por Baher Kamal, da IPS –
Istambul, Turquia 25/5/2016 – A Cúpula Humanitária Mundial, realizada nos dias 23 e 24, nesta cidade turca, não conseguiu alcançar seu objetivo econômico. Com exceção da chanceler da Alemanha, Angela Merkel, não houve participação de nenhum dos países mais ricos ou integrantes do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). No encerramento, tanto o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, como o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, se mostraram “decepcionados” com a ausência dos governantes dos países mais poderosos do mundo.
Ambos reiteraram seu chamado à solidariedade para ajudar as pessoas mais vulneráveis, mas nenhum pôde dar sinal algum de esperança; 130 milhões de pessoas são vítimas de conflitos e desastres naturais, que estão aumentando. A ausência dos governantes do G-7 e dos países do Conselho de Segurança “não é uma desculpa para a inoperância”, afirmou Ban. Os recursos necessários para salvar a vida de dezenas de milhões de seres humanos representam apenas 1% do gasto militar mundial, acrescentou.
O secretário-geral não expressou nenhum otimismo quanto a um rápido fim das guerras na Síria, no Iêmen e Sudão do Sul, entre outros conflitos, e recordou que todos os anos a ONU organiza uma conferência de doadores, e que “os países se cansaram disso”. Também ressaltou que os atuais 80% dos recursos humanitários das Nações Unidas são gastos em crises provocadas pelos seres humanos.
Por sua vez, Erdogan reiterou ameaças veladas à União Europeia (UE), ao dizer que, se o bloco não cumprir os acordos com Ancara, a “lei de repatriados”, isto é, refugiados deportados dos países do bloco europeu para a Turquia, pode não ser aprovada no parlamento turco. A União Europeia prometeu à Turquia US$ 3 bilhões em 2017, que se acrescentam a uma quantia igual prometida em 2015, no acordo que selou em março com Ancara, para que este país receba os refugiados que chegarem à Europa.
Por sua vez, a UE autorizará a entrada de cidadãos turcos nos países membros do bloco sem necessidade de visto, mas a medida não será implantada em breve, porque agora foi acrescentada uma longa série de requisitos que a Turquia deverá cumprir antes de implantar a exoneração.
Autoridades de 173 países, entre eles 55 chefes de Estado e de governo, se comprometeram a dar mais de si para ajudar os 130 milhões de pessoas que sofrem os conflitos e os desastres naturais. Mas as organizações humanitárias se perguntam com ceticismo se esses anúncios levaram a compromissos efetivos e se os fundos esperados serão usados de forma correta.
Jan Egeland, secretário-geral do Conselho Norueguês para Refugiados (NCR), uma grande organização com mais de cinco mil trabalhadores humanitários em 25 países, foi uma das vozes mais contundentes a respeito. A ajuda humanitária não consegue proteger a população civil da violência, e a assistência deve ser mais eficiente e mais rentável para não falhar com quem mais precisa dela, pontuou.
Segundo Egeland, a assistência humanitária não chega a milhares de vítimas em situação de enorme vulnerabilidade. “Em Faluja, no Iraque, atualmente há mais de 50 mil civis assediados e à mercê do Estado Islâmico” (EI), ressaltou. “Ninguém os ajuda, ninguém chega até eles. O governo iraquiano não os ajuda e as organizações humanitárias não têm acesso”, destacou.
Há milhares e milhares de pessoas como essas em situações extremas, às quais ninguém tem acesso. No Iêmen, há 20 milhões de civis com necessidades graves e, além disso, as coalizões apoiadas por países ocidentais atacam populações civis, apontou Engeland, acrescentando ter esperança de que os governantes se perguntem se pelo menos podem deixar de distribuir armas, de dar dinheiro aos grupos armados que sistematicamente violam as leis humanitárias e não bombardear hospitais e escolas, nem abusar de mulheres e crianças.
Os combatentes, sejam forças regulares, rebeldes, insurgentes ou opositores, continuam conseguindo armas que utilizam para explodir hospitais e matar civis, advertiu Engeland. “Coloquemos na lista negra esse grupo armado, esse exército e esse governo”, ressaltou. Para ele, “faltam governos que também digam que respeitarão o direito humanitário e a Convenção da ONU sobre Refugiados, que manterão as fronteiras abertas e concederão direito ao sacrossanto asilo”.
O secretário-geral do NCR destacou que “todas as fronteiras deveriam estar abertas na Europa, no Golfo e nos Estados Unidos”. E perguntou aos presentes: “como europeus, quando iniciamos a convenção sobre os refugiados, sentimos realmente que o asilo é importante quando dele necessitamos. Por que agora não acreditamos que continua sendo igualmente importante quando somos os destinatários dos pedidos de asilo?”.
Entre 2011 e 2013, Egeland foi diretor para a Europa da organização de direitos humanos Human Rights Watch, antes de se integrar ao NCR, onde assumiu como secretário-geral, em agosto de 2013. Em 2006, a revista Time o colocou entre as cem “pessoas mais influentes do mundo”.
Francesco Rocca, vice-presidente da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e da Meia-Lua Vermelha, explicou que “são necessários muito mais recursos, mas não resolverão o problema”. Representando 190 sociedades da Cruz Vermelha e da Meia-Lua Vermelha, pediu maior apoio para fortalecer os atores locais e nacionais, que são a chave da solução. “Fortalecer a capacidade local e nacional terá um impacto. E os escassos recursos devem ser canalizados por meio dos principais atores locais ou investidos em suas capacidades de longo prazo”, enfatizou.
O presidente do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, Peter Maurer, alertou que, “quanto menos ajudamos nas zonas de conflito, mais pessoas se deslocarão, e colocá-las em acampamentos não é uma solução”. Envolverde/IPS