Encontra-se em negociação na sede das Nações Unidas, o regime global de luta contra as alterações do clima a ser adotado no futuro próximo. O grande objetivo do processo é impedir que o aumento da temperatura da Terra ultrapasse 2 graus centígrados. Esse seria, de acordo com análises científicas consistentes, o limite que conseguiríamos administrar.
Todos os anos, além de várias reuniões mais técnicas, ocorre a conferência magna das Nações Unidas sobre o clima. A próxima será realizada em Lima, no Peru, nas primeiras semanas de dezembro. Seu sucesso é decisivo para que, na conferência de 2015 em Paris, os países tenham pronto o texto de um novo regime internacional que sucederá ao Protocolo de Kyoto.
Esse novo acordo deverá ser substancialmente diferente. Ele terá uma abrangência bem superior ao Protocolo de Kyoto. Além de tratar da mitigação das mudanças climáticas, deverá abordar as adaptações necessárias para lidar com essas alterações, bem como os meios para sua implementação, ou seja, como e quem pagará a pesada fatura.
É importante destacar que os resultados da presente negociação internacional terão impactos transversais em toda a economia e, portanto, em toda a sociedade. Ao fim do processo, deve ser definido um novo regime legal internacional que guiará as políticas dos países no futuro próximo em matérias tão diversas como energia, transportes, indústria, cidades, entre outras. Na verdade, trata-se de mudar o paradigma do crescimento econômico dentro dos limites do planeta, que, afinal de contas, são finitos.
Essa é a principal razão pela qual o processo é tão complexo. Na prática, embora se fale em acordo climático, o que vemos são os governos negociando o futuro de suas economias. Para a maioria das autoridades ainda se trata de quantidade de crescimento, quando, na verdade, deveríamos estar preocupados com sua qualidade. Em pleno século 21, o foco do debate não deveria mais ser quanto, mas como vamos crescer.
Historicamente, o crescimento tem sido o objetivo central das politicas econômicas, assumindo que com ele virá o aumento da renda e do bem-estar. Em resumo, para sermos felizes teríamos de ser ricos. Sabemos hoje que a correlação entre riqueza e felicidade não é totalmente verdadeira, principalmente, depois que se atinge um mínimo de renda que satisfaça as necessidades básicas.
O mesmo se aplica ao consumo. Será que para melhorar o bem-estar e, no limite, sermos felizes teremos de consumir cada vez mais? De que adianta termos carros mais caros e potentes se ficamos horas parados no trânsito? Não seria mais racional ter um sistema de transporte eficiente e com mais qualidade? E o que dizer do desperdício? De acordo com a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), é lançado no lixo, anualmente, cerca de 1,3 bilhão de toneladas de alimentos, um prejuízo de US$ 750 bilhões, ou R$ 1,6 trilhão.
No ritmo atual, com a criação de riqueza como maior objetivo, tendo o PIB como principal termômetro e admitindo que as atuais politicas tenham sucesso, certamente ficaremos mais ricos. A questão é se teremos ainda oportunidade, como sociedade, de usufruir os benefícios que essa riqueza poderia trazer ou se ela será consumida com medidas de adaptação a um clima cada vez mais adverso, combatendo a poluição do ar e dos rios ou mesmo tratando nossa saúde cada vez mais afetada.
O atual modelo de crescimento conduziu-nos a um precipício. Nossa geração tem nas mãos a possibilidade de decidir se muda de direção e cria paradigmas de crescimento sustentáveis de longo prazo, ou se continua caminhando em direção ao abismo.
* Pedro Miguel Sirgado é diretor do Instituto EDP, entidade que coordena as ações socioambientais do Grupo EDP.