruindo a legislação socioambiental e os direitos territoriais duramente conquistados”, afirma Maureen Santos, coordenadora do Grupo Nacional de Assessoria da FASE e membro do Grupo Carta de Belém. Ela lembra que a Amazônia já perdeu 7.010 km² de floresta apenas de janeiro a setembro de 2021, o equivalente a todo o ano de 2020, de acordo com dados do Inpe.

Para Pedro Martins, assessor jurídico da Terra de Direitos e membro do Grupo Carta de Belém, os direitos indígenas devem ser prioridade. “A iniciativa internacional reconhece a especial atuação de povos indígenas e comunidades tradicionais para a conservação de florestas, mas ainda sem definir os compromissos com os direitos dos povos indígenas. Estes direitos, aliás, devem ser abordados não como dependentes da conservação das florestas, mas sim garantidos para melhor desenvolvimento das estratégias de conservação. A Declaração prevê o aumento de financiamento privado para iniciativas de manejo florestal, resta ainda discutir quais as possibilidades e riscos deste novo arranjo internacional sobre florestas”, afirma.

Financiamento e ação climática

Para cumprir o compromisso, 12 países – entre eles, Reino Unido, Noruega, Coreia do Sul, Japão e EUA ofereceram £ 8,75 bilhões (cerca de R$ 68 bilhões), entre 2021 e 2025, para apoiar atividades em países em desenvolvimento, incluindo a restauração de terras degradadas, combate a incêndios florestais e apoio aos direitos das comunidades indígenas. O restante dos quase £14 bilhões (US$ 19,2 bilhões) virá de investimento privado.

Maureen Santos, que acompanha as negociações globais pelo clima desde 2008, ressalta a importância da transparência nas ações financiadas pelo acordo. “Ao mesmo tempo que esta declaração é importante, os recursos financeiros que serão anunciados precisam estar vinculados ao regime multilateral do clima e não em iniciativas por fora da convenção, que não tem regulação, previsibilidade e onde o equilíbrio de poder é bem menos favorável aos países do Sul Global”, afirma.

A proteção das florestas é uma das ações mais importantes para conter o avanço da crise climática. Atualmente quase um quarto (23%) das emissões globais vêm de atividades de uso da terra, como extração de madeira, desmatamento e agricultura. No Brasil, o avanço do desmatamento pode fazer com que a Amazônia mais emita do que absorva gás carbônico, de acordo com dados do Inpe.

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