Economia

PLURALE - Cuide dos Clientes antes de salvar o panda

Por Luiz Antônio Gaulia, Colunista de Plurale

“Satisfação garantida ou seu dinheiro de volta” era um slogan conhecido dos brasileiros entre 1970 e 1985. Quem lembra da marca Sears, maior cadeia de lojas de varejo daqueles tempos, mas que não sobreviveu diante da concorrência explosiva dos shoppings centers, sabe que podia confiar naquela promessa. A frase era verdadeira, funcionava. Hoje a Sears não está mais no Brasil, mas continua uma empresa global com uma cultura baseada no servir, encantar e engajar clientes[1].

Quando as promessas são feitas para serem cumpridas e estão alinhadas com as práticas reais das empresas, a tendência é que os clientes e os consumidores fiquem felizes, satisfeitos e fiéis. Mas mesmo assim, nem sempre cuidar bem do cliente é suficiente para evitar uma crise de imagem e de reputação. Um desvio de conduta da alta liderança ou um incêndio numa instalação são exemplos que podem gerar crises de imagem e reputação e afetar a opinião dos clientes e da sociedade sobre a empresa. Por isso, buscar a excelência no atendimento ao cliente deveria ser primeiro passo de qualquer negócio, pequeno ou grande.

No atual universo de públicos com os quais as organizações estão interagindo, a antiga “freguesia” mudou de cara e de comportamento. Um público-alvo não é mais um alvo fixo num plano de marketing. O antigo e passivo consumidor ganhou mais espaço pela força de leis criadas em sua defesa e pela sua capacidade de opinar, reclamar, elogiar e influenciar o mercado através das multifacetadas mídias sociais. A chamada geração Y nasceu no mundo digitalizado e possui forte senso de crítica e uma impaciência capaz de se transformar em uma crise real diante de uma experiência ruim.

Cuidar para que o “momento da verdade” [2] do cliente na loja, no restaurante, nos contatos comerciais oferecendo um atendimento de excelência, simpatia e atenção tornam-se obrigatórios. Essa regra é tão velha quanto óbvia. Mesmo que muitos empreendedores, vendedores, balconistas, garçons, taxistas, recepcionistas e até executivos de empresas de grande porte ainda não façam isso acontecer de fato. Não existe empresa pública ou privada que escape dessa premissa, mesmo porque nenhuma delas coloca em sua missão alguma coisa do tipo “Nossa razão social é atender mal a clientela e destruir valor no final do expediente”. Contudo, é um fato impressionante que continuam existindo profissionais desatentos, descuidados, sem qualquer tipo de cortesia ou empatia ou de mal com a própria vida, lidando com clientes e consumidores.

Outro slogan que já circulou muito era “O cliente tem sempre razão”. Lembram? Exageros à parte, nem sempre um cliente pode ter razão pois existem pessoas desonestas e de má fé tentando obter todo tipo de vantagem dos empresários, muitas vezes empreendedores visionários que estão criando produtos e serviços com propostas de valor compartilhado desde a sua concepção.

A questão maior neste texto é simplesmente ressaltar que se a empresa não faz o seu feijão com arroz, seu trabalho básico bem feito ela não vai conseguir dar passos maiores nem cumprir promessas nas áreas de responsabilidade social ou mesmo de filantropia empresarial. Estou falando de coerência entre o discurso e a prática. Entre aquilo que se deseja como um sonho e a realidade do dia a dia e que deve ser acompanhada de um modelo de gestão, de mérito tangível e comprovado com bons exemplos, atitudes e experiências permanentes de encantamento e de uma cultura organizacional voltada para tornar cada stakeholder um cliente satisfeito.

É por isso que não adianta tentar salvar o panda na China ou a floresta tropical no Amazonas se na lojinha aqui na esquina ou numa página de compras on line o consumidor levou gato por lebre, ficou a ver navios e foi vítima de um péssimo atendimento. Isso vale também para clientes B2B, corporativos, ok? E vale para todos nós como indivíduos. Se nos imaginarmos lidando o tempo todo com clientes em nossas relações diárias, como seria o nosso atendimento? O nosso cartão de visitas teria a promessa de respeito, educação, cordialidade e gentileza? Uma promessa cumprida?

Tenho pensado muito nisso. Afinal, tratar mal as pessoas próximas e tentar salvar causas distantes, mesmo que sejam justas e encantadoras com um filhote de panda, não me parece uma atitude muito coerente.

Por Luiz Antônio Gaulia, Colunista de Plurale(*) Luiz Antônio Gaulia é Colunista colaborador de Plurale. É Diretor da Talk the Walk Comunicação Sustentável, Mestre em Comunicação e Sustentabilidade pela PUC-Rio, especialista em Comunicação Empresarial. Trabalhou com marcas e empresas de grande porte como CSN, Light, Votorantim, Alunorte, Vale, O Boticário e Ajinomoto. http://gaulia.blogspot.com/


[1] Veja mais em https://searsholdings.com/about/culture

[2] De acordo com Karl Albrecht em “Revolução nos Serviços – como as Empresas podem Revolucionar a Maneira de tratar os seus Clientes” (Editora Pioneira, 1998) cada “Momento da Verdade” simboliza o ponto no qual o cliente entra em contato com qualquer parte da organização e nesse momento ele vai formar sua opinião sobre a marca.

Publicado através da parceria entre a Revista Plurale e a Envolverde