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Déficit hídrico pode ser de 40% em 2030

 Pastores da Etiópia precisam se mover constantemente em busca de pastagens e poços de água para seus animais. Foto: William Lloyd-George/IPS

Pastores da Etiópia precisam se mover constantemente em busca de pastagens e poços de água para seus animais. Foto: William Lloyd-George/IPS

Vários fatores agravam a crise atual, como a mudança climática – que desencadeia secas –, os conflitos militares, e a falta de saneamento básico.

Por Thalif Deen, da IPS – 

Nações Unidas, 4/5/2016 – Dez presidentes e primeiros-ministros vão colaborar para resolver a crescente crise mundial de água, enquanto a Organização das Nações Unidas (ONU) alerta que o planeta poderá ter um déficit de 40% na disponibilidade hídrica até 2030. Apesar dos avanços, ao menos 663 milhões de pessoas ainda não têm acesso a água potável. A ONU prevê que no futuro aproximadamente 1,8 bilhão de pessoas, de uma população mundial superior a sete bilhões, viverão em países ou regiões com escassez hídrica.

Vários fatores agravam a crise atual, como a mudança climática – que desencadeia secas – e os conflitos militares, nos quais a água é utilizada como arma de guerra em várias regiões, incluídos Iraque, Síria e Iêmen. O Grupo de Alto Nível sobre Água, anunciado conjuntamente pela ONU e pelo Banco Mundial no final de abril, mobilizará recursos financeiros e reforçará os investimentos para aumentar o fornecimento de água.

O organismo será copresidido pelos presidentes Ameenah Gurib, de Mauricio, e Enrique Peña Nieto, do México.A lista de mandatários nesse órgão se completa com os primeiros-ministros Malcolm Turnbull, da Austrália, Sheikh Hasina, de Bangladesh, Mark Rutte, da Holanda, e Abdullah Ensour, da Jordânia, junto com os presidentes János Áder, da Hungria, Macky Sall, do Senegal, Jacob Zuma, da África do Sul, e Emomali Rahmon, do Tajiquistão.

O secretário-geral adjunto da ONU, Jan Eliasson, da Suécia, disse em uma mesa-redonda nas Nações Unidas que a água se encontra no elo entre o desenvolvimento sustentável e a ação climática.“Muita água e nem uma gota para beber”, comentou um dos colegas de Eliasson que visitaram o Paquistão depois de uma grande inundação, em referência aos dois extremos de padrões climáticos, secas por um lado e inundações de outro.

Quando os líderes mundiais realizaram uma reunião de cúpula, em setembro do ano passado, para adotar a Agenda de Desenvolvimento Pós-2015 da ONU, aprovaram 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que incluem a eliminação da pobreza extrema e da fome e o fornecimento de água potável a cada habitante do planeta até 2030. Esse objetivo será cumprido no prazo estipulado de 15 anos?

“Na medida em que entramos na era dos ODS, não há dúvida de que o objetivo de conseguir água administrada de forma segura para cada pessoa do planeta nos próximos 15 anos será todo um desafio. O que aprendemos com os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) é que a água não pode ser abordada com êxito de forma isolada”, ressaltou Sanjay Wijesekera, diretor de Água, Saneamento e Higiene do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

A água potável está em risco todos os dias, devido à falta de saneamento, algo muito comum em muitos países, especialmente na Ásia meridional e África subsaariana, indicou Wijesekera. Atualmente, estima-se que quase dois bilhões de pessoas que bebem água poderia estar contaminada com matéria fecal. O Unicef e outras organizações deverão redobrar os esforços para melhorar o acesso das pessoas a banheiros, e sobretudo para acabar com a defecação ao ar livre.

Com relação a “água, saneamento e higiene, também se deve considerar a mudança climática. As secas, inundações e as condições climáticas extremas repercutem na disponibilidade e segurança da água”, garantiu Wijesekera. Cerca de 160 milhões de menores de cinco anos vivem em zonas com alto risco de seca, enquanto aproximadamente 500 milhões vivem em áreas de inundação, acrescentou.

Para resolver a crise da água, Darcey O’Callaghan, da organização Food and Water Watch, observou que “em primeiro lugar devemos proporcionar suficiente água limpa e segura para todas as pessoas, porque a água é um direito humano. A viabilidade financeira é um elemento crucial para atender essa necessidade”. Em segundo lugar, “devemos proteger a sustentabilidade da água e não extrair das bacias além de sua recarga natural. Se deixarmos que as fontes hídricas sequem, perderemos a capacidade e proteger os direitos humanos das pessoas. Assim, claramente, devemos tratar esses dois temas conjuntamente”, apontou.

Para a água ter uma tarifa acessível, deve ser administrada por uma entidade pública e não por uma que tenha fins lucrativos, recomendou a especialista. Mau serviço, tarifas elevadas e qualidade da água degradada foram algumas das consequências quando se permitiu que empresas privadas controlassem o acesso à água, algo que se conhece como “privatização da água”.

Companhias como Veolia e Suez, e suas filiais em todo o mundo, procuram lucrar com a gestão dos sistemas locais de água, explicou O’Callaghan. E instituições financeiras como o Banco Mundial e os bancos regionais de desenvolvimento costumam impor condições aos empréstimos concedidos aos países em desenvolvimento que exigem a privatização desses sistemas. “Esta é uma receita para o desastre. O lucro não deve ser a prioridade quando se trata de fornecer serviços de água e saneamento às pessoas”, destacou.

Não há dúvidas de que água e saneamento são direitos humanos, observou a especialista ao ser perguntada se as pessoas devem pagar por esses serviços. O que o público paga é a manutenção da infraestrutura hídrica e da água corrente através das redes de distribuição às moradias, escolas, aos negócios e às instituições governamentais. O’Callaghan afirmou que “a ONU fixou pautas para a acessibilidade à água – em 3% da renda familiar – e estas protegem o direito humano à água. Se a tarifa do serviço de água supera a capacidade de pagamento de uma família, então se trata de uma violação dos direitos humanos”

Uma estratégia que se mostrou promissora são as associações entre órgãos públicos (APP). Em contraste com a privatização, que coloca as necessidades públicas nas mãos das corporações com fins lucrativos, as APPs reúnem funcionários públicos, trabalhadores e comunidades para oferecer um serviço melhor e mais eficiente. As APPs permitem que duas ou mais empresas públicas de água ou organizações não governamentais somem suas forças e aproveitem suas capacidades compartilhadas, unindo seus recursos, poder de compra e conhecimentos técnicos, enfatizou O’Callaghan. Envolverde/IPS