Por Ana Carolina Amaral, especial de Paris para Envolverde –
A Conferência da ONU sobre mudanças climáticas, a COP-21, começou nesta segunda em Paris com clima de negociação e esperança por um acordo climático. A ambição é de se conseguir um compromisso que barre o aumento da temperatura média global em até 2ºC. Desta vez, em vez de convidar os Chefes de Estado e de Governo para assinar o acordo no fim da Conferência, o país anfitrião inverteu a estratégia e recebeu os líderes nacionais hoje, já na abertura. Para os membros da delegação brasileira que acompanham as negociações do clima, a mudança fez diferença.
Rubens Born, consultor de meio ambiente e representante da sociedade civil que acompanhou 14 edições da conferência, vê a chegada dos líderes no primeiro dia do evento como um avanço significativo. “Agora os diplomatas têm a responsabilidade de negociar o que seu líder afirmou no discurso”, aponta. Ricardo Young, vereador por São Paulo e também integrante da delegação brasileira, concorda com a avaliação. “Antes os presidentes vinham para assinar o acordo, mas não tinha acordo para assinar. Enquanto que os negociadores, sem uma posição definida de seus Chefes de Estado, não tinham liberdade e atuavam de forma hesitante”, ele lembra.
Em seu discurso na plenária principal, Dilma Roussef defendeu hoje um acordo legalmente vinculante, ou seja, que gere consequências para os países que se comprometam. A União Europeia concorda, mas China e Estados Unidos, maiores emissores globais e que anunciaram suas metas voluntárias (INDC) conjuntamente em agosto, não assinalam nessa direção.
O instrumento da INDC foi também elogiado pelos representantes brasileiros. “Os anúncios voluntários criaram a oportunidade dos países discutirem seus compromissos internamente e com soberania. Com isso, os limites já estão dados, o que facilita a negociação”, avalia Young. “Não quero ser ingênuo, mas começamos com um tom de otimismo”, aposta Born, que completa: “nos próximos dias vamos ver se o discurso vai virar comando para resolver os gargalos do documento.”
Dinheiro, cobrança e tecnologia: os gargalos
Para Young, o financiamento das soluções climáticas se mostra cada vez mais perto de ser resolvido, com avanço na regulamentação do Fundo Verde e aumento da disposição de países doadores – a exemplo da prorrogação do acordo entre Brasil e Noruega sobre o Fundo Amazônia para até 2020. Já Born avalia que a criação de mecanismos de cobrança para a aplicação dos compromissos é um gargalo que está aparecendo conforme a viabilidade do acordo climática se aproxima. “Nem o Protocolo de Kioto, nem a Convenção do Clima falam em cobrança, então é algo que vamos precisar criar aqui”, explica.
A questão da tecnologia contra as mudanças climáticas segue com poucos sinais de avanço. Hoje a presidente Dilma Roussef teve conversas com líderes da Alemanha, Noruega, Japão e China. Para a imprensa, ela destacou que “o desenvolvimento tecnológico é crucial para as energias renováveis, principalmente a solar.” Born avalia que a posição brasileira deixa clara a baixa disposição em tornar a matriz energética mais limpa.
Na sua leitura, a escolha de 2005 – um ano com pico de desmatamento – como ano-base para a meta de redução das emissões brasileiras a partir do combate ao desmatamento ilegal na Amazônia pode ser uma tentativa de se abrir espaço para o aumento das emissões no setor de energia. “A gente sabe que a redução absoluta se relativiza com o ano que foi escolhido como base, 2005, e com isso se cria espaço para compensar a redução das emissões da floresta com o aumento das emissões de energia”, ele avalia.
À sombra de Copenhague
“Nosso maior medo é repetir Copenhague”, comentou o cônsul francês para assuntos políticos Thibault Samson em São Paulo, logo antes do início da COP. As inovações que trouxeram os posicionamentos dos países para o momento anterior às negociações diplomáticas parecem confirmar que os esforços franceses carregam aprendizados da COP-15. Como declarou hoje na plenária de abertura o presidente da França, François Hollande, o acordo climático precisa ser ambicioso o suficiente para resolver o problema, mas não a ponto de que não possa ser executado.
“Não existe bala de prata”, concorda Roberto Waack, da Coalizão Brasil pelo Clima. Para ele, a presença de mais de 500 mil pessoas em várias cidades do mundo na Marcha Mundial pelo Clima e iniciativas apresentadas pelas empresas e pela sociedade civil aqui na COP-21, a exemplo da Carbon Price Coalition, comprovam que o entendimento das mudanças climáticas avançou . “O protagonismo da sociedade civil pelo mundo é o que já está fazendo a diferença”, aposta. (#Envolverde)
.* Ana Carolina Amaral é jornalista formada pela Unesp, mestra em Ciências Holísticas pelo Schumacher College (UK) e moderadora da Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental.