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Ciência também pode ajudar a África

Investir em pesquisas científicas pode ajudar a África a alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Foto: Busani Bafana/IPS
Investir em pesquisas científicas pode ajudar a África a alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Foto: Busani Bafana/IPS

Por Busani Bafana, da IPS – 

Bulawayo, Zimbábue, 22/1/2016 – O pequeno agricultor do Zimbábue, Augustine Sibanda, cultiva diferentes variedades de sorgo resiliente, que passam de geração em geração. Porém, pôde aumentar sua produção quando optou por sementes melhoradas, resultantes de várias pesquisas científicas. Sibanda, cuja propriedade fica no distrito de Jambezi, na semiárida província de Matabelelandia, é apaixonado pela agricultura, que pratica com inteligência buscando e aplicando novos conhecimentos.

O sorgo, um cereal resistente e nutritivo, é ideal para as condições de aridez características do sul do Zimbábue. Sibanda explicou que as variedades melhoradas, como a Marcia, lhe permitiram triplicar sua colheita, que gira em torno dos 500 quilos por hectare. Marcia é uma das 12 variedades melhoradas de sorgo desenvolvidas e distribuídas pela estação zimbabuense do Instituto Internacional de Pesquisa de Cultivos para os Trópicos Semiáridos (Icrisat), com a colaboração de cientistas e organizações públicas e privadas.

Graças à pesquisa agrária, Sibanda é um dos pequenos agricultores que impulsionam produção mediante variedades de sementes melhoradas e capazes de promover a segurança alimentar, um dos pilares dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), acordados por 193 países, em setembro de 2015. Os 17 ODS, com suas 169 metas, são o eixo da nova agenda de desenvolvimento e deverão ser cumpridos no prazo de 15 anos.

A possibilidade de cultivar alimentos suficientes de forma eficiente também motivou a ugandense Eveline Kwarikunda, no distrito de Kabale, sudoeste de Uganda. Kwarikunda, que mora na localidade de Bubaare, costumava espalhar as sementes ao acaso e esperar a temporada de colheita, mas isso acabou. Agora planta a variedade melhorada em fileira e deixando espaços, além de tirar o mato com frequência, o que triplicou sua produção.

A mudança de técnica para plantar não ocorreu de um dia para outro, reconheceu Kwarikunda, sendo mais o resultado do impulso coletivo e da consciência que adquiriu ao unir-se à Plataforma de Inovação de Bubaare (IP), uma estrutural formal, que reúne agricultores, pesquisadores, funcionários de extensão, autoridades e consumidores escolhidos ao longo da cadeia de valor de um produto básico específico ou de um sistema de produção.

“Colho cerca de 30 sacas de sorgo agorae, antes de me unir à IP, colhia só umas dez, porque não sabia muito sobre como cultivá-lo melhor. Na medida em que colocava em prática o que aprendia, consegui maior produção, isto é, mais dinheiro paraminha família”, contou a agricultora.

A ciência pode melhorar a produção agrícola e a nutrição e garantir a segurança alimentar na África. Foto: Busani Bafana/IPS
A ciência pode melhorar a produção agrícola e a nutrição e garantir a segurança alimentar na África. Foto: Busani Bafana/IPS

Preocupados pela linearidade da pesquisa em matéria agrícola na África, e pela limitada participação de todos os atores do setor, o Fórum de Pesquisa sobre Agricultura Tropical (Fara), com sede em Gana, e o Centro para a Agricultura Tropical (Ciat) desenvolveram o conceito de Pesquisa Agrícola Integrada para o Desenvolvimento (IARD4D). É um conceito que foi promovido mediante plataformas de inovação, que ajudam seus membros a encontrar soluções inovadoras para desafios pontuais.

O investimento em ciência, tecnologia e inovação ajudará a África a cumprir os ambiciosos ODS e a melhorar a vida da população. A ministra de Ciência e Tecnologia da África do Sul, Naledi Pandor, afirmou, na abertura do Fórum de Ciência, realizado em Pretória no mês de dezembro, que o continente africano não podia avançar sem investir em pesquisa científica.

Pandor lamentou que a ciência não fosse uma prioridade do desenvolvimento, pois a África precisa de sistemas nacionais de inovação sólidos para traduzir ideias criativas em soluções para os desafios em matéria de desenvolvimento. “Lamentavelmente, a ciência não recebe atenção do governo, considera-se que é menos significativa do que a escassez de água, a segurança alimentar e as doenças. Mas todos esses problemas podem ser atendidos graças à ciência”, ressaltou a ministra.

Em 2007, os membros da União Africana se comprometeram a investir 1% de seu produto interno bruto em ciência e pesquisa até 2020. A ciência, a tecnologia e a inovação são fundamentais para a África conseguir os ODS, segundo Lucille Spini, diretora de programas de ciências do Conselho Internacional de Ciências (ICSU).

Spini apontou à IPS que “precisamos concentrar nossa atenção nas ciências sociais, por exemplo, em programas para construir capacidades a fim de conseguir um enfoque integrado para alcançaros ODS”. O ICSU colabora com o Conselho Internacional de Ciências Sociais para promover um enfoque integrado, destacou.

Segundo o Banco Mundial, a África deve reduzir sua falta de capacidades e incorporar mais estudantes às áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemáticas, para impulsionar o desenvolvimento com apoio científico. O órgão destaca que o continente deve produzir os cientistas que a indústria necessita.Além disso, a competitividade a África está em perigo,por causa da fuga de cérebros, da falta de infraestrutura adequada, de más políticas científicas e da discrepância entre a pesquisa científica e as necessidades da indústria.

O pesquisador zimbabuense Mandi Rukuni, também analista de políticas de terras e professor de economia agrícola, disse à IPS que a África deve mirar no investimento em pesquisa científica para enfrentar os desafios da produtividade, comercialização e adoção de tecnologias que têm pela frente os pequenos agricultores, os quais alimentam o continente.“A ciência deve oferecer soluções para empresas de agricultores jovens e mulheres, mas a pesquisa se concentra no laboratório e no terreno, mas não nas pessoas que mais precisam das soluções científicas”, pontuou.

A maioria das tecnologias promovidas para os pequenos produtores não era adequada para eles, mas para grandes agricultores, pois destaca o uso de tratores e de uma enorme quantidade de insumo como fertilizantes.A ciência, a tecnologia e a inovação são consideradas cruciais para o desenvolvimento do continente na Agenda da África 2063, um mapa do caminho para os próximos 50 anos, adotado pelos chefes de Estado e de governo africanos.

O documento pede que se atue para“catalisar a educação e uma revolução de capacidades, além de promover ativamente a ciência, tecnologia, pesquisa e inovação, a fim de construir conhecimentos, capital humano, capacidades e habilidades para impulsionar a inovação”.

A riqueza da África em recursos naturais e minerais a torna atraente para os investimentos, mas isso supõe numerosos desafios na hora de garantir melhor educação, saúde, energia, água e moradia para sua população de mais de 1,2 bilhão de pessoas. Envolverde/IPS