Internacional

Agricultores em busca de investimentos

Sacas de milho no Depósito da Agência de Reserva de Alimentos em Kasiya, no distrito de Pemba, no sul de Zâmbia. Foto: Friday Phiri/IPS
Sacas de milho no Depósito da Agência de Reserva de Alimentos em Kasiya, no distrito de Pemba, no sul de Zâmbia. Foto: Friday Phiri/IPS

Conferência avaliará formas de incentivar as colaborações centradas nos agricultores e nos investimentos destinados a melhorar o âmbito econômico e o sustento dos produtores, cuja maioria vive em zonas rurais.

Por Friday Phiri, da IPS – 

Livingstone, Zâmbia, 3/5/2016 – “Sem agricultores não há alimentos” é um velho slogan ainda usado na União Nacional de Agricultores de Zâmbia e que poderia recuperar seu lugar na história, porque cada vez mais se busca na produção agrícola as respostas para vários desafios que afetam o mundo atual.Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o investimento nesse setor é uma das estratégias mais importantes e efetivas para conseguir o crescimento econômico e a redução da pobreza nas zonas rurais, onde vive a maioria das pessoas.

Os dados disponíveis indicam que o crescimento do produto interno bruto na agricultura deve ser de pelo menos o dobro para reduzir a pobreza que se origina em outros setores. Com essa evidência, a trajetória de desenvolvimento mundial se concentra em como o setor pode impulsionar a luta contra a fome e a extrema pobreza, dois dos grandes obstáculos para se conseguir o desenvolvimento sustentável.

A 6ª Assembleia Geral da Organização Mundial de Agricultores (OMA), que acontecerá entre os dias 4 e 7, em Livingstone, cidade do sul de Zâmbia, se concentrará, entre outros assuntos, no investimento agrícola e nos vínculos com o mercado. Sob o lema Associações Para o Crescimento, a conferência avaliará formas de incentivar as colaborações centradas nos agricultores e nos investimentos destinados a melhorar o âmbito econômico e o sustento dos produtores, cuja maioria vive em zonas rurais.

A FAO estima que será necessário investir outros US$ 83 milhões ao ano para reduzir a brecha entre o que os países de renda baixa e média investiram anualmente na última década e o que se necessita até 2050. No entanto, para os países em desenvolvimento como Zâmbia, a origem dos fundos é motivo de preocupação.

Evelyn Nguleka, a presidente da União Nacional de Agricultores de Zâmbia (ZNFU), acredita que a organização da Assembleia Geral este ano é uma oportunidade para que esse país se mostre como destino preferido para os investimentos agrícolas. “Temos terra, água, recursos humanos e bom clima, que favorecem o crescimento de todo tipo de produção agrícola”, ressaltou à IPS.

A realização da Assembleia Geral coincide com um momento fundamental para Zâmbia, que sofreu uma das piores secas em razão do fenômeno El Niño, que também afetou toda a África austral. “É um momento crítico para o desenvolvimento de nossa agricultura e temos que aproveitar a reunião para solicitar ideias e investimentos para melhorar nossa cadeia de valor agrícola, em um contexto em que os governos colocam a agricultura como pilar da economia”, afirmou a presidente da ZNFU, que atualmente também preside a OMA.

Ao destacar o desafio que significa o acesso ao mercado e a falta de mecanização, Nguleka espera que Zâmbia aproveite a plataforma da OMA para aprender com outros países que mecanizaram e agora colhem os frutos dessa mudança. “Como se sabe, a maioria é de pequenos agricultores e a maioria destes é de mulheres, e elas não são agricultoras, mas gerentes, e necessitam da mecanização para equilibrar as duas obrigações e reduzir o tempo que ficam no campo”, explicouNguleka, ao destacar a importância das mulheres no desenvolvimento agrícola.

O Movimento Vivendo Verde, que integra a Aliança para a Agroecologia e a Conservação da Biodiversidade de Zâmbia, estima que a conferência deve garantir que se ouça a voz dos pequenos produtores, que costumam ficar à margem desses grandes acontecimentos. “Aplaudimos o tema, que é oportuno. Mas dizemos não às associações multilaterais que, ao que parece, favorecem as grandes corporações, enquanto os pequenos produtores se perdem”, destacou Emmanuel Mutamba, diretor do Movimento Vivendo Verde e presidente da Aliança.

Mutambaopinou que a OMA deve tomar cuidado com os interesses egoístas das corporações, cuja agenda está principalmente pautada pelo busca do lucro.“A mudança climática chegou para ficar. Exortamos nossos representantes presentes nessa conferência a considerarem seriamente a difícil situação dos pequenos agricultores, que produzem 75% dos alimentos consumidos no país e que são os primeiros a sofrerem as consequências do fenômeno”, enfatizou.

“Deve-se buscar tecnologias sustentáveis para sua contínua produtividade, ou, do contrário, as associações que surgirem não terão sentido sem produção”, acrescentou Mutambaao destacar a importância de se enfrentar o aquecimento global.Quanto a agregar valor ao enfoque de conseguir um beneficio para todos, o Projeto Cultivar o Futuro da África, que procura reduzir as perdas da pesca no oeste de Zâmbia, poderia ser um exemplo perfeito.

Após oferecer aos pescadores tecnologia eficiente para gerir a pesca, o projeto se concentrou em financiar ideias de negócios destinadas a melhorar as tecnologias viáveis, cujos resultados procedem do esforço conjunto entre pescadores e pesquisadores,com o enfoque Pesquisa para a Ação Participativa.Chamado de Ampliando Oportunidades de Negócios para Jovens Africanos nas Cadeias de Valor Agrícola na África Austral, o projeto complementar CultiAF conta com fundos do Centro de Pesquisa para o Desenvolvimento Internacional do Canadá (IDRC).

“O projeto busca se diferenciar do enfoque habitual de utilizar comunidades com fins comerciais, que depois ficam abandonadas à própria sorte sem um plano de sustentabilidade”, explicou Jonathan Tambatamba, diretor de programas da ATDF Entreprrneurship Hub (AEH), empresa privada contratada pelo IDRC para implantar o projeto de comercialização.

Além da capacitação empresarial, serão escolhidas três ideias de negócios novas e criativas para cada uma ser financiada com US$ 5 mil, a fim de atender alguns dos desafios do processo do CultiAF, de conseguir sustentabilidade econômica e acesso ao mercado.

Para Joyce InongeNang’umbili, vendedora de pescado de 35 anos, a ideia de ter acesso a mercados confiáveis próximos de onde é produzida a cadeia de valor é muito parecida a um milagre. “Para alguns de nós, que recorremos à salga como a melhor opção para processar o pescado, o desejo é um adequado acesso ao mercado do pescado salgado, que não é muito conhecido pela maioria dos consumidores em Zâmbia”, observou.

Muitos atores esperam que os representantes na Assembleia Geral da OMA não se concentrem apenas em políticas centralizadas nos agricultores para atender os vínculos do mercado, sem serem responsáveis por investimentos agrícolas, com sérias consequências para a luta contra a mudança climática, que coloca em risco a própria existência da humanidade e o êxito dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), promovidos pela Agenda de Desenvolvimento para 2030. Envolverde/IPS