Por Lauro Marins, Diretor Executivo do CDP Latin America –
O próximo presidente precisa se unir à transição de baixo carbono ou abrir mão dos benefícios que isso traz.
Durante décadas, o Brasil teve um papel proeminente na arena internacional quando o assunto era clima.
Sede da conferência Eco 92, o Brasil foi o berço da UNFCCC e da Convenção das Nações Unidas para a Diversidade Biológica. Vinte anos depois, na conferência Rio + 20, o país ajudou a dar vida às discussões da Agenda 2030, abrindo caminho para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Lar de cerca de um terço das florestas tropicais remanescentes do mundo, bem como de outros sumidouros naturais de carbono, como o Cerrado, o Brasil é essencial na luta para estabilizar os aumentos da temperatura global.
Até um terço da mitigação anual de carbono necessária para limitar o aumento da temperatura global pode ser alcançada com o controle do desmatamento e da degradação florestal.
Segundo o Instituto de Pesquisas Espaciais via satélite do governo brasileiro, INPE, o País reduziu sua taxa de desmatamento em 83% entre 2004 e 2012. No entanto, nos últimos anos os níveis vêm subindo e apesar de uma queda no ano passado, com a recessão econômica, os níveis atuais estão mais altos do que o mais baixo nível registrado em 2012.
No entanto, proteger os valiosos recursos naturais do Brasil tem sido uma conversa quase ausente nas eleições nacionais deste ano. De fato, nenhum dos candidatos fez qualquer menção específica à adaptação climática, e pouquíssimos estabeleceram uma posição clara sobre a interrupção do desmatamento.
Houve até pedidos para relaxar a regulamentação ambiental para estimular o crescimento econômico, incluindo uma proposta de Bolsonaro de retirar o Brasil do Acordo de Paris. Tal medida anularia as metas climáticas do Brasil, representando um retrocesso maciço para o País que até então se mostrava líder, particularmente na redução do desmatamento na última década.
Um dos principais reguladores de risco é a Lei do Brasil para Proteger a Vegetação Nativa, conhecida como Código Florestal. Este regulamento tem sido alvo de candidatos que querem tornar as regulamentações ambientais mais “flexíveis” e apaziguar o agronegócio do país e outros opositores à legislação ambiental.
Esta não é uma solução adequada para o Brasil.
O mundo já está em uma jornada rumo a uma economia verde e o Brasil tem muito a ganhar com essa transição.
Rico em biodiversidade, o País está bem posicionado para explorar modelos de negócios inovadores que valorizam o capital natural, como aqueles que buscam plásticos verdes à base de plantas da rica biodiversidade de seus biomas. Uma estratégia de crescimento sustentável seria o caminho mais lógico para o País superar a recessão e construir sua competitividade.
Um enfraquecimento da política ambiental pelo governo brasileiro também poderia aumentar o risco financeiro e a incerteza entre o setor privado, ignorando a demanda global de investidores e compradores de produtos com baixo teor de carbono e livre de desmatamento. Isso poderia afetar severamente a economia, dado que o Brasil é um dos maiores exportadores de commodities agrícolas.
De fato, a preocupação do setor financeiro em relação ao desmatamento está crescendo, com cada vez mais investidores estabelecendo políticas de investimento e empréstimos referentes ao combate ao desmatamento. Em 2018, 650 investidores institucionais que movimentam mais de US$ 87 trilhões em ativos financeiros solicitaram às empresas que reportem sobre como estão gerindo os riscos diretos e indiretos apresentados pelo desmatamento por meio da plataforma do CDP (antes conhecido como Carbon Disclosure Project), o qual sou diretor executivo para a América Latina. Em 2015, o maior fundo soberano do mundo, o Fundo de Pensões do Governo Norueguês, retirou 11 empresas do seu portfólio por causa de riscos associados ao desmatamento.
Em um artigo publicado em fevereiro deste ano, Adam Kanzer, Diretor Administrativo de Engajamento Corporativo na Domini Impact Investments LLC, um membro signatário do CDP, destacou o dever fiduciário dos investidores de proteger as florestas e os direitos humanos, e o papel crítico que devem desempenhar para garantir que o capital será alocado de forma responsável a longo prazo.
A mesma tendência é verdadeira das empresas. Em 2017, cerca de 87% das empresas globais viram oportunidades associadas ao abordar o tema de desmatamento, enquanto 73% das empresas informaram ter o compromisso de reduzir ou remover o desmatamento de suas cadeias de fornecimento.
Há um grande e crescente mercado de commodities livre de desmatamento – um mercado que qualquer novo governo deve estar pronto e disposto a abraçar.
Em todo o mundo podemos ver sinais de cidadãos, cidades, estados, empresas e investidores agindo onde seus líderes mundiais não estão.
Já não é politicamente viável votar em projetos prejudiciais ao meio ambiente, aos povos indígenas e aos trabalhadores rurais. Ao ignorar intencionalmente as demandas desses atores não-estatais, o governo brasileiro se veria em desacordo com a economia real e perderia a longo prazo.
Em vez disso, queremos ver o recém-eleito Presidente e o Congresso brasileiro se unirem ao mundo na implementação do Acordo de Paris e das ODS da ONU. Um primeiro passo fundamental para isso é manter e fortalecer as proteções florestais do país.
Em um recente relatório, “Mudanças Climáticas: Riscos e Oportunidades para o Desenvolvimento do Brasil” a Coalizão Brasileira sobre Clima, Florestas e Agricultura estabeleceu uma proposta de 28 pontos para os candidatos às eleições de 2018 para consolidar o país como liderança internacional de uma nova economia, na qual produção agropecuária e conservação ambiental devem andar juntas.
Os resultados das eleições da semana que vem podem ter grandes consequências para o futuro político do maior país da América Latina e para a maior floresta tropical do mundo e outros recursos naturais vitais.
Muitas vezes citado como o país do futuro, esperamos ver o Brasil superar uma mentalidade do passado e continuar a se posicionar entre os líderes do século XXI.
Se não o fizer, irá ameaçar o tão esperado desenvolvimento e capacidade de enfrentar a crise econômica que afeta o país.
A jornada para a nova economia climática já começou, mas o Brasil precisa acompanhar o ritmo da mudança.
Publicado originalmente no blog Beyond Bricks, do Financial Times
(#Envolverde)