Nossas escolhas, como consumidores cidadãos, podem mudar o mundo. Mas o que realmente sabemos sobre os produtos que compramos?
Por Redação do Greenpeace Brasil –
Em 15 de março de 1965 o então presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, discursou diante de seu Congresso sobre alguns conceitos simples que deveriam sempre permear as relações de consumo. Para ele, todo consumidor deveria ter direito a segurança, informação, escolha e à ser ouvido. Tal discurso repercutiu tanto que se transformou em um dos marcos na luta pelo direitos de defesa do consumidor. Alguns anos depois, em 1985, a ONU escolheu a data para celebrar o Dia Mundial do Direito do Consumidor.
Mas passados 51 anos, os conceitos apresentados por Kennedy, e previstos também no Código de Defesa do Consumidor brasileiro, de 1990, ainda estão longe de ser alcançados, especialmente quando se trata de transparência da informação. O que vemos atualmente são ataques sistemáticos aos mecanismos que nos garantem o direito de acesso a informação. E assim, acabamos sem saber o que estamos comprando. Escolher de forma mais responsável tem sido uma tarefa cada vez mais difícil de cumprir.
Um exemplo disso é o caso da Lista Suja do Trabalho Escravo. Publicada voluntariamente pelo Ministério do Trabalho e Emprego desde 2003, a lista era atualizada a cada seis meses, com os nomes de empresas e empregadores flagrados usando mão de obra análoga a de escravo. Mas graças a uma ação movida pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) – setor que geralmente lidera no número de flagrantes de trabalho escravo, ao lado de pecuária – a lista foi bloqueada no Natal de 2014 e continua assim até hoje.
Desde então, a única ferramenta disponível para consulta dos consumidores tem sido a “Lista de Transparência sobre Trabalho Escravo Contemporâneo”, obtida regularmente via Lei de Acesso a Informação pela ONG Repórter Brasil e a InPACTO que reúne empresas e organizações que assinaram o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. A quem interessa manter em sigilo o nome de empresas que usam trabalho escravo? Não aos consumidores, certamente.
A rotulagem de transgênicos também é emblemática. Em 2003 o Brasil foi um dos pioneiros ao exigir que os produtos fabricados a partir de insumos alterados geneticamente, os chamados Transgênicos, tivessem um aviso na embalagem – o símbolo “T” dentro de um triângulo amarelo. Mas a lei vem sofrendo forte ataque no Congresso. Apoiado pela poderosa bancada ruralista, um projeto de lei que flexibiliza a exigência já foi aprovado na Câmara e segue em pauta no Senado.
Há ainda o Cadastro Ambiental Rural (CAR) que, quando completo, trará informações sobre todas as áreas produtivas do Brasil. O prazo para o cadastramento encerra em duas semanas, com apenas 66% dos imóveis rurais inscritos até agora. Seus dados, entretanto, não estarão disponíveis publicamente, impedindo qualquer forma de controle social sobre informações que influenciam a vida de toda a sociedade.
O grande problema com o acesso à informação, pelo menos para governos e empresas, é que consumidores informados têm poder de fazer escolhas mais responsáveis para suas famílias e para o ambiente.
Pense em tudo o que o consumidor poderia fazer caso tivesse todas as informações de que necessita. Ele poderia, por exemplo, escolher não comprar carne vinda de frigoríficos que desmatam e escravizam na Amazônia. Mas hoje, essa informação não é clara e o produto que compramos no supermercado pode estar contaminado com a devastação da floresta.
Além disso, o consumidor não exije o suficiente. Uma pesquisa inédita divulgada pelo Instituto Data Popular e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), mostra que, embora os consumidores conheçam seus direitos, estes são pouco reclamados. As razões de não reclamar são diferentes para serviços públicos e serviços privados, mas em geral a população não acredita que sua voz será ouvida, que seu problema será resolvido, além do tempo e do custo de levar queixas adiante
O direito de escolha do consumidor é limitado e ao jogarmos toda a responsabilidade sobre ele, tiramos o foco de quem tem de fato capacidade e responsabilidade de mudar a forma e conteúdo de tudo que chega até nós: empresas e governos.
Mas o consumidor pode, sim, fazer sua parte, exigindo seus direitos. Juntos, temos mais poder do que imaginamos para virar esse jogo, ao cobrarmos de empresas e governos nosso direito de saber mais sobre a origem do que estamos comprando.
Neste Dia Mundial do Consumidor, te desejamos que seu direito de saber seja respeitado.
A floresta agradece. (Greenpeace Brasil/ Envolverde)
* Publicado originalmente no site Greenpeace Brasil.