Por Maria Fernanda Ziegler || Jornalista da Agência FAPESP, de revista Eco21 –
Mais de 54 mil compostos oriundos de produtos naturais da biodiversidade brasileira estão sendo reunidos em um banco de dados com informações sistematizadas sobre ocorrência, estrutura química e relação de artigos publicados. A coleção foi criada a partir do acordo firmado entre o Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (IQ-UNESP) e o Chemical Abstracts Service (CAS), uma divisão da Sociedade Americana de Química (American Chemical Society).
Com base em informações contidas em mais de 30 mil artigos publicados em revistas científicas, chegou-se ao total de 51.973 compostos de plantas nativas do Brasil. Somam-se a esses compostos outros 2.219 que vêm sendo sistematizados no banco de dados do Núcleo de Bioensaios, Biossíntese e Ecofisiologia de Produtos Naturais (NuBBE Database), da UNESP.
A compilação de informações de produtos naturais vem sendo realizada há seis anos pela pesquisadora Marilia Valli, sob a supervisão da coordenadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Biodiversidade e Produtos Naturais (INCT-BioNat), Vanderlan Bolzani.
“O acordo permitirá a criação do primeiro banco de dados certificado com informações sobre produtos naturais da biodiversidade brasileira. Ter essas informações organizadas em uma base de dados ampla e aberta para a comunidade científica é de extrema importância, pois vai facilitar o trabalho de pesquisa e criação de novos produtos químicos ou medicinais”, disse Bolzani, professora titular do IQ-UNESP, em Araraquara, e membro do Conselho Superior da FAPESP.
Com a iniciativa, serão reunidas em um único banco de dados as substâncias isoladas da biodiversidade brasileira e identificadas em todos os laboratórios do país. “Poderemos vislumbrar tudo o que já foi feito no Brasil de forma organizada. Isso é extremamente importante tanto para a Academia quanto para as empresas”, disse Bolzani, que também é membro da coordenação do Programa BIOTA-FAPESP.
A partir de uma lista de artigos científicos compilada pela equipe do NuBBE, o CAS – que tem uma equipe ampla e dedicada à criação de banco de dados – fez a seleção das informações, a ligação com a fonte de referência bibliográfica, a identificação das moléculas e a preparação de arquivos de transferência de dados, para que seja possível incorporar esses dados ao NuBBE Database.
Assim, ao fazer uma busca pelo nome da molécula, propriedades ou por sua estrutura, por exemplo, o sistema recupera todas as informações disponíveis na literatura científica, de forma organizada. “O grande diferencial do acordo é que o CAS está fazendo o licenciamento [doação] para a base de dados do NuBBE, que é de acesso público. Dessa forma, a base de dados ficará mais ampla”, disse Denise Ferreira, gerente nacional do CAS no Brasil.
De acordo com Ferreira, em função da experiência do CAS com seleção e curadoria de dados de substâncias químicas, será possível ter maior detalhamento das substâncias. A gerente nacional do CAS ressalta o ineditismo da doação, pois normalmente a entidade cobra pelo acesso aos seus bancos de dados. “A doação surgiu de uma contrapartida para o apoio da ciência brasileira, após o Museu Nacional no Rio de Janeiro ter sido destruído por um incêndio, em 2018”, disse.
O Brasil reúne aproximadamente 20% de todas as espécies do Planeta. Em razão de sua rica biodiversidade, o país conta com um enorme potencial para a produção de conhecimento e de produtos com valor agregado – incluindo medicamentos naturais ou derivados, suplementos alimentares, cosméticos e materiais para controle de pragas e parasitas agrícolas.
Bolzani ressalta também a importância desse sistema para a formulação de políticas públicas. “Com a base de dados, será possível perceber que os estudos tendem a focar sempre nas mesmas espécies, sendo que há uma diversidade enorme a ser estudada”, disse Bolzani.
Bolzani disse à Agência FAPESP que a inspiração para criar essa base de dados surgiu quando participou de um congresso científico na China, em 2005. “Fiquei fascinada com a base de dados sobre produtos naturais usados pela medicina chinesa. Decidimos, então, tentar criar uma base de dados robusta sobre a biodiversidade brasileira”, disse.
A sistematização teve como base o NuBBE Database, criado há seis anos por meio da colaboração entre o núcleo da UNESP e o Laboratório de Química Medicinal e Computacional (LQMC), liderado por Adriano D. Andricopulo, do Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo (USP).
“Nosso intuito com a parceria é que o banco de dados cresça o suficiente para representar a biodiversidade brasileira. Começamos a base de dados com informações sobre o que era descoberto em nosso laboratório. O uso por diversos outros pesquisadores nos motivou a expandir o conteúdo para abranger toda a biodiversidade brasileira. Entramos em contato com o CAS, que tem boa parte desses dados já compilada, e conversamos sobre este projeto que está sendo executado”, disse Valli.
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