Por Márcio Astrini –
Só na Amazônia perdemos cerca de um campo de futebol por minuto
O anúncio de Dilma feito nos Estados Unidos sobre seus planos no combate às mudanças climáticas é fraco e decepcionante. No encontro com Barack Obama, a presidente deu algumas das diretrizes que devem ser entregues à ONU até outubro deste ano. Se nada fosse anunciado, não faria diferença.
Dilma viajou mais de 7 mil quilômetros para dizer que, no caso das florestas, seu grande plano é “tentar” cumprir a lei. Não se trata, portanto, nem de meta, nem de novidade, mas de simples dever. O cumprimento da legislação florestal é algo que deve ser respeitado pelo chefe maior da nação, assim como, imagina-se, tenha ocorrido com todos os seus antecessores. Portanto, de acordo com o anúncio, nada muda nesta área, e o desmatamento segue.
Só na Amazônia perdemos cerca de um campo de futebol por minuto. No Cerrado, a situação é ainda pior. Enquanto isso, a seca se agrava no Sudeste, ocasionada por irresponsabilidades administrativas e pelo desmatamento sem controle de nossas matas. O Brasil tem cerca de 60 milhões de áreas já desmatadas ou subutilizadas, quantidade suficiente para dobrar a produção de alimentos sem a necessidade de derrubar mais nem um palmo de floresta. Acabar totalmente com o desmatamento é, portanto, possível, e deveria ser a meta a ser perseguida pelo país.
Além de fraco, o anúncio de acabar com a ilegalidade também é requentado. Ele já havia sido feito na publicação do plano nacional sobre mudança do clima, em dezembro de 2008. Lá também havia o compromisso de acabar com a perda líquida de florestas até 2015. Até hoje, nenhum foi cumprido.
Ao afirmar que teremos algo entre 28% e 33% de fontes renováveis em 2030 — tirando as hidrelétricas — Dilma apenas sentencia o país a ficar onde está, já que este é o percentual médio de participação em nossa matriz. Com alguma ambição, poderíamos chegar a pelo menos 45% de renováveis. Agora, se considerarmos que a demanda por energia irá crescer nos próximos anos, o setor emitirá muito mais carbono em 2030 do que hoje. Sendo assim, o plano da presidente se mostra incompetente e ineficaz, pois piora o quadro de emissões do setor de energia.
As mudanças climáticas ganharam destaque na mídia esta semana: estudos mostraram graves consequências para as populações mais pobres caso nada seja feito para conter o aquecimento do planeta. O Papa lançou um apelo mundial pelo combate ao aquecimento global. Um estudo do Observatório do Clima indicou como o Brasil poderia liderar esse debate, começando por ter uma meta ambiciosa de corte de emissões ancorada no desmatamento zero e em energia renovável.
Tais medidas trariam não apenas alívio climático, mas também oportunidades econômicas com melhoria na qualidade de vida da população.
Ainda que haja tanta mobilização em torno do tema, nada parece suficiente para sensibilizar Dilma. Ou, como diria um sábio amigo, não há barulho que faça acordar quem finge estar dormindo. (Greenpeace Brasil/ #Envolverde)
* Márcio Astrini, coordenador de políticas públicas do Greenpeace.
** Publicado originalmente no jornal O Globo, em 2 de julho, e retirado do site Greenpeace Brasil.