Por Miriam Gathigah, da IPS –
Nova Délhi, Índia, 18/11/2015 – Os crescentes chamados para que a África reduza suas emissões de gás metano, produto da atividade pecuária, continuam gerando controvérsias. Especialistas as consideram um fator do aumento das temperaturas, mas os setores envolvidos exigem maiores provas a respeito. Inúmeros cientistas recordam que se trata de um gás contaminante esquecido e de curto prazo, com significativo potencial para acelerar o aquecimento global que o continente não pode mais ignorar.
Entretanto, os críticos dessa posição afirmam que, diante da falta de um acúmulo de provas científicas que apoiem a premissa de que as emissões de metano procedentes do gado africano constituem uma grande contribuição para a mudança climática, o continente deve ignorar os chamados para reduzir o volume desse gás que lança na atmosfera.
Por outro lado, especialistas como Asaah Ndambi consideram que, embora a África concentre apenas 3% das emissões globais de gases-estufa, “temos o maior potencial para reduzir os gases contaminantes por unidade de produto pecuário”, afirmou. Estatísticas da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) mostram que as emissões de metano do gado representam 14,5% dos gases liberados na atmosfera em escala global.
“Não podemos fugir do fato de que as emissões de metano por unidade de produção nos países em desenvolvimento, particularmente na África e Ásia, são significativamente altas em comparação com os mesmos animais nos países industrializados”, afirmou Ndambi, do Instituto Internacional de Pesquisa sobre Pecuária (ILRI), com sede em Nairóbi, no Quênia. Isso ocorre “devido à sua baixa produtividade nesses continentes”, explicou.
“Se forem ignoradas, as emissões de metano representarão um grande desafio no futuro”, apontou Ndambi, que participou de um fórum anual sobre mudança climática para jornalistas do Sul global, organizado pelo Centro para a Ciência e o Ambiente, nos dias 5 e 6 deste mês, em Nova Délhi.
Segundo a FAO, a pecuária contribui tanto de forma direta como indireta para a mudança climática por meio das emissões de gases-estufa como o dióxido de carbono (CO2), metano e óxido nitroso. Ndambi disse que as emissões de gás metano procedentes do gado representam cerca de 80% do gás liberado pela agricultura e 35% de todas as emissões produzidas pela atividade humana. As emissões de metano costumam ser o resultado do processo digestivo natural dos animais e do manuseio do excremento na atividade pecuária, detalhou.
O professor de climatologia Emmanuel Oladipo, da Rede de Mudança Climática, em Lagos, na Nigéria, disse à IPS que “são necessárias mais pesquisas sobre as emissões de metano pelo gado, mas não podemos ignorar o que indicam os estudos preliminares, o metano é um gás potente”.
Dados como os incluídos no quinto informe de avaliação do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC), divulgado em 2014, mostram que as temperaturas no continente africano, em particular nas regiões mais áridas, onde a maioria da população é pastoril, aumentarão mais rapidamente do que em outras áreas.
Na medida em que as pastagens áridas e semiáridas registrarem dias mais quentes, com frequentes ondas de calor, como indica o informe do IPCC, os especialistas dizem que, com as intervenções corretas, há uma oportunidade de que a geração atual experimente a eliminação gradual do metano como potente gás-estufa.
Segundo o IPCC, entre 65% e 80% do CO2, o gás-estufa produto da atividade humana que é o mais liberado na atmosfera, se dissolvem no oceano em um período entre 20 e 200 anos. O óxido nitroso é outro gás-estufa eliminado na atmosfera em um processo que pode durar cerca de 114 anos.
Já o metano é considerado um gás contaminante de curta duração, porque demora de 12 a 14 anos para desaparecer totalmente da atmosfera, mas tem uma capacidade muito mais forte de prender o calor. Na medida em que as temperaturas aumentam, a contínua elevação das emissões desse gás vai superar as de CO2, segundo os especialistas.
Para eliminar a contribuição da atividade pecuária às emissões de gases-estufa, os especialistas no fórum de meios de comunicação sobre mudança climática de Nova Délhi concordaram que deve haver dupla estratégia. “Devemos dar atenção à contribuição das emissões de metano pela pecuária, e às estratégias de adaptação e mitigação”, afirmou Ndambi. A África deve apostar em menos animais, porém mais produtivos, um chamado ao qual já demonstram resistência as comunidades pastoris, e outras que têm animais domésticos para fins religiosos, acrescentou.
A situação pode se complicar, porque alguns especialistas, como a nutricionista Sarah Akinyi, residente em Nairóbi, afirmam que o consumo de proteínas animais entre as populações mais pobres dos países em desenvolvimento é muito baixo. “Incentivamos maior produção e consumo”, afirmou. Com o crescimento exponencial da população nas nações em desenvolvimento, “naturalmente haverá maior consumo e produção de proteína animal”, ressaltou.
Se observarmos o total de emissões procedentes da atividade pecuária (média de emissões por animal multiplicado pelo número de cabeças de um país), o gado bovino responde pela maior proporção de gás liberado, seguido do leiteiro, dos porcos, dos búfalos e dos frangos, segundo o IIRI. “Isso quer dizer que as emissões por cabeça podem ser altas porque temos mais gado bovino no mundo ou porque as emissões pelo gado são elevadas”, avaliou Ndambi.
Ovelhas e cabras são responsáveis por um elevado volume de emissões por quilo de carne, mas seu número é menor e liberam na atmosfera menos gás do que o gado bovino. “Precisamos explorar estratégias de alimentação apropriadas, que aumentem a produtividade e também reduzam as emissões de metano da fermentação entérica. As estratégias, portanto, incluirão alimentar o gado com forragens melhoradas com complementos alimentares”, disse Ndambi.
“Embora as emissões por habitante sejam baixas (a divisão das emissões anuais de um país entre sua população), quando comparadas por unidade de produção, isto é, pelo litro de leite ou o quilo de carne, são elevadas”, explicou Oladipo.
Segundo o ILRI, outras estratégias incluirão a exploração de vários aditivos alimentares, como extratos de plantas, e a melhoria da eficiência da conversão do alimento. Ndambi explicou que a quantidade de alimento consumido por unidade de produção ajuda a reduzir o volume de metano, pois se demonstrou que animais mais eficientes produzem menos metano. Possivelmente, isso se consiga oferecendo uma dieta mais fácil de digerir.
A FAO também incentiva a conscientização sobre as estratégias e as tecnologias apropriadas para reduzir as emissões de metano da pecuária e para mitigar os efeitos do aquecimento global. Envolverde/IPS