Por Alba Wodianer, especial para Envolverde –
Em abril de 2023, as três últimas usinas em funcionamento na Alemanha foram fechadas definitivamente. Há um ano o país tomou a decisão de abandonar a energia nuclear, após muitos anos de mobilização e discussão. Os dados mais recentes do site de comparação de tarifas Verivox mostram que, com esse movimento, a Alemanha conseguiu reduzir o valor das tarifas para os consumidores em até 17% e diminuiu as emissões de CO2 no setor de energia em 24%.
Mas nem tudo são flores, já que parte dessa redução na verdade foi terceirizada, pois a Alemanha passou a importar mais energia de outros países – entre eles a França, que declarou este ano que pretende aumentar de seis para 14 o número de usinas nucleares que planeja construir nos próximos anos.
Assim como a França, diversos outros países, como Estados Unidos e China, continuam a investir nessa tecnologia, argumentando que ela é necessária para alcançar as metas de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Líderes mundiais continuam defendendo o uso dessa fonte na transição energética global
Recentemente mais de 30 países se reuniram em uma cúpula nuclear em Bruxelas, e o discurso mais frequente é o de que a energia nuclear é uma solução crucial para reduzir as emissões de GEE e para atender à demanda crescente por eletricidade. Os defensores apontam para a confiabilidade e a estabilidade da energia nuclear, que pode fornecer eletricidade de forma consistente, independentemente das condições climáticas.
No entanto, a energia nuclear é frequentemente vista como uma fonte cara e economicamente inviável. A construção e manutenção de usinas nucleares exigem investimentos significativos de capital e os custos associados à gestão de resíduos nucleares e descomissionamento de usinas podem ser enormes. Além disso, os atrasos e os custos excessivos associados à construção de novas usinas nucleares são comuns em todo o mundo.
E os números do relatório O Estado da indústria Nuclear Mundial 2022 mostram que, apesar do discurso de um possível “renascimento nuclear”, a participação da energia nuclear na geração global de eletricidade está em declínio, sendo a primeira vez em quatro décadas que ela representa menos de 10% do total, enquanto, as energias solar e eólica têm crescido rapidamente e superaram a energia nuclear em 2021. E a Alemanha, ao abandonar a energia nuclear, demonstrou que é possível realizar uma transição energética bem-sucedida sem depender dessa fonte.
Brasil: Angra 3
No Brasil, a termonuclear Angra 3 voltou ao radar do governo federal. Recentemente, a estatal Eletronuclear lançou uma consulta pública sobre o projeto de conclusão da planta. Porém a contratação de Angra 3 pode ter impactos consideráveis na conta de luz dos brasileiros. De acordo com estudos da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), o reajuste médio na tarifa seria de 3%. Na linha de defesa da conclusão da usina está a Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades Nucleares (ABDAN), alegando que o governo é capaz de adotar medidas para que o custo da energia da usina nuclear fique abaixo de R$ 500 por megawatt-hora (MWh), o que ainda é mais que o dobro do custo de plantas eólicas e solares.
Além disso, a energia renovável, como solar e eólica, oferece uma alternativa mais acessível, segura e rápida para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Investir em energias renováveis, modernizar a infraestrutura de transmissão e promover o uso eficiente da eletricidade são medidas que podem acelerar a transição para um sistema energético mais limpo e sustentável.
Somam-se a tudo isso, várias preocupações importantes que os críticos da energia nuclear levantam. Uma delas é referente à segurança das usinas nucleares e o risco de acidentes nucleares catastróficos. Os desastres nucleares em Chernobyl e Fukushima são exemplos claros dos perigos associados à energia nuclear e do impacto devastador que esses acidentes podem ter no meio ambiente e na saúde humana.
Outra variável importante é o problema da gestão de resíduos nucleares. O combustível nuclear usado permanece radioativo e perigoso por milhares de anos, e não existe uma solução definitiva para o armazenamento seguro e de longo prazo desse resíduo. O descarte inadequado de resíduos nucleares pode representar um risco significativo para o meio ambiente e para as gerações futuras.
Em última análise, o debate sobre o papel da energia nuclear na transição energética global é complexo e multifacetado. Embora alguns países continuem a ver a energia nuclear como uma parte importante de sua estratégia energética, outros estão optando por se concentrar em fontes de energia renovável como alternativas mais seguras e sustentáveis. O futuro da energia nuclear dependerá de como os países equilibram essas considerações e respondem aos desafios ambientais, econômicos e sociais associados a essa fonte de energia controversa.