Por Sucena Shkrada Resk
O ancião Sudan, no alto dos seus 45 anos e cerca de 2,3 mil quilos e 1,82m de altura, não venceu a batalha que travava contra uma infecção que atingiu sua pata direita traseira, no mês de março. O último exemplar macho de rinoceronte-branco do norte do planeta foi submetido a uma eutanásia, que foi a opção considerada mais viável pelos veterinários que tratavam dele no Ol Pejeta Conservancy, área de proteção no Quênia, no continente africano. A sua morte, no entanto, simboliza muito mais. Significa o peso da pressão predatória praticada pelo ser humano contra diferentes espécies de fauna, ao longo de centenas de anos e a resiliência de um sobrevivente, que conseguiu ter uma trajetória de vida surpreendente.
O imponente mamífero conseguiu fugir das estatísticas de vítimas fatais de caçadores, ao ser transferido décadas atrás ao zoo de Dvůr Králové, só retornando ao seu habitat mais recentemente, pouco antes da sua morte. Para se ter uma ideia, nos anos 70, eram encontrados somente cerca de 500 exemplares dessa subespécie de mamífero. O interesse pelos chifres desses animais em um mercado clandestino principalmente asiático teve um poder devastador de destruição.
Hoje restam apenas duas fêmeas – Najin, filha de Sudan, e Fatu, sua neta. Pesquisadores tentam viabilizar por meio de informações genéticas (sêmen) de Sudan ou de rinocerontes-brancos do sul, a inseminação artificial e, com isso, a possibilidade de que haja a gestação de embriões em uma reprodução assistida. A chance de êxito é considerada mínima e o custo do procedimento é alto, exigindo angariar recursos. Outro parente desta espécie, o rinoceronte-negro do Oeste Africano também foi extinto em 2011.
Um giro pelo mundo
Na lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) 2017, há atualmente na lista de fauna, 748 possivelmente extintas. No Brasil, as baixas de espécies endêmicas são principalmente de aves. De acordo com os cientistas, não teremos oportunidade de ver mais a coruja caburé-de-pernambuco (Glaucidium mooreorum); a ave gritador-do-nordeste (Cichlocolaptes mazarbarnetti), a ave limpa-folha-do-nordeste (Philydor novaesi); a perereca-verde-da-fímbria, (Phrynomedusa fimbriata); o roedor rato-de-fernando-de-noronha (Noronhomys vespuccii).
A história desses animais nos remete ao anúncio do encaminhamento da sexta extinção de espécies em massa relatado por inúmeros cientistas. No processo evolutivo da Terra, em quatro bilhões de anos, já ocorreram as cinco anteriores que, entretanto, eram atribuídas a causas naturais, como do impacto do meteorito a 66 milhões de anos. Agora, o ser humano está na função central de vilão. Nos últimos 518 anos, estima-se que 322 espécies foram extintas e o processo se acelera cada vez mais. Mudanças climáticas, desmatamento, guerras, ações predatórias de caça se somam na lista de ações que acarretam este crescente declínio.
Notícias positivas de programas e projetos de reintrodução de algumas espécies na natureza e aumento de exemplares existem, mas são processos mais difíceis e morosos, que não substituem o principal: a cultura da conservação permanente. No Brasil, segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Bidiversidade (ICMBio), há exemplos de iniciativas relacionadas ao lobo-guará, à onça-pintada, o pato-mergulhão e ao peixe-boi, entre outras. A esperança é que esses animais tenham uma sobrevida por centenas de anos, chance que não está sendo dada aos rinocerontes e outras espécies por causa do modelo de desenvolvimento que adotamos no planeta.
Sucena Resk é editora do Blog Cidadãos do Mundo e jornalista especializada em meio ambiente (#Envolverde)