Internacional

Corrida armamentista na América Central

LinaPor Lina Barrantes Castegnaro*

San José, Costa Rica, 17/6/2016 – O recente anúncio da compra de 50 tanques russos, no valor de US$ 80 milhões pelo governo da Nicarágua, chamou a atenção da imprensa latino-americana e preocupou a comunidade internacional.

Este fato, que não é isolado, é parte de uma corrida armamentista na qual a América Latina está submersa há vários anos.

O aumento do gasto militar contrasta com a realidade de uma região pobre como a América Central, onde o gasto militar é tão impressionante como os indicadores de miséria.

Em suas conclusões, o Instituto Internacional de Estudos para a Paz de Estocolmo (Sipri) indica que, em 2015, Belize gastou 1,1% de seu orçamento anual em equipamento militar (US$ 19,6 milhões), El Salvador 0,9% (US$ 223 milhões), Guatemala 0,4% (US$ 274 milhões), Honduras 1,6% (US$ 324 milhões) e Nicarágua 0,6% (US$ 71,6 milhões).

Países como Costa Rica e Panamá, por não terem exércitos, não declaram gastos militares.

Frente a esse gasto em armas, o fantasma da fome e do subdesenvolvimento ronda a região. O índice de desenvolvimento humano de 2015 mostra que a Guatemala ocupa o posto 128, Honduras o 113, El Salvador 116, Nicarágua 125 e Belize 101. A Costa Rica está em 69º lugar e o Panamá no 60º. Portanto, a pior qualificação da região entre 188 nações recai em Honduras e Guatemala, os dois países com menor desenvolvimento humano da América Central.

Isto significa que quanto mais pobres os países, mais gastam em brinquedos de extermínio. A pergunta que surge dessa relação é: contra quem farão a guerra com esses brinquedos?

Uma possibilidade é que o rearmamento seja para estar capacitado a enfrentar uma guerra ou uma invasão. Porém, não está clara qual guerra ou invasão.

Outra hipótese que se pode ensaiar é que sejam usados contra seus próprios cidadãos repatriados em deportações dos Estados Unidos, que regressam formados em cursos intensivos de violência e criminalidade, obtidos nos subúrbios latinos.

O Informe sobre Desenvolvimento Humanode 1994, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud),apresenta, formalmente, algo que há anos se vinha debatendo na arena internacional: se o mundo economizasse em gasto militar e investisse esse dinheiro em desenvolvimento, poderia erradicara pobreza em apenas alguns anos. Desse ponto de vista, a pobreza não tem a ver somente com a guerra, mas também com o gasto militar.

No período 1987-1994, a redução do gasto militar mundial foi de US$ 935 bilhões. Lamentavelmente, esse dinheiro não foi utilizado para financiar a agenda social ou de desenvolvimento; na realidade, não se pode precisar como esses recursos foram usados.

O gasto em parafernália militar é lamentável, e é ainda mais quando os recursos de um país são tão escassos como na América Central.

Por isso devemos insistir no tema dos dividendos da paz, conceito apresentado ao mundo pelo então presidente da Costa Rica, Oscar Arias, em 2006, com o nome de Consenso da Costa Rica. Essa ideia apresenta um compromisso, de parte dos órgãos financeiros internacionais, para apoiar de maneira mais generosa os países que investem seus orçamentos em desenvolvimento e não em morte.

Assim como o Tratado sobre a Transferência de Armas propôs associar direitos humanos e ética frente ao gasto militar, o Consenso da Costa Rica pretende que sejam criados mecanismos para perdoar dívidas e apoiar, financeiramente, os países em vias de desenvolvimento que investirem cada vez mais em saúde, educação e moradia para seus povos; e cada vez menos em armas e soldados. Que a comunidade internacional premie não só quem gasta com ordem, como até agora, mas quem gasta com ética.

Por isso, recentemente, durante a constituição da Aliança de Prêmios Nobel Contra a Fome, na FAO, em Roma, o ex-presidente Arias propôs como alternativa para combater a fome no mundo a oportunidade de retomar sua proposta Consenso da Costa Rica e apoiar os que usam seus orçamentos na vida de seus cidadãos e não em sua morte.

Esperamos que o dia disso ocorrer esteja mais perto do que longe. Envolverde/IPS

* Lina Barrantes Castegnaroé diretora executiva da Arias Foundation for Peace and Human Progress.