Santiago, Chile, 9/10/2014 – A corrupção e a evasão fiscal constituem flagrantes violações dos direitos humanos na América Latina, pois contribuem para a desigualdade e a iniquidade nos países da região, segundo diferentes estudos e especialistas consultados pela IPS. “A evasão fiscal faz com que as pessoas mais vulneráveis não possam desfrutar plenamente de seus direitos econômicos, sociais, de saúde e educação”, afirmou Rocío Noriega, assessora de Governabilidade, Ética e Transparência do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Segundo Noriega, “a corrupção tem um impacto negativo sobre o gozo dos direitos humanos”. Além disso, afirmou à IPS, “constitui uma ameaça para a democracia, já que viola sistematicamente o fundamento da cidadania ao perpetuar uma desigualdade baseada no acesso de uns poucos ao poder, ao dinheiro e a ligações pessoais”. Os especialistas coincidem que a corrupção, como forma de destinação de recursos públicos para fins diferentes do bem comum, é um modo grave de violação dos direitos humanos.
Em 2013, o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos alertou que, como a corrupção pode ocorrer de muitas formas e contextos, é quase impossível identificar todos os direitos humanos que pode violar. A corrupção constitui um obstáculo para o desenvolvimento da sociedades, e também um grave obstáculo para o fortalecimento da legitimidade da democracia, pois sua prevalência e a percepção da cidadania sobre sua incidência nos assuntos e nas instituições públicas podem prejudicar gravemente o apoio ao regime democrático.
A pesquisa Latinobarômetro 2013 mostra que 26% dos latino-americanos entrevistados disseram conhecer algum caso de corrupção em seu país nos últimos 12 meses. Uma porcentagem semelhante diz que em seu governo quase todos são corruptos. Venezuela e México encabeçam a lista, com 39%, seguidos de Paraguai com 38% e Chile com 35%. Entre os países com menor percepção de corrupção estão Uruguai (19%), Nicarágua (17%), Honduras, Guatemala e Brasil (16% cada) e El Salvador (8%).
A analista Francisca Quiroga, especialista em políticas públicas da Universidade do Chile, afirmou à IPS que tanto a corrupção como a evasão fiscal têm uma relação direta com a desigualdade e a iniquidade. “As políticas tributárias são um instrumento para destinar recursos para o desenvolvimento das políticas sociais”, acrescentou.
Para Quiroga, “o componente que está por trás é assumir a desigualdade, a destinação da redistribuição de recursos e também gerar economias mais sustentáveis”. Segundo a especialista, “quando se fala de direitos humanos e de direitos sociais, em particular, um dos elementos que se deve ter presente é qual é a política tributária e quais os mecanismos institucionais que garantirão a legitimidade dessas decisões”.
A alta desigualdade é um dos traços mais destacados da situação social na América Latina. Dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) mostram que a região apresenta um nível de desigualdade na distribuição de renda que é substancialmente maior do que em outras regiões do mundo, com coeficiente Gini médio de 0,53. Este coeficiente mede a desigualdade de renda, vai de zero (total igualdade) a um (total desigualdade).
Como exemplo, o país menos desigual da região é mais desigual do que qualquer membro não latino-americano da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) ou de qualquer país do Oriente Médio ou do norte da África, afirma o estudo Evasão e Equidade na América Latina, da Divisão de Desenvolvimento Econômico da Cepal.
Os cinco países latino-americanos com pior distribuição da renda, segundo esse órgão, são Brasil, Guatemala, Honduras, Paraguai e Chile, nessa ordem. No Chile, por exemplo, a maioria das pessoas com emprego ganha cerca de US$ 500 mensais, em um país onde o quilo de pão custa US$ 2, enquanto as 4.500 famílias mais ricas vivem com mais de US$ 30 mil por mês.
Corrupção como problema
Para a maioria dos latino-americanos, a corrupção é um dos três problemas mais importantes em seus países, segundo as respostas dadas à pesquisa Latinobarômetro 2013. Na Costa Rica, 20% mencionam a corrupção, 29% os problemas econômicos e 6% a criminalidade. Em Honduras, a corrupção tem 11%, os problemas econômicos 61% e a criminalidade 28%.
No Brasil e na Colômbia, 10% dos entrevistados apontaram como sua maior preocupação a corrupção, que, no geral, ficou em terceiro lugar, depois dos problemas econômicos e da criminalidade.
Na Argentina e no Peru, 8% dos entrevistados colocam a corrupção como seu principal problema, na Bolívia e República Dominicana 7%, no México 6%, no Equador, Panamá e Paraguai 5%, na Guatemala 4%, na Nicarágua 3%, em El Salvador e na Venezuela 2%, no Chile e Uruguai 1%.
A Latinobarômetro destaca que a pesquisa poderia levar a se pensar que a corrupção não é um problema tão destacado como indicam especialistas e informes de transparência, mas isso acontece porque, como aconteceu antes com a criminalidade, em muitos países da região permanece como tema oculto, e citam o caso do México como grande exemplo. É nesse país onde mais cidadãos conhecem casos de corrupção (39%) e os informes de transparência o colocam como de alta corrupção, mas apenas 6% veem a corrupção como o maior problema. Envolverde/IPS