Por Julia Faria Peixoto para o Fauna News* –
Com a pandemia de Covid-19 e a necessidade de a população usar equipamentos de proteção individual descartáveis, como máscaras e luvas, assim como o aumento no consumo de embalagens plásticas e de isopor por conta das compras em sistema de delivery durante esse período, a poluição nos oceanos piorou devido ao descarte incorreto desses materiais. Entre as consequências está o impacto negativo sobre a fauna marinha.
Dados do Panorama de Resíduos Sólidos do Brasil 2021, realizado pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), mostram que a geração de resíduos sólidos urbanos no país sofreu influência direta da pandemia durante 2020, tendo alcançado um total de 82,5 milhões de toneladas geradas, o que significa 225.965 toneladas diárias. Com isso, cada brasileiro gerou, em média, 1,07 quilo de resíduos por dia. Em 2019, segundo a entidade, o Brasil gerou 79 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos.
Sendo um país de grande extensão costeira e de intensa ramificação hídrica, o Brasil contribui com cerca de 2 milhões de toneladas de resíduos sólidos que chegam ao mar anualmente, de acordo com estimativas de outro relatório elaborado pela Abrelpe, lançado em 2018 em parceria com a International Solid Waste Association (Associação Internacional de Resíduos Sólidos).
Ademais, calcula-se que, em todo o mundo, mais de 25 milhões de toneladas de resíduos sólidos são despejados nos oceanos todos os anos. Desse total, 80% são provenientes das cidades.
A origem desses materiais vem “desde lixões, que muitas vezes são próximos a cursos d’água, ou são descartados em terrenos baldios, ruas ou mesmo em rios. Além dos resíduos deixados nas praias que, se não forem recolhidos a tempo, terão o mar como destino”, explica a bióloga do Instituto Argonauta, Natalia Della Fina.
Novos detritos encontrados no fundo dos oceanos – Foto: @operationmerprope/Instagram
Os produtos e as embalagens plásticas descartáveis estão no centro da discussão sobre a poluição plástica nos oceanos em razão das evidências de que compõem a maior parte do lixo marinho, segundo estudo de 2020 da ONG Oceana. De forma consistente, a limpeza de praias em todo o mundo demonstra que plásticos descartáveis e embalagens são o grande problema.
Diante desse cenário, uma análise produzida pela Universidade de Queensland, na Austrália, aponta que a contaminação dos oceanos, principalmente por plásticos, é responsável pela morte de cerca de 100 mil animais todos os anos.
Consequências para a fauna marinha
Os resíduos descartados de maneira incorreta, e que chegam aos oceanos, podem impactar o ambiente marinho de diversas maneiras, ocasionando, por exemplo, a interação direta dos animais marinhos com esses materiais. Segundo Natalia, esse contato com detritos “pode causar graves lesões, asfixia, comprometimento e falência dos órgãos do sistema digestivo, quando são ingeridos”.
Também há casos de perda de mobilidade quando o animal enrosca suas patas, asas ou nadadeiras em resíduos, o que o impede de realizar comportamentos essenciais para sua sobrevivência, como fugir de predadores, nadar/voar e, inclusive, se alimentar. Foi o caso de um golfinho (Sotalia guianensis) encontrado morto em uma praia do litoral norte paulista pelo Instituto Argonauta, que apresentava uma tira de chinelo enroscada em seu focinho e que impedia o animal de consumir alimentos.
Já como vítima do descarte inadequado do lixo pandêmico, tem-se o caso do pinguim-de-Magalhães (Spheniscus magellanicus), cuja causa da morte está atrelada a uma máscara encontrada em seu estômago. O animal foi recolhido pelo Instituto Argonauta na praia de Juquehy, em São Sebastião (SP) em 9 de setembro de 2020, dois dias após o feriado da Independência nacional. Para Natalia, casos como esses “evidenciam o quão impactante na fauna marinha são nossas ações com o descarte incorreto desses resíduos”.
Pinguim que tinha uma máscara no estômago – Foto: Instituto Argonauta
A bióloga do Instituto Mar, Laura Ippolito, chama atenção para o fato de o plástico afetar toda a cadeia alimentar, inclusive os seres humanos. De acordo com a pesquisadora, conforme esses microplásticos vão sendo retidos pelos animais filtradores, o ser humano, ao se alimentar de ostras, mariscos e camarões, por exemplo, podem estar ingerindo plástico. “Então, dessa forma, o lixo pode retornar para nós”, afirma Ippolito.
Como defender o mar da poluição por resíduos
Tendo em vista as consequências da poluição marinha pelo descarte incorreto de lixo, intensificadas pela pandemia de Covid-19, a bióloga Laura Ippolito afirma que para proteger os oceanos as pessoas precisam buscar informação para criar uma consciência ambiental, mudar hábitos e reduzir drasticamente o consumo. “O planeta não tem mais condições de absorver tudo que oferecemos como lixo”, alerta.
Outra solução para o problema de materiais inadequados no mar, segundo a Abrelpe, é o aperfeiçoamento dos sistemas e das infraestruturas de limpeza urbana nas cidades, que deve acontecer junto a programas permanentes de educação ambiental implementados em todas as camadas da população.
* Aluna de Jornalismo da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e integrante do portal Impacto Ambiental para o Projeto Nova Geração
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