Por Edgardo Ayala, da IPS –
Izalco, El Salvador, 5/1/2016 – DorisZabala se agacha suando em meio a uma plantação de rabanete, enquanto arranca os tubérculos do solo, atividade que a mantém ativa e afastada do ócio e o desalento persistente em muitas prisões de El Salvador.“A colheita está bonita, os rabanetes bem vermelhos e grandes”, mostrou à IPS essa detenta, que é uma das 210 do Centro Penitenciário para Mulheres Granja Izalco, no município de mesmo nome, no departamento de Sonsonate.
A granja-prisão é exclusiva para mulheres em fase de confiança, quando podem visitar suas famílias nos finais de semana. Das 210 internas, 80 se dedicam a atividades agrícolas, o restante ocupa o tempo em outras áreas, como cozinha ou cuidados dos filhos das detentas.Nos 26 hectares de terreno as, presas utilizam técnicas agroecológicas para produzir, além de rabanetes, gergelim, tomate, milho e papaia, entre outros.
Também começou a funcionar uma pequena granja de frangos e se espera que logo esteja funcionando uma de tilápias.“Na minha casa tem terreno para plantar, assim que sair daqui, pretendo continuar produzindo, porque gosto”, contou Cecilia Méndez, de 32 anos, dos quais seis passou reclusa. Ainda tem oito meses para obter a liberdade, disse à IPS.
A granja foi inaugurada em janeiro de 2011, como parte dos esforços do governo para criar alternativas ocupacionais nas superpovoadas cadeias salvadorenhas, e desse modo superar, pouco a pouco, o ócio, a lotação e o crime que reina há décadas. Com capacidade para 8.100 reclusos, as 21 prisões do país quadruplicaram sua população e chegaram a abrigar 32.300 presos, segundo dados oficiais.
A lotação e a precariedade das prisões salvadorenhas “deixam a descoberto a enorme crise humanitária que o sistema penitenciário enfrenta”, segundo indica o informe O Sistema Penitenciário Salvadorenho e Suas Prisões, publicado em novembro do ano passado pelo Instituto Universitário de Opinião Pública (Iudop), da Universidade Centro-Americana José Simeón Cañas (UCA), com patrocínio da Fundação Heinrich BöllStiftung.
A granja de Izalco é parte do programa governamental Yo Cambio (Eu Mudo), oficializado em dezembro de 2014 para tentar mudar, junto com outras medidas, essa realidade. Trata-se de dar ocupações que ajudem os presos a superar a inatividade e capacitá-los para que, ao serem libertados, se insiram na sociedade com melhores destrezas. Também há projetos específicos para ampliar e construir novas prisões e diminuir a lotação.
“Todos pensam que fazemos nada, que ficamos pensando coisas que não devemos, mas na realidade passamos ocupadas”, explicouMéndez, caminhando entre uma plantação de cebolinhas (Alliumschoenoprasum).O uso de técnicas agrícolas amigáveis com o ambiente, como a fertilização com adubo orgânico, é fundamental no processo. “Trata-se de ensinar novas práticas às internaas”, explicou à IPS o administrador da granja, Óscar Menéndez.
“Quem gosta de trabalhar, aqui se mantém ocupado”, pontuouMaría Cristina Vásquez, de 53 anos, encarregada do cultivo de papaia e do pequeno plantel de cem frangos que chegaram há pouco, dos quais cuida com dedicação. A produção da granja é para consumo interno e o restante é distribuído entre as outras prisões do país.Em dezembro do ano passado o governo assinou um contrato no valor de US$ 4,2 milhões com uma construtora para readequar a infraestrutura em Izalco, e assim oferecer melhores condições.
Outra granja similar, de 50 maçãs (uma maçã equivale a 0,698896 hectare) de extensão, fica nas imediações da cidade de Santa Ana, no departamento de mesmo nome, no ocidente do país.
Mas o programa não se limita a granjas e inclui outras atividades de trabalho, em outras prisões, como carpintaria e sapataria. No Centro Penal Apanteos, 72 quilômetros a oeste de São Salvador, também no departamento de Santa Ana, os presos desenvolvem um novo laboratório de produção de alevinos de tilápia, e já produzem 60 mil larvas por mês. Além disso, montaram uma fábrica de água sanitária e desinfetantes a partir dos conhecimentos deixados por um antigo detento.
“Ele conhecia o ofício, e aqui o lema é quem sabe ensina quem não sabe”, contou Rolando Artiaga, de 24 anos, encarregado da pequena fábrica. A produção chega a 200 galões (mais de 757 litros) de desinfetante e 150 galões de água sanitária por mês, que são comercializados com os detentos,dentro da prisão.
O programa se completa com outras atividades, como esporte, educação, saúde, religião, arte e cultura. Mas nem todos os presos gozam dessas vantagens. Dos 32.300 detentos do sistema carcerário, apenas um terço conta com os benefícios do projeto, em 12 prisões de nível nacional, informou à IPS Orlando Elías Molina, subdiretor da Direção Geral de Centros Penais (DGCP).
Na principal prisão do país, La Esperanza, ao norte de São Salvador, as autoridades tentaram iniciar, em meados do ano passado, atividades do programa, mas os grupos criminosos que controlam o lugar frustraram o esforço, ressaltou Molina. “Se deixarmos as estruturas criminosas manejarem isso, de nada servirá”, ressaltou.
Segundo Molina, este ano haverá intervenção inclusive nas prisões destinadas a integrantes de gangues, como a de Chalatenango, no norte do país, que abriga membros da Mara Salvatrucha, uma das duas estruturas mais violentas, junto com a Barrio 18. Envolverde/IPS