Programa piloto no Brasil e comunidades tradicionais mostram que é possível reduzir as áreas queimadas por incêndios com atividades de prevenção, destaca vídeo
O mês de setembro chegou e, com ele, o período crítico de incêndios no Brasil, que se alastram com facilidade no auge da estação seca, ameaçando vegetações nativas sensíveis, a fauna e a segurança da população exposta ao fogo descontrolado e à alta concentração de poluentes no ar. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a ocorrência de queimadas no Brasil segue o calendário climático, com picos nos meses mais secos do ano, de julho a outubro, com seu ápice em setembro. Essa realidade pode ser prevenida por meio do uso de técnicas da estratégia do Manejo Integrado do Fogo (MIF).
Para reduzir as áreas queimadas por incêndios, o MIF envolve uma série de ações, como conscientização, envolvimento comunitário, recuperação de áreas degradadas, queimas prescritas nos biomas naturalmente adaptados ao fogo e outras atividades de prevenção e combate. A estratégia valoriza as comunidades tradicionais, que há gerações usam o fogo de maneira controlada e promovem o monitoramento de áreas naturais, fazem aceiros e se organizam de maneira articulada para vigilância e primeiro combate. Para explicar e ilustrar como esta estratégia funciona, o Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) e o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) lançam um vídeo informativo (assista abaixo). O filme tem como objetivo conscientizar a audiência preocupada com meio ambiente sobre a diversidade de ações que o MIF engloba, destacando seus benefícios.
Assista ao vídeo: https://youtu.be/4JTQeBy2OOM
Pesquisas provam vantagens do MIF
O programa piloto do MIF no Brasil, aplicado no Parque Nacional da Chapada das Mesas, Parque Estadual do Jalapão e Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins, em 2014, conseguiu reduzir 39% das emissões de gases de efeito estufa provenientes de incêndios na região, além de ter diminuído até 57% da área queimada por incêndios, em três anos. As emissões resultantes das queimas controladas e prescritas do MIF que são realizadas na transição entre as estações chuvosa e seca são muito menores do que as emitidas por grandes incêndios que ocorrem no auge da seca, que têm cada vez mais contribuído para as mudanças climáticas. O monitoramento e avaliação constantes, o processo participativo e o manejo adaptativo são peças fundamentais do sucesso.
Lívia Carvalho Moura, assessora técnica do ISPN que há mais de doze anos realiza pesquisa sobre o MIF no bioma Cerrado, comprova que as comunidades tradicionais e de agricultores familiares são as que mais conhecem o comportamento do fogo e sabem tanto prevenir quanto combater incêndios, mas é preciso promover a capacitação técnica para garantir segurança aos brigadistas comunitários.
“As comunidades tradicionais têm muito a ensinar à ciência sobre conservação ambiental. Um dos maiores ensinamentos é que é possível reduzir as áreas queimadas por incêndios no Brasil com planejamento, capacitação e envolvimento das comunidades rurais”, diz. A pesquisadora destaca que a aplicação do MIF pode reduzir pela metade a área queimada por incêndios. Há, entretanto, diferenças entre os biomas que devem ser consideradas.
A queima prescrita que é feita em algumas áreas do Cerrado não se aplica a áreas de florestas úmidas, por exemplo. No vídeo recém-lançado, Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM, comenta sobre as peculiaridades de biomas florestais, em que o fogo é indesejado. “Na Amazônia, o MIF é focado na confecção periódica de aceiros em áreas de risco, formação de brigadas locais, mapeamento da vegetação, das áreas vulneráveis e de barreiras à passagem do fogo”, explica.
Por que prevenir?
Os incêndios aumentam a poluição do ar e a emissão de gases do efeito estufa no Brasil e no mundo, acentuando as mudanças climáticas, alterando o ciclo das chuvas e aumentando as diferenças de temperatura. Seus impactos ainda incluem a morte de animais silvestres, degradação de ecossistemas, o aumento de doenças respiratórias e prejuízos econômicos a toda sociedade. Segundo Moura, a prevenção é tema urgente e pouco debatido. “O MIF precisa entrar na agenda das políticas públicas. Em vez dos combates urgentes, exaustivos, trágicos e caríssimos, entra em cena um planejamento preventivo”, afirma.
Dados do MapBiomas Brasil mostram que a perda líquida de vegetação nativa no país foi equivalente a área de 5,7 vezes o estado do Ceará, em um total 84,7 milhões de hectares, entre 1985 e 2021. A perda líquida de vegetação nativa indica o balanço entre desmatamento e regeneração no período. Falando em fogo, 20% de todo o território nacional (167,3 milhões de hectares) já queimou ao menos uma vez entre 1985 a 2020 – números mais recentes do MapBiomas Fogo. Cerrado e Amazônia representam 85% da área queimada nestes últimos 36 anos. Só no Cerrado, 36% da área já foi queimada. O estado de Mato Grosso foi o que mais sofreu com o fogo, seguido pelo Pará e Tocantins. Maranhão, Piauí e Bahia também encabeçam a lista dos estados mais impactados.
Necessidade de política pública
Para além da mitigação às mudanças do clima, o MIF possibilita uma economia aos cofres públicos, considerando que os gastos com combate a incêndios envolvem mais despesas com aeronaves, helicópteros, combustível, equipamentos e horas de trabalho e desgaste das equipes envolvidas. Todo o esforço de prevenção e planejamento do MIF garante um melhor custo-benefício.
Vários países que usam o MIF tiveram bons resultados, como é o caso da Austrália. “Com os resultados exitosos, a abordagem passou a ser implementada por diferentes países na África e tem se provado cada vez mais eficiente na redução de prejuízos ambientais e econômicos”, comenta Lívia. No Brasil, o Projeto de Lei (PL 11276/2018), aprovado por unanimidade em 2021 pela Câmara dos Deputados, aguarda tramitação no Senado Federal. O projeto institui a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, regulamentando a estratégia e permitindo a ampliação do MIF para todo o território brasileiro.
Sobre o ISPN
O ISPN é uma organização não-governamental brasileira sem fins lucrativos, fundada em abril de 1990 e sediada em Brasília. Com 32 anos de atuação, é reconhecido por sua experiência em conservação e uso sustentável da biodiversidade, apoiando povos, comunidades tradicionais e agricultores familiares nos biomas Cerrado, Amazônia e Caatinga. Tem como missão contribuir para viabilizar a equidade social e o equilíbrio ambiental, com o fortalecimento de meios de vida sustentáveis e estratégias de adaptação às mudanças do clima.
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Sobre o IPAM
O Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) é uma organização científica, não governamental, apartidária e sem fins lucrativos que desde 1995 trabalha pelo desenvolvimento sustentável da Amazônia. Nosso propósito é consolidar, até 2035, o modelo de desenvolvimento tropical da Amazônia, por meio da produção de conhecimento, implementação de iniciativas locais e influência em políticas públicas, de forma a impactar o desenvolvimento econômico, a igualdade social e a preservação do meio ambiente.
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