Internacional

Cresce a resistência popular palestina à ocupação israelense

Palestino desarmado enfrenta soldados israelenses durante um protesto perto do acampamento de refugiados de Jelazon, ao norte de Ramalá, na Cisjordânia. Foto: Mel Frykberg/IPS
Palestino desarmado enfrenta soldados israelenses durante um protesto perto do acampamento de refugiados de Jelazon, ao norte de Ramalá, na Cisjordânia. Foto: Mel Frykberg/IPS

 

Ramalá, Cisjordânia, 20/3/2015 – Tão logo o caminhão que transportava produtos lácteos israelenses entrou no centro da cidade de Ramalá foi cercado por ativistas palestinos que retiraram e destruíram a mercadoria, principalmente leite e iogurte, no valor de aproximadamente US$ 20 mil. O motorista, um palestino do acampamento de refugiados de Qalandia, e um empregado israelense desmaiaram ao se verem impotentes diante da situação.

A carga, que comerciantes palestinos já haviam pago, foi destroçada e pisoteada antes de os ativistas a espalharem na rua diante de policiais palestinos estacionados próximo do local. Os ativistas do movimento Fatah, vinculado à Autoridade Nacional Palestina (ANP), promovem um boicote aos produtos israelenses em toda a Cisjordânia.

A medida foi decidida depois que Israel reteve milhões de dólares de impostos palestinos em represália pelo fato de a ANP ter dado passos no sentido de levar o Estado de Israel ao Tribunal Penal Internacional de Haia, por supostos crimes de guerra e abusos cometidos por suas forças em Gaza e na Cisjordânia. “Entramos na segunda fase da campanha, que é o confisco e a destruição desses produtos”, afirmou Abdulá Kamal, líder do boicote.

Há várias semanas, a primeira etapa consistiu em visitas que Kamal e seus colaboradores fizeram a diferentes lojas em Ramalá, para determinar aos comerciantes que se desfizessem de toda mercadoria de origem israelense, e também advertir que não comprassem mais. Há ações semelhantes acontecendo em outras cidades da ocupada Cisjordânia.

Embora os territórios palestinos não sejam uma parte importante do mercado interno de Israel, a medida integra uma série de ações de cunho popular de desafio à ocupação israelense. “O boicote local dos palestinos é pacífico e uma forma de exercer pressão sobre Israel, embora não seja muito forte”, afirmou à IPS o professor Samir Awad, cientista político da Universidade de Bir Zeit, perto de Ramalá. “O mínimo que os palestinos podem fazer é deixar de financiar a ocupação”, acrescentou.

Um fato mais grave, do ponto de vista israelense, foi o recente voto do comitê executivo da Organização para a Libertação da Palestina a favor da supressão da coordenação que vinha realizando com os serviços de inteligência e de segurança de Israel. Os palestinos acusam a ANP de ser uma subcontratada da ocupação, e os israelenses dependem da coordenação em matéria de segurança para prevenir outro levante palestino e controlar a resistência armada.

A decisão final sobre a suspensão da coordenação caberá ao presidente da ANP, Mahmud Abbas. “A situação no terreno está ficando séria e é possível que Abbas tome a decisão antes do final do mês”, opinou à IPS o integrante do Fatah, Murad Shitawi. “Não aceitaremos a continuidade da ocupação com suas implicações econômicas e de segurança”, acrescentou o ativista, que coordenou os protestos na aldeia de Kafr Qadumy e foi libertado recentemente de uma prisão israelense.

Todas as sextas-feiras, dezenas de povoados da Cisjordânia e de Gaza participam dos protestos contra a expropriação de terras e a ocupação de Israel, apesar das fortes consequências que representa para os palestinos quanto ao número de mortos e feridos. Shitawi acrescentou que há quatro ou cinco anos apenas alguns povoados participavam dos protestos semanais. “Agora, há muitos e os protestos não se limitam às sextas-feiras”, ressaltou.

Outro ato de desafio é a construção repetida de barracas de protesto e de aldeias na zona C da Cisjordânia, que constitui 60% do território, contra o traslado forçado da população beduína e de outros palestinos que vivem ali há séculos. Israel designou a zona C como exclusiva para os colonos israelenses, o que é ilegal segundo o direito internacional.

Um desses acampamentos de protesto perto da aldeia de Abu Dis, na periferia de Jerusalém, foi reconstruído dez vezes depois de ser demolido pelas forças de segurança israelenses, que confiscaram equipamentos e prenderam e agrediram os ativistas que estavam acampados ali. Além disso, os ativistas de base palestinos também colaboram com seus aliados internacionais e com grupos pacifistas israelenses para reforçar a pressão sobre o Estado judeu, enquanto continua ganhando força a campanha denominada Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS).

Um número cada vez maior de empresas, artistas, grupos religiosos e universidades se nega a visitar Israel e a negociar com empresas desse país que atuam na Cisjordânia, ou boicotam as instituições israelenses que operam no exterior. A Semana do Apartheid Israelense, “uma série internacional de eventos que buscam sensibilizar sobre as políticas de apartheid de Israel contra os palestinos e conseguir apoio à crescente campanha BDS”, aconteceu em várias capitais do mundo este mês.

Pacifistas e ativistas israelenses estão entre os maiores críticos das políticas de seu governo em relação aos palestinos, e várias de suas organizações participam dos protestos semanais. Grupos como Ta’ayush, Quebrando o Silêncio, Ir Amim e Rabinos pelos Direitos Humanos procuram informar as pessoas sobre a realidade da vida sob a ocupação. Alguns também colaboram com os agricultores palestinos que tentam cultivar suas terras sob a contínua hostilidade dos colonos israelenses.

“As ações contra Israel das organizações de base não acabarão logo e sua força continuará crescendo no âmbito internacional”, assegurou Awad. “A Autoridade Palestina continuará com o plano de levar Israel ao Tribunal Penal Internacional e, se Israel continuar retendo o dinheiro dos impostos palestinos indefinidamente, a ANP poderá colapsar e o resultado seria um caos”, alertou. Envolverde/IPS