Por Jenny Ricks, da IPS –
Davos, Suíça, 22/1/2016 – Agora que a maioria das pessoas já se esqueceu de seus propósitos de Ano Novo, a atenção se concentra no que nos reserva 2016. E assim é para aqueles que querem resolver os maiores problemas do mundo. Entreos dias 20 e 23, políticos e empresários se reúnem em Davos para a assembleia anual do Fórum Econômico Mundial, e uma vez mais a desigualdade está na ordem do dia.
O consenso geral é que estamos vivendo uma crise de desigualdade e que a brecha que separa os mais ricos do resto da população tem uma profundidade que não se via em um século. Então, qual é a diferença em 2016? A iniquidade já é reconhecida como um fator social e economicamente nocivo por toda uma gama de pessoas influentes, como o papa Francisco, e instituições como o Fundo Monetário Internacional e a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos.
Não há escassez de reconhecimento de pelo menos uma parte do problema.E todos os países se comprometeram a combatê-la,por meio dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), conhecidos como a Agenda 2030, e o acordo climático acordado em Paris, em dezembro.Porém, o problema está longe de ser resolvido. A crua realidade, em contraste com esses compromissos, é que a desigualdade não está retrocedendo e os países e as instituições que pretendem combatê-la continuam aplicando as estratégias do status quo que exacerbam a iniquidade.
Então, o que se pode fazer? O desafio agora é passar do reconhecimento do problema para a solução. Para isso precisamos de três coisas: mudança nas políticas, mudança no poder, mudança na mentalidade e nas ideias referentes à forma como ocorrerá essa mudança.
A sociedade civil compreende claramente a contradição que existe entre o discurso e a realidade, bem como os próprios pobres que sofrem a pior parte dessa desigualdade e com os quais a ActionAid trabalha em todo o mundo. Eles não esperam que os líderes do mundo mudem sua forma de proceder, estão ocupados combatendo a iniquidade desde a raiz e criando uma nova realidade.
No dia 20, os dirigentes de uma diversidade de grupos de desenvolvimento, religiosos, sindicatos e organizações dedicadas ao ambiente, aos direitos da mulher e aos direitos humanos se reuniram para explicar o que falta fazer para lidar realmente com a desigualdade e se comprometer a redobrar a luta. Esta é umanotícia que entusiasma.
Por que esse problema tem importância para tal diversidade de grupos? “A crise de desigualdade ameaça as lutas por um mundo melhor. Os trabalhadores de todo o mundo vêm como os salários e as condições de trabalho são socavados, na medida em que aumenta a iniquidade. Os direitos das mulheres são sistematicamente piores em situações de maior desigualdade econômica”, denuncia uma declaração conjunta dessas organizações.
A grande maioria das pessoas mais ricas do mundo é de homens. Quem realiza os trabalhos mais precários e mal remunerados são as mulheres. Os jovens enfrentam uma crise de desemprego.Outros grupos – como os imigrantes, as minorias étnicas, pessoas com deficiências, lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, intersexuais e os povos indígenas – continuam sendo marginalizados e sofrem uma discriminação sistemática. Essas disparidades na riqueza e no poder prejudicam constantemente a luta para tornar realidade os direitos humanos da maioria.
Frequentemente, a extrema desigualdade também está relacionada com o aumento das restrições ao espaço cívico e aos direitos democráticos, já que as elites políticas e econômicas confabulam entre si para protegerem seus interesses.O direito ao protesto pacífico e a capacidade dos cidadãos para desafiar o discurso econômico dominante estão sendo restringidos em quase todas as partes, porque as elites sabem que a desigualdade extrema e a democracia participativa não podem coexistir por muito tempo.
Inclusive o futuro do nosso planeta depende de que se acabe com essa grande fratura, já que o consumo de dióxido de carbono por parte de 1% da população equivale a 175 vezes mais o consumo dos mais pobres.Embora o caminho seja árduo, sabemos que a mudança para forjar um novo sistema econômico, que coloque as pessoas e o planeta em primeiro lugar, somente será possível por um movimento popular.
Este não é um ano de cúpulas e compromissos de alto perfil. É um ano para construir o poder debaixo para cima e gerar um movimento em muitos países com estes grupos e outros que inclua os movimentos sociais e os jovens.Há motivos para a esperança e existe experiência para construir.
Sabemos que isso é possível porque vemos em nosso trabalho com comunidades em todo o mundo, por alguns exemplos positivos atuais e períodos anteriores de redução da desigualdade em países como o Brasil, e porque as pessoas ganharam grandes lutas no passado. Essa nova luta contra a desigualdade começou seriamente.Envolverde/IPS
*Jenny Ricks é diretora da Iniciativa Contra a Desigualdade, da organização humanitária ActionAid International.