Pesquisa sinaliza riscos e aponta para a necessidade da formulação de uma estratégia para a promoção da bioeconomia na Amazônia
Existem várias visões sobre a bioeconomia e cada uma delas pode ser aplicada aos diferentes recortes da Amazônia, gerando desenvolvimento sustentável, emprego, conhecimento e riqueza. Contudo, a falta de uma estratégia nacional ou regional que aprecie as diferentes formas e visões do tema, e os objetivos que se deseja alcançar, pode fazer o setor se tornar vetor de desmatamento ao invés de alçar o país à potência mundial na bioeconomia.
É o que explica o estudo coordenado pelas pesquisadoras do Climate Policy Initiative/Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (CPI/PUC-Rio), Cristina Leme Lopes e Joana Chiavari. A pesquisa “Bioeconomia na Amazônia: análise conceitual, regulatória e institucional” apresenta o estado da arte da bioeconomia no Brasil, com ênfase para aspectos legais e institucionais.
A pesquisa apresenta a bioeconomia em três visões: biotecnológica, biorrecursos e bioecológica. O documento busca organizar as estratégias, marcos regulatórios, planos e programas dos diferentes atores e instituições nacionais para identificar alinhamentos e conflitos entre as visões. Mais do que isso, o estudo desenha um panorama para a Amazônia em que as diferentes perspectivas de bioeconomia possam coexistir.
Conforme a pesquisadora Joana Chiavari, a Amazônia possui as maiores oportunidades e também os maiores riscos relacionados à promoção da bioeconomia. Ao mesmo tempo em que a atividade pode ser vista como vetor de desenvolvimento econômico sustentável para a região, se não houver uma preocupação com o impacto de alterações do uso da terra e com a conservação da biodiversidade, ela também pode se tornar em uma ameaça para a floresta, devido ao desmatamento da vegetação nativa para a produção de biomassa.
“Quando se fala em bioeconomia para a Amazônia, de qual bioeconomia estamos falando? De qual Amazônia estamos falando? Qual é a estrutura de governança e os marcos regulatórios necessários para promover a bioeconomia na região?”, indaga Chiavari.
De acordo com o estudo, não basta entender as diferentes visões da bioeconomia é necessário entender ainda que há várias Amazônias e cada uma delas contém uma série de peculiaridades em termos de conservação, paisagem e atividade socioeconômica. Para facilitar a análise, a pesquisa trabalha com o conceito de “quatro Amazônias”: a Amazônia florestal, com floresta nativa e habitada em sua maioria por povos e comunidades tradicionais; a Amazônia desmatada, que conta com atividades agropecuárias e áreas degradadas; a Amazônia florestal sob pressão, que possui uma área de transição florestal e fronteira de expansão do desmatamento; e a Amazônia urbana.
Por exemplo, na Amazônia conservada, tanto atividades extrativistas quanto o uso de biotecnologia são formas de agregar valor à floresta e aos conhecimentos e modos de vida de povos e comunidades tradicionais. Na Amazônia desmatada, a produção de biomassa pode ser uma alternativa para a restauração de áreas degradadas. Já na Amazônia sob pressão, a produção sustentável de biomassa e outras culturas por meio de sistemas agroflorestais (SAFs) podem ser alternativas econômicas para conter o avanço do desmatamento. Por fim, hubs de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) e polos industriais de setores intensivos em alta tecnologia, como fármacos, cosméticos e química verde podem florescer na Amazônia urbana.
Uma estratégia de bioeconomia para a Amazônia
O Brasil não possui uma estratégia nacional dedicada à bioeconomia. Em contrapartida, possui um amplo conjunto de normas que regulamenta diferentes atividades relacionadas às três visões. Um dos principais desafios é alinhar marcos para as diferentes visões.
Também não há um órgão central, a governança da bioeconomia é atualmente, compartilhada por uma multiplicidade de atores e instituições, sem coordenação e diálogo entre eles. Com relação aos órgãos governamentais, o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o Ministério de Minas e Energia, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) se destacam com programas e atividades relacionadas à bioeconomia. Já o Ministério do Meio Ambiente (MMA) se encontra ausente das discussões sobre o tema.
Mas a atuação de cada ator e instituição é pautada por uma visão, um objetivo específico. A falta de uma estratégia nacional dedicada ao tema, ou mesmo de uma estratégia regional para a Amazônia pode fazer com que uma visão de bioeconomia prevaleça sobre as demais, atrapalhando o desenvolvimento sustentável e gerando danos socioambientais.
“Existem propostas que não analisam o risco de cultivo de biomassa para a produção de biocombustíveis gerar efeitos ambientais negativos. A conversão de floresta nativa para produção de biomassa pode ocasionar perda de biodiversidade e emissão de gases de efeito estufa, agravando ainda mais as mudanças climáticas, por isso é tão importante analisar a bioeconomia de maneira mais ampla”, afirmou Cristina Leme Lopes, pesquisadora responsável pelo estudo.
Sobre o Amazônia 2030
Como desenvolver a Amazônia, aproveitando de forma sustentável os recursos naturais? Para responder a essa pergunta, quatro reconhecidas organizações de pesquisa brasileiras se juntaram para fazer o mais completo plano de ações para a Amazônia dar um salto de desenvolvimento humano e econômico preservando seus recursos naturais até 2030. Trata-se do projeto Amazônia 2030. O projeto é uma iniciativa conjunta do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) e do Centro de Empreendedorismo da Amazônia, ambos situados em Belém, com a Climate Policy Initiative (CPI) e o Departamento de Economia da PUC-Rio, localizados no Rio de Janeiro. Pesquisadores têm gerado conhecimento a partir das experiências dos povos da floresta, empresários, empreendedores e agentes públicos. Esses documentos reunirão recomendações práticas, que poderão ser aplicadas por agentes privados e públicos.
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