Por Daniela Pastrana, da IPS –
Navolato, México, 1/2/2017 – Ele tem oito anos e busca por sua irmã mais nova, Zoe Zuleica Torres Gómez, desaparecida em dezembro de 2015 quando tinha cinco anos, na cidade de San Luis Potosí, capital do Estado de mesmo nome. Ele é o mais jovem buscador por fossas clandestinas do México. Com pá e picareta, uniu-se na última semana de janeiro à Terceira Brigada Nacional de Buscas por Desaparecidos, que, no dia 30 de janeiro, encontrou os restos de um cadáver em uma fosse oculta em um campo de milho e sorgo na área comum de Potrero de Sataya, no município de Navolato, no Estado de Sinaloa.
Trata-se do segundo achado da Brigada, formada por um punhado de mulheres e homens que buscam entre a terra pistas de seus filhos, irmãos e pais desaparecidos durante os anos da guerra contra o narcotráfico, acompanhados de alguns ativistas defensores dos direitos humanos e sacerdotes católicos. “Um problema que não é reconhecido não pode ser resolvido”, ressaltou Juan Carlos Trujillo Herrera, o incentivador das brigadas, à IPS, que acompanhou seu trabalho em Sinaloa.
“Todos as promotorias do país estão saturadas com esse assunto, não há uma estrutura que nos permita pensar que a institucionalidade vai funcionar. Por isso temos que sair em busca de nossos familiares”, explicou Trujillo, que procura por quatro irmãos desaparecidos. Ao chegar à Presidência, em dezembro de 2006, o direitista Felipe Calderón (2006-2012) militarizou a segurança do país para combater as máfias do tráfico de drogas e lançou o México em uma espiral de violência da qual não consegue sair.
Um dado dimensiona a gravidade do problema: antes desse ano, o governo mexicano identificava sete grandes cartéis do narcotráfico. Dez anos depois, há cerca de 200 grupos criminosos operando no país, segundo informou este mês o Programa de Política de Drogas do Centro de Pesquisa e Docência Econômica (Cide). A informação do Cide, uma das instituições educacionais de maior prestígio do país, também registra pelo menos 68 massacres nesse período.
Em dez anos, a guerra contra o narcotráfico realizada por Calderón deixou mais de 177 mil pessoas assassinadas, das quais 73.500 durante a gestão de seu sucessor, o também conservador Enrique Peña Nieto. Também houve saldo de pelo menos 30 mil desaparecidos, embora os registros sobre desaparecimentos variem muito entre diferentes autoridades e organizações da sociedade civil.
Em 2011, o Movimento pela Paz com Justiça e Dignidade, liderado pelo poeta Javier Sicilia, colocou na agenda nacional a questão dos desaparecidos, ao evidenciar centenas de casos em todo o país, que conta com 122 milhões de habitantes.
Mas, só em outubro de 2014, com o desaparecimento forçado de 43 estudantes de magistério rural em Ayotzinapa, no Estado de Guerrero, e em janeiro de 2016, quando cinco jovens foram detidos por policiais estaduais em Tierra Blanca, no Estado de Veracruz, e desapareceram, que o país soube que muitos dos desaparecimentos atribuídos ao crime organizado eram, na realidade, desaparecimentos dirigidos pelas autoridades”. “Por isso não procuravam”, detacou Miguel Trujillo, irmão mais novo de Juan Carlos.
Desde então, no país se multiplicaram grupos de familiares que, desesperados pela ausência do Estado, começaram suas próprias buscas. Para isso, se preparam: fazem cursos de antropologia forense, arqueologia, direito, compram equipamentos de espeleologia, conseguem bateias para encontrar ossos pequenos, organizam grupos e se convertem em especialistas em identificar fossas e ossos.
As primeiras brigadas foram organizadas em março de 2016 em Veracruz, estado em que foram descobertos vários cemitérios clandestinos e onde até agora foram localizados 160 restos mortais. Agora, no país há entre 13 e 15 grupos de buscas. E, desde 24 de janeiro, saíram a campo diferentes grupos em Tamaulipas, Veracruz e Sinaloa, onde chegaram brigadistas de cinco Estados, para uma busca coletiva de 12 dias.
“São duas lógicas distintas de buscas, em vida e em morte. Creio que isso é o que nos falta, porque também temos que procurar pelos vivos, mas é que isso ninguém estava fazendo”, disse Juan Carlos Trujillo. Os grupos têm apoio de organizações da sociedade civil, como a brigada de Paz Marabunta, um coletivo de jovens da Cidade do México que integra a equipe de segurança das famílias.
“É muito difícil tratar essas realidades com os jovens, para que não fiquem desiludidos com a humanidade, mas o acompanhamento lhes dá esperança. Porque, quando se dão conta de que puderam ajudar a construir esperança, eles se reafirmam como construtores de paz”, explicou à IPS o diretor da Marabunta, Miguel Barrera. Sinaloa é a terra do cartel criado pelo poderoso chefe do narcotráfico Joaquín Guzmán Loera, conhecido como El Capo Guzmãn, extraditado em janeiro para os Estados Unidos.
A brigada fez duas descobertas: a de Potrero Sataya, e outra no município de El Quelite, a dez quilômetros do porto de Mazatlán. Até aqui chegou com sua mãe o menino de San Luis Potosí, para ajudar na localização de restos mortais.
“É algo que temos de fazer porque o Estado não está fazendo e não vai fazer nunca”, destacou Mario Vergara, que iniciou o grupo Los Otros Desaparecidos de Iguala, município onde desapareceram os estudantes de Ayotzinapa, e agora ajuda brigadistas em todo o país. “Estamos avançando na organização e vamos continuar. Os que ficam em cada Estado sabem se coordenar para fazer melhores buscas. Precisamos replicar o modelo em cada Estado e comprometer os governos para que ajudem os grupos de busca”, enfatizou Miguel Trujillo. Envolverde/IPS