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Energias no norte e sul fortalecem transmissão elétrica no Chile

A interconexão dos dois maiores sistemas de eletricidade do Chile unirá o país neste vital setor e barateará o fornecimento em um dos países com a energia mais cara. Foto: Ministério de Energia
A interconexão dos dois maiores sistemas de eletricidade do Chile unirá o país neste vital setor e barateará o fornecimento em um dos países com a energia mais cara. Foto: Ministério de Energia

Por Marianela Jarroud, da IPS – 

O lago Neltume, na localidade de mesmo nome da região de Los Ríos, sul do Chile. Sobre ele o grupo ítalo-espanhol Endesa-Enel pretende construir uma grande represa, à qual se opõem seus moradores, em particular os indígenas, que o reclamam como território sagrado. Foto: Marianela Jarroud/IPS

Santiago, Chile, 11/5/2015 – O Chile poderá contar com um mercado elétrico mais eficiente, com segurança de fornecimento, mais sustentável e, sobretudo, menos caro, quando se concretizar a interligação dos dois sistemas elétricos mais importantes do país, um projeto que estará operacional a partir de 2017 e que se estenderá por mais de três mil quilômetros.

“Não basta aumentar nossa capacidade de geração elétrica se ao mesmo tempo não fortalecermos nossa transmissão. Se queremos ser um país desenvolvido temos que apostar na diversidade de geração e pela segurança na transmissão elétrica”, afirmou à IPS o ministro de Energia, Máximo Pacheco. Este projeto “abre enormes oportunidades de progresso e segurança para as chilenas e os chilenos, com uma energia mais limpa e mais barata”, acrescentou.

Alongado e estreito território chileno conta com capacidade instalada de aproximadamente 17 megawatts (MW) destinados a abastecer seus 17,6 milhões de habitantes e sua atividade produtiva. Nesse país a geração e distribuição elétrica estão nas mãos de empresas privadas, a maioria estrangeiras, sobre regulamentação da Comissão Nacional de Energia, que também coordena a interconexão.

Da capacidade instalada, 74% correspondem ao Sistema Interligado Central (SIC), 25% ao Sistema Interligado Norte Grande (SING) e menos de 1% às redes medianas das regiões austrais de Aysén e Magalhães. O SING se estende desde a região de Arica, no extremo norte e limítrofe com Peru e Bolívia, até Antofagasta, enquanto o SIC segue desde o município de Taltal ao norte até a ilha grande de Chiloé, no sul. No total somarão mais de três mil quilômetros lineares do território deste país cuja fronteira territorial supera os 6.300 quilômetros.

A obra de interligação, já em construção e com investimento previsto de US$ 1 bilhão, é desenvolvida pelo grupo francês GDF Suez através de uma rede que se estenderá por 580 quilômetros. Essa rede funcionará como uma linha de injeção de energia desde o polo de geração de Mejillones, em Antofagasta e parte do SING, para a subestação de Cadones, em Copiapó, na região de Atacama e do SIC ao norte.

O Chile importa 97% dos hidrocarbonos que utiliza e sua matriz energética é composta por 63% de geração térmica, 34% de hidroeletricidade e 3% por energias renováveis não convencionais (ERNC).

O alto déficit de fontes energéticas situa o preço da produção de 1 MW/hora para a indústria entre os mais caros da América Latina, com um custo que supera os US$ 150, segundo o índice global de rendimento da arquitetura energética elaborado em 2014 pelo Fórum Econômico Mundial. Este custo é o 13º mais caro do mundo e na região só é superado por República Dominicana com US$ 210 por MW/hora, e por Brasil e El Salvador, onde o MW/hora vale US$ 160.

“O Chile está marcado pelo custo de eletricidade mais alto da América Latina e onde as contas de luz subiram 30% nos últimos cinco anos. Isto afeta fortemente nossas famílias e prejudica a competitividade de nossas empresas”, reconheceu Pacheco. Acrescentou que o projeto de interligação, adiado por décadas sob alegação de motivos técnicos e tecnocráticos, “é um marco histórico”, porque junto coma entrega de eficiência, sustentabilidade e segurança no fornecimento, garante menores custos e um importante efeito econômico para o país.

Segundo dados da Comissão Nacional de Energia, a interligação trará benefícios ao país da ordem de US$ 1,1 bilhão, pela redução dos custos do sistema elétrico e por uma projetação de baixa dos preços associados a maior competição e diminuição de riscos no mercado. “Isto tem enorme valor considerando que equivale a construir cerca de 35 mil moradias sociais. Essa é a magnitude do benefício econômico deste projeto para o país”, destacou o ministro.

De concreto, as famílias do Norte Grande notarão uma queda de US$ 13 no preço do MW/hora, enquanto na zona Centro Sul será de US$ 3. No caso das indústrias, estima-se uma queda de US$ 17 por MW/hora no Norte Grande e de US$ 9 na zona Centro Sul do país. Adicionalmente, “aumentarão os investimentos no setor energético, o que, definitivamente, será uma boa notícia para nosso país”, afirmou Pacheco.

Os benefícios econômicos não são o único atrativo deste projeto. Para o ministro, “o objetivo da ligação entre os Sistemas Interligados mais importantes do país esta no fato de, justamente, a energia limpa e abundante do norte de nosso país poder chegar ao centro sul do território”. Isto faz com que o otimismo não se limite somente ao governo e se estenda a setores ambientalistas.

Manuel Baquedano, diretor do não governamental Instituto de Ecologia Política, afirmou à IPS que se trata de um dos projetos “mais importantes para o país”, porque supõe maior flexibilidade no manejo da energia e, por conseguinte, uma diminuição de seus custos.

Esse especialista lembra que “o norte tem excedente de capacidade energética no dia”, devido à sua enorme potência de radiação solar emanada do deserto de Atacama, o mais árido do mundo, e o centro sul do país, conectado pelo SIC, “tem falta de capacidade energética de noite”, por sua grande potência hidrelétrica.

Assim, prosseguiu Baquedano, “cada um dos sistemas pode ajudar o outro gerando maior estabilidade e potencializado a utilização das ERNC, que requerem energia de apoio. É um projeto-chave, porque o problema do Chile hoje em dia não é a geração, mas a transmissão da eletricidade”, acrescentou.

Em seu segundo governo, iniciado em março de 2014, a presidente Michelle Bachelet se comprometeu a aumentar a participação das ERNC para que até 2025 procedem de fontes limpas e próprias 20% das injeções de eletricidade.

“Várias das medidas apresentadas na agenda visam o seu cumprimento, como a expansão dos sistemas de transmissão, melhorar a competição no segmento de geração e dar flexibilidade à operação dos sistemas elétricos”, disse o ministro. Acrescentou que o desenvolvimento futuro da transmissão “terá um papel central em facilitar o cumprimento desta meta de baixos custos, aproveitando um uso coordenado de corredores de transmissão”.

Segundo Baquedano, “o que vemos é uma proliferação de projetos eólicos e solares no norte, acima dos hidrelétricos no sul. E a sociedade não tolera os megaprojetos. Neste cenário, não tenho nenhum medo da interligação. Pelo contrário, considero que é um elemento superimportante para o desenvolvimento das ERNC”. Envolverde/IPS