Nairóbi, Quênia, 27/4/2015 – A plutocracia é uma sociedade ou um sistema governado ou dominado por uma pequena minoria que concentra a maior parte da riqueza. Os ricos sempre foram poderosos e sempre houve elementos da plutocracia em todas as sociedades.
Pais desesperados que não podem pagar escola privada; famílias que ficam sem assistência médica porque as mineradoras que contaminam seus rios sonegam os impostos que pagaria seu tratamento; mulheres que dormem apenas quatro horas por dia para conciliar o cuidado com a família e a casa com um trabalho que gere renda; comunidades inteiras expulsas de suas terras para dar lugar às companhias estrangeiras; trabalhadores com salários tão magros que sofrem má nutrição.
Esses são apenas alguns dos informes publicados por colegas nos últimos meses. As pessoas se sentem frustradas pelo aumento do poder dos plutocratas.
Mas o grau de controle que exercem atualmente, o número de super-ricos que essencialmente compram o poder político, a perseverança quase impossível necessária para superar as relações pública e os recursos legais e técnicos controlados por corporações e pessoas ricas, maior densidade de concentração da riqueza nos países maiores e a natureza global dos recursos, poder e conexões acumuladas que combinam para excluir opções democráticas significativas e espaços para uma vida além dos valores materialistas da plutocracia.
A lógica que se tira de tudo isto, a cobiça pelo dinheiro, o poder e o controle, é a antítese da preservação de um ambiente no qual prospere a vida. Ao longo da história a humanidade suportou vários sistemas sociais e políticos desequilibrados. As origens da economia de mercado remontam há vários séculos, mas só neste se tornou tão monolítica e com quase todo mundo só feitiço.
Vivemos a era do hipercapitalismo: fomos além da industrialização e do valor agregado até o ponto em que as regras são escritas por financistas; se poderia dizer que o setor financeiro passou a concentrar o maior poder político da história, uma vez que alguém realmente produza algo.
Um breve período de relativa igualdade nos países mais ricos após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) deu lugar no final dos anos 1970 a uma poderosa ideologia de competição, de crescimento sem fim e de ganhos ilimitados. Essa forma de pensar foi traçada de forma deliberada por institutos muito bem financiados por aspirantes a plutocratas.
A falta de limites, o privilégio outorgado à competição e aos ganhos, acima da cooperação e dos bens públicos, bem como a capitulação dos governos frente ao poder do dinheiro, fizeram da plutocracia moderna uma realidade dominante que precisa ser revertida.
Os analistas costumam falar de como as pessoas podem “contribuir para a economia”. Esta já não facilita o funcionamento da sociedade, os seres humanos vivem para servi-la. A “liberdade” foi reconfigurada para se referir à escolha do consumidor, em lugar da capacidade de determinar como ordenar a vida das pessoas.
Há alguns anos, debatia-se bastante sobre o conceito de “auge petroleiro”, a possibilidade de que estaríamos alcançado o início do fim dos fornecimentos utilizáveis de petróleo. Mas podemos estar chegando a um ponto mais perigoso: o auge da plutocracia, em que a sociedade e o meio ambiente já não podem mais sustentar a concentração de poder e recursos.
É preocupante ouvir sistematicamente colegas de todo o mundo mencionarem o grau com que as pessoas com poder limitam o poder das pessoas.
As provas do auge da plutocracia são:
* O até agora bastante exitoso esforço dos interesses empresariais para impedir medidas significativas em matéria de mudança climática;
* A pressão de uma agricultura de propriedade restrita, grandes fornecimentos e alta tecnologia que exclui os pequenos agricultores, entre os quais uma grande proporção é de mulheres, que alimentam a maior parte da população do planeta;
* A conivência de governos e empresas para conseguir o controle da terra e dos recursos naturais das comunidades para gerar lucros para estrangeiros privilegiados;
* A “corrida para o abismo” dos governos para sacrificar renda mediante a exonerações de impostos a fim de atrair investidores estrangeiros, mesmo quando os benefícios não estão claros ou são insignificantes;
* O fracasso dos governos na criação de leis que protejam os trabalhadores de abusos que vão desde seu tráfico, passando por salários miseráveis, até condições de trabalho que representam um risco inaceitável, nas quais as mulheres sofrem maior precariedade, magros salários e tarefas desumanas;
* O fracasso no reconhecimento do abuso sistemático dos direitos das mulheres em muitas áreas, mas em particular os profundos subsídios não compensados que oferecem às economias com seu trabalho de cuidado não remunerado ou mal pago, mas que permite o funcionamento das famílias e das sociedades;
* A pressão sobre os países, e ultimamente a conivência entre governos e companhias, para mudar as leis de proteção ao consumidor e comerciais para que as empresas estrangeiras possam dominar os mercados:
* O uso da coerção, incluída a violência, por parte das elites poderosas de empresas privadas, movimentos fundamentalistas e regimes repressivos para controlar o corpo das mulheres bem como suas escolhas reprodutivas e sexuais, seu trabalho, sua mobilidade e sua voz política;
* A pressão para privatizar escolas à custa de uma educação pública decente, apesar da total falta de evidência de que os resultados irão beneficiar alguém mais que não sejam seus proprietários;
* O desperdício injustificado com o setor público, e o recurso da maioria dos países e das instituições intergovernamentais doadoras à noção de “desenvolvimento encabeçado pelo setor privado”, mesmo diante da falta de modelos positivos;
* A fetichização do investimento direto estrangeiro em países de baixa renda apesar da evidência contundente de que nenhum país conseguiu um desenvolvimento sustentável com capitais estrangeiros;
* A crescente coincidência de interesses entre governos, corporações e elites para limitar a liberdade de ação de movimentos sociais e grupos de interesses públicos, estreitando o espaço político em todas as partes do mundo;
* A crescente dominação exercita pelas grandes corporações e pessoas mais ricas nos debates e nos processos da Organização das Nações Unidas (ONU);
* A descarada defesa ideológica da desigualdade e da concentração maciça de poder e recursos de pessoas ricas e dos institutos que financiam;
* O crescente número de desastres e emergências se tornam oportunidades para gerar lucro, enquanto as áreas afetadas se refazem segundo as regras dos plutocratas;
* A negativa dos governos em combater a crise do desemprego juvenil com programas de emprego público para atender a já reconhecida crise que paira sobre a infraestrutura desenfreada;
* A falácia da escassez revelada pela capacidade dos governos para encontrar importantes somas dos recursos públicos para financiar guerras, resgates financeiros, mas raramente para programas que empreguem pessoas, combatam a fome e as doenças e impulsionem a energia renovável;
A hiperconcentração da riqueza nas mãos de uns poucos corrompeu sistemas democráticos, tanto nos países ricos como nos pobres. Necessitamos democratizar o poder. Mas, não significa monitorar melhor as eleições, mas que o poder seja mais horizontal, mais acessível a mais pessoas, àquelas que estão envolvidas nas decisões que são tomadas.
Não há uma receita única para que isso aconteça. É preciso passar uma e outra vez, todos os dias, em todas as partes, com crescentes conexões para que aqueles com dinheiro e influência não nos deixem fora. Devemos ocupar espaços e não deixá-los, e depois ocupar outros. Envolverde/IPS
* Soren Ambrose é chefe de Política da organização ActionAid International.