Paul Ladd e Pedro Conceição*
Nações Unidas, 14/7/2015 – Desde ontem, e até o dia 16, Adis Abeba, capital da Etiópia, é a sede da Terceira Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento (FpD), enquanto na comunidade internacional ganha força a pergunta sobre quanto nos custará alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
A dúvida soa razoável à primeira vista, e flui naturalmente da experiência com os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), estabelecidos em 2000 e que vencem este ano, quando serão substituídos pelos ODS.
A grande aposta dos ODM era que os países pobres se concentrariam na redução da pobreza e na melhoria do governo, em troca da ajuda oficial ao desenvolvimento (AOD) que se somaria aos recursos mobilizados pelos próprios países em desenvolvimento.
Essa lógica, caracterizada por “tapar os buracos” levou a exercícios expansivos nos custos dos ODM, estimativas sobre a rapidez com que os Estados poderiam melhorar sua arrecadação fiscal e campanhas para aumentar a ajuda.
Muitos governos responderam, e se conseguiu numerosas coisas boas com a AOD, como ampliação dos programas de vacinação, mais meninos e meninas com assistência escolar, água potável para mais gente, e diversos outros êxitos que não são tão quantificáveis, como o fortalecimento gradual das capacidades institucionais.
Mas, como agora nos deslocamos para uma agenda de desenvolvimento diferente, mais ambiciosa, complexa, integrada e universal, também é necessária a reforma radical de nossa lógica sobre o financiamento.
Enquanto para alguns países continuará sendo importante “tapar os buracos”, sobretudo para aqueles com bases tributáveis muito baixas e desafios com fundos insuficientes, como algumas enfermidades transmissíveis, para a maioria o desafio terá a ver antes de tudo com a formação dos recursos existentes.
Assim, a resposta à pergunta “quanto dinheiro é necessário para alcançar os novos ODS?” é – que rufem os tambores – cada dólar que há no mundo.
Isso significa que cada dólar que gastamos como consumidores deverá funcionar a favor da consecução dos ODS e não contra eles. Isso inclui o gasto que dedicamos ao vestuário, comida e viagens.
Tudo o que compramos tem pequenos impactos nos ODS. Por exemplo, quando adquirimos uma camisa, também estamos “comprando” os resíduos ambientais que foram utilizados para a fabricação dessa peça de roupa, bem como as normas trabalhistas.
Mas não basta a ação voluntária dos consumidores. As empresas também terão que desempenhar seu papel.
Algumas começam a mudar seus modelos de negócios ao perceberem que a construção de uma companhia sustentável exigirá um mundo sustentável. Outras participam mediante investimentos que repercutem no desenvolvimento.
Mas, além dessas ações voluntárias, os governos deverão desempenhar e redobrar o papel fundamental da criação dos adequados incentivos e regulamentações para alinhar as ações de todos os consumidores, empresas e investidores.
O alinhamento do financiamento privado seria a grande conquista, mas a reforma na maneira como gastamos o dinheiro público também exigirá uma revisão profunda. O exemplo clássico é a energia. Se continuarmos dando subsídios às energias não renováveis, estaremos operando de maneira intencional e consciente contra os objetivos.
Em todo o mundo, calcula-se que os subsídios energéticos alcançarão US$ 5 trilhões este ano, aproximando-se de 20% do produto interno bruto (PIB) de alguns países, e em sua grande maioria se destinam aos combustíveis fósseis.
A reforma dos subsídios energéticos aumentaria a receita pública no mundo em US$ 3 trilhões ao ano, baixaria as emissões de dióxido de carbono em 20% e reduziria pela metade as mortes prematuras causadas pela contaminação do ar.
Às vezes, os incentivos, a regulamentação e a reforma fiscal são vistos como uma imposição de custos. Os que se veem diretamente afetados chamam a atenção para esses custos, enquanto é dada menos atenção aos benefícios que geram para toda a sociedade no longo prazo.
E muitas ineficiências que são evidentes poderiam liberar outros bilhões em ganhos. Por exemplo, o avanço da igualdade de gênero também beneficiaria diretamente os ODS e geraria benefícios econômicos.
Argumentar que o alinhamento do financiamento existente com o desenvolvimento sustentável é mais importante do que arrecadar cada vez mais dinheiro não deve ser interpretado como um apoio ao movimento contra a ajuda. Bem instrumentada, a ajuda tem seu lugar.
Os doadores devem cumprir seu compromisso e destinar 0,7% de seu PIB à AOD, e avançar com maior rapidez em seus compromissos.
Mas, se a conferência de Adis Abeba só se concentra na mobilização por mais dinheiro e não fizer algo para melhorar a forma como se gasta esse dinheiro, então teremos perdido a ocasião, e, sem dúvida, não cumpriremos os grandiosos objetivos que nos propusemos. Por esse motivo é que cada dólar conta. Envolverde/IPS
* Paul Ladd é diretor da Equipe Pós-2015 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Pedro Conceição é diretor de Política Estratégica do Pnud.