Por Lívia Ferrari* –
A violência contra o clima deixa marcas trágicas no Brasil: O Nordeste seca. O Sul alaga.
Onde estão as políticas públicas?
Com essa indagação, compartilho um importante exemplo de iniciativa pública que mudou a realidade de uma região.
Em 2012, tive a oportunidade de acompanhar o lançamento do programa do governo federal para a construção de cisternas nos nove estados do semiárido nordestino, além de Minas Gerais. A iniciativa, parceria entre a Fundação Banco do Brasil (FBB), o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) – rede formada por organizações da sociedade civil – ampliaria o acesso à água potável, para consumo humano, produção de alimentos e criação de pequenos animais.
Voltado para famílias em vulnerabilidade social e baseado em tecnologias sociais, o projeto consistia em captar e armazenar água da chuva em cisternas construídas perto da casa das famílias, permitindo que as comunidades locais tivessem água potável durante os oito meses anuais de seca. O conceito do programa era a convivência dos sertanejos com a seca. Estava prevista a implantação de 1 milhão de cisternas para o semiárido.
Fazendo parte do projeto, as próprias famílias construíam as cisternas com placas de cimento, a partir de assistência técnica e treinamentos especializados em construção e manejo.
Poucos meses depois, os resultados eram visíveis: a produção e o consumo com utilização da água das cisternas proporcionou melhorias na alimentação e na qualidade de vida. Até 2015, o semiárido nordestino tinha 500 mil cisternas instaladas, num cenário nunca antes visto pelas populações locais. ‘Minha mãe agora bebe água de beber’, testemunhava, na época, o paraibano Edivalniro dos Santos, que, muito jovem, migrou da seca nordestina para o Sudeste à procura de oportunidades de trabalho.
Apesar de exitoso – e talvez por isso –, o programa foi desidratado nos governos Temer e Bolsonaro, até atingir seu ponto mais baixo no último ano do governo passado, com apenas 6 mil unidades entregues em 2022.
Essa triste realidade, contudo, parece, agora, ter ficado para trás. O programa das cisternas promete ser retomado pelo governo federal, com investimentos anunciados de R$ 562 milhões.
Foram lançados dois editais. Um para contratação de 52 mil cisternas para consumo e produção de alimentos no semiárido, e outro para 3,7 mil sistemas individuais e comunitários de acesso à água na Amazônia, a maior parte no Pará. Os equipamentos vão auxiliar sobretudo os grupos mais isolados de comunidades ribeirinhas e de reservas extrativistas com dificuldade de obter água potável. A tecnologia para a Amazônia inclui captação de água de chuva, captação de fonte complementar (no caso, de sistemas comunitários), além de instalação sanitária domiciliar, incluindo fossa séptica, chuveiro, vaso sanitário e pia.
São tecnologias importantes e sustentáveis para a redução de doenças de veiculação hídrica na região e geração de renda para as famílias. E muito mais do que isso: o acesso à água potável é direto humano fundamental.
*Lívia Ferrari – Coordenadora de Conteúdo da Alter Conteúdo