por Friday Phiri, da IPS –
Marrakesh, Marrocos, 16/11/2016 – O Acordo de Paris contra a mudança climática, alcançado na cúpula de 2015 da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (CMNUCC), compromete as partes a buscarem uma economia com baixas emissões de carbono e resiliente à variabilidade climática. Mas a grande dúvida é como conseguir isso, especialmente no que diz respeito às nações africanas em desenvolvimento.
Considerada a “COP da implantação”, a 22ª Conferência das Partes (COP 22) da CMNUCC, que acontece nesta cidade do Marrocos até o dia 18, é uma oportunidade para redefinir alguns assuntos que ficaram pendentes no ano passado, na COP 21 realizada em Paris, segundo os negociadores africanos.
“Temos três grandes objetivos nesta COP 22: primeiro criar as bases para um marco legal e técnico sólido do Acordo de Paris”, afirmou Seni Nafo, presidente do Grupo Africano de Negociadores. “O segundo foco é pressionar para acelerar a ação após sua entrada em vigor, e, por fim, mas não menos importante, garantir fundos para a adaptação da África”, acrescentou.
Entre os assuntos que ficaram pendentes na capital francesa para esta COP 22, se destacam as modalidades para não superar o limite de dois graus Celsius de aumento da temperatura, os mecanismos para assegurar seu cumprimento e o êxito de um equilíbrio entre mitigação e adaptação, entre outros assuntos.
Para a África é fundamental eliminar os gargalos do acesso aos fundos para o clima. Segundo dados do Banco de Desenvolvimento Africano (BDA), esse continente, o mais exposto ao vai e vem climático, só pode ter acesso a menos de 4% dos recursos disponíveis devido à falta de projetos financiáveis.
Como o acordo se baseia nas Contribuições Determinadas em Nível Nacional (INDC), teme-se que a dificuldade de acesso aos fundos se complique mais, porque a maioria dos compromissos dos países africanos é imprecisa, de acordo com o Centro Africano de Política Climática da Comissão Econômica para a África, da Organização das Nações Unidas (ONU).
“O Centro está pronto para apoiar os países africanos na revisão de suas INDC, cuja maioria se mostrou deficiente”, explicou à IPS James Murombedzi, oficial encarregado, cuja sua organização quer que a implantação do Acordo de Paris seja inclusiva. Mas, ressaltou, nada será possível se a COP 22 não deixar bem claras as bases. Há anos os especialistas falam da construção de capacidades para conseguir a preparação de propostas que possam ser financiadas na maioria dos países africanos. Porém, recomendam cautela, pois o continente avança nessa direção.
Segundo Balgis Osman Elasha, responsável da área de mudança climática do BDA, o continente africano deve evitar “a armadilha do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL)”, de avançar sempre para a construção de capacidades e perder importantes oportunidades de financiamento. “A África não pode se beneficiar do MDL porque ficou presa no modo construção de capacidades, enquanto outros passavam à ação”, apontou.
O MDL, previsto no Protocolo de Kyoto, oferecia projetos de redução de gases-estufa ajudando as partes não incluídas no Anexo I a conseguirem o desenvolvimento sustentável e o cumprimento de seus compromissos em matéria de redução e limitação de emissões quantificadas.
Como se destacou, o equilíbrio entre adaptação e mitigação ocupa um lugar destacado nas negociações atuais. E, para as economias africanas, a adaptação não é uma questão de futuro, mas de presente. Os dados disponíveis mostram que a maioria dos países já enfrenta dificuldades econômicas, as quais provavelmente vão piorar devido às consequências da mudança climática.
Por exemplo, espera-se que a produção de cereais diminua 49% na África até 2050 pelas consequências da mudança climática, o que exacerbará a insegurança alimentar. O ministro de Desenvolvimento Hídrico, Saneamento e Proteção Ambiental, Lloyd Mulenga Kaziya, de Zâmbia, falou da necessidade de ações urgentes, em especial melhorar os serviços que o hidrômetro oferece, como medir o caudal, a velocidade e outras características dos cursos de água. “Zâmbia já está muito afetada”, ressaltou.
“Nos últimos cinco anos, nossos rios secaram, enquanto a frequência das secas aumentou, o que afetou os pequenos produtores em termos de produção e, para piorar a situação, não existe um fluxo de informação para as comunidades afetadas”, pontuou Kaziya. Zâmbia, país da África austral, necessita de ajuda urgente para melhorar seus sistemas de medição e integrá-los a setores essenciais como mineração, energia e agricultura.
Com essas importantes necessidades identificadas, os negociadores africanos pretendem elevar a voz da África, especialmente agora que são debatidas as modalidades e as normas de implantação do Acordo de Paris. “Segundo nosso principal objetivo de garantir fundos para a adaptação, uma das prioridades é manter a adaptação no mesmo nível da mitigação”, indicou Nafo, acrescentando que a adaptação não é uma opção para a África, mas uma necessidade.
De todo modo, o continente não está de braços cruzados. Na COP 21, foi lançada a Iniciativa Renovável para a África, para preparar o caminho do continente para um crescimento verde e inclusivo. E já conseguiu um compromisso econômico significativo, de mais de US$ 10 bilhões, para projetos de energia renovável, segundo o BDA, um dos sócios do empreendimento.
O presidente da COP 22, Salahedinne Mezouar, deixou claro desde o primeiro dia o tom das cobranças da África.
“Paris nos deu um compromisso global com a mudança climática e a COP 22 de Marrakesh nos proporcionará ações climáticas mais ambiciosas. Todos devemos estar no mesmo tom com o desafio e apoiar os países mais vulneráveis”, destacou Mezouar, se referindo à África, o continente mais exposto ao aquecimento global e que menos contribui para o mesmo, liberando apenas 5% das emissões contaminantes.
Nesta segunda semana de negociações, o grupo africano se mantém otimista de que os assuntos mais importantes, especialmente os meios de implementação, sejam resolvidos para que o Acordo de Paris avance com fluidez. Envolverde/IPS