Por Tharanga Yakupitiyage, da IPS –
Nações Unidas, 13/6/2016 – Na luta contra o HIV/aids é necessário atender a exclusão de atores, contextos e regiões fundamentais para reduzir de forma significativa a enfermidade até 2020, segundo numerosos participantes da reunião de alto nível para acabar com a aids, realizada entre os dias 8 e 10, em Nova York, nos Estados Unidos.O encontroreuniu representantes de Estados membros da Organização das Nações Unidas (ONU) e da sociedade civil, para discutir desafios e soluções a fim de diminuir e prevenir de forma efetiva o HIV (vírus da imunodeficiência humana), causador da aids (síndrome da imunodeficiência adquirida).
O programa conjunto das Nações Unidas sobre HIV/aids (Onusida), organizador do encontro, destacou os grandes êxitos alcançados.As pessoas com HIV e em tratamento com antirretrovirais aumentaram para 17 milhões, dois milhões a mais do que o objetivo fixado pela Declaração Política sobre HIV e Aids para 2015. Desde 2000, esse aumento permitiu reduzir em 43% as mortes causadas pela enfermidade em todo o mundo.
Para aproveitar o impulso, a Onusida adotou uma nova Declaração Política com um enfoque ambicioso, que tem o objetivo de reduzir o HIV/aids até 2020 mediante uma estratégia conhecida como 90-90-90. Essa iniciativa procura conseguir que 90% das pessoas portadoras do vírus conheçam sua situação, que 90% das que a conhecem recebem tratamento, e que 90% das que recebem antirretrovirais reduzam a carga do vírus.
Se for alcançado o objetivo do tratamento, então as novas infecções cairão 75% até 2020 e se estará mais perto de pôr fim à epidemia de aids até 2030.As políticas e os recursos contra o HIV/aids se voltaram para aliviar a grande carga que suportavam alguns países, como os da África subsaariana, o que permitiu conseguir êxitos em termos de cobertura, mas também levou ao desatendimento de outras regiões importantes, como a África ocidental e a central.
“O número de pessoas que recebem o tratamento vital duplicou nos últimos cinco anos, mas na África ocidental e central isso não ocorreu e estão em situação de urgência”, destacou a consultora Cecilia Ferreyra, da organização Médicos Sem Fronteiras (MSF), na apresentação do informe. Segundo a MSF, essas duas regiões concentram 21% das novas infecções por HIV, 27% das mortes derivadas da aids e quase a metade das crianças infectadas pelo vírus, no mundo.
A organização também revelou que 76% das pessoas que necessitam de tratamento na África ocidental e central não têm acesso a ele. Isso representa quase cinco milhões dos 15 milhões que a Onusida se propõe atender com a iniciativa 90-90-90 até 2020.
Tita Gwenjeng, da Rede Pessoas Africanas com HIV/aids (NaP+) concorda que se trata de uma região desatendida. “Fala-se que o epicentro de toda epidemia é a África austral, e ali se concentra a atenção, em detrimento de outras partes do continente”, apontou. De fato, a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid) descreve a África austral em seu site exatamente como disse Gwenjeng: “a região continua sendo o epicentro da epidemia global de HIV/aids”.
Em 2009, o Plano de Emergência do presidente dos Estados Unidos para Alívio da Aids (Pepfar), que a Usaid ajuda a implantar, respondeu por 90% dos fundos bilaterais para 15 países, a maioria deles da África subsaariana.Essa visão reduzida levou a uma baixa cobertura do tratamento na África ocidental e central, o que pode contribuir para que se mantenham os casos de HIV/aids – se não aumentarem – na região e em setores estratégicos.
Em 2013, a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) concluiu que uma em cada 22 pessoas com HIV atravessava uma situação de emergência humanitária, e que um milhão de pessoas portadoras do vírus não recebiam tratamento nesses contextos. Na África ocidental e central, as emergências humanitárias aumentam devido aos conflitos.
O atual enfrentamento entre o Boko Haram e o governo da Nigéria deixou milhões de pessoas sem alimentos e serviços de saúde. Aproximadamente 75% das pessoas atingidas por essa situação não têm acesso a atenção médica no país. A violência generalizada aumenta e afeta as populações civis em toda a região.Segundo o Centro de Monitoramento de Deslocamentos Internos, o conflito já expulsou de suas casas cerca de dois milhões de pessoas e quase 200 mil se refugiaram em países vizinhos, como Níger, Camarões e Chade.
As pessoas deslocadas costumam ter um risco maior de contrair o HIV/aids. As mulheres e meninas sofrem a pior carga nesses contextos devido à violência sexual.Um estudo revela que pelo menos uma em cada cinco mulheres refugiadas ou deslocadas em situações humanitárias complexas sofre violência sexual, uma proporção que pode estar subestimada, ressalta o Centro.
A insegurança impede a atenção contra o HIV/aids, mas a MSF diz que as agências humanitárias costumam “considerá-la, de forma errônea”, complexa e não a priorizam nos primeiros serviços que prestam.A sociedade civil costuma estar à frente da resposta contra a enfermidade e não só em situações de emergência, mas também em iniciativas de longo prazo, por sua capacidade de chegar a populações de difícil acesso, e por seu profundo conhecimento das culturas e das populações com as quais trabalha.
Em um encontro prévio à reunião de alto nível, Gwenjeng destacou que grande parte do êxito da prevenção e do tratamento do HIV/aids ocorria “graças às organizações da sociedade civil”, mas agora ficaram relegadas a “uma posição secundária”.No dia 22 de maio, organizações da sociedade civil ficaram fora da reunião de alto nível de Nova York, 11 delas instituições de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros, a pedido da Organização para a Cooperação Islâmica. Entre elas estava a NAP+ e a Ação Afirmativa, uma organização camaronesa encabeçada por jovens.
Gwenjeng não sabe o que aconteceu, e Elvis Achiri Ndikum, fundador e presidente da Associação para a Promoção da Liderança de Jovens e Voluntariado, de Camarões, afirmou que a exclusão promove a discriminação e o estigma.“Lutar contra o HIV/aids não é uma questão de declaração política, mas de como viveremos em nossas comunidades. Se nos excluem, querem dizer que vão nos excluir de lá” também”, destacou, acrescentando que é importante que participem dos processos de decisão para erradicar a discriminação e contribuir para lutar contra a enfermidade.
“A ONU é o fórum dos direitos e da igualdade para todos, e todo o mundo tem direito de viver e gozar de boa saúde”, pontuouNdikum.A recém-adotada Declaração Política já gerou comentários encontrados sobre se dará resultado e poderá atingir seu objetivo. Envolverde/IPS