Por Katherine Mackenzie, da IPS –
Roma, Itália, 12/1/2016 – O governo da Síria permitirá a entrega de ajuda humanitária à cidade de Madaya, controlada por forças rebeldes e assediada pelo governo há seis meses, depois que um informe jornalístico revelou que vários de seus habitantes morreram de inanição. Esperava-se que a ajuda à cidade, que fica a 40 quilômetros de Damasco, chegasse ontem com comida suficiente para cerca de 40 mil pessoas ao longo de um mês. Há previsão de que no final dessa semana cheguem medicamentos.
A difícil situação da população de Madaya ficou conhecida recentemente, quando a ITV,uma rede de televisão independente da Grã-Bretanha, divulgou um vídeo com imagens de crianças esqueléticas. Muitos dos habitantes nada tinham para comer além de terra e mato, e o desespero levou alguns a comerem cães e gatos, segundo a ITV.
“O povo da Síria está de joelhos. A economia desmoronou, a infraestrutura essencial, como redes de água e eletricidade, está por um fio e, como se isso não bastasse, avizinha-se um inverno muito forte”, afirmou o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICR), acrescentando que “há 12 milhões de pessoas na Síria que precisam de ajuda com extrema urgência”.
A Organização das Nações Unidas (ONU) e o CICR conseguiram acesso à região no dia 7. O CICR informou que sua prioridade, em conjunto com a Meia-Lua Vermelha Síria, é levar assistência a 500 mil pessoas que vivem em zonas assediadas ou de difícil acesso, como Madaya, Zabadani, Foua e Kefraya.
Quase 42 mil pessoas que permanecem em Madaya correm o risco de sofrer mais fome e inanição. A ONU recebeu informes confiáveis de pessoas que morrem de fome ou são mortas ao tentar sair da região, afirmou o fórum mundial também no dia 7. “No dia 5, um homem de 53 anos teria morrido de inanição enquanto sua família de cinco pessoas continua sofrendo desnutrição grave”, acrescentou.
As Nações Unidas informaram que receberam do governo de Bashar al Assad permissão de acesso a Kefraya e Foua, no norte do país, assediadas pelas forças rebeldes, enquanto Madaya e Zabadani estão sitiadas pelas forças governamentais. Calcula-se que 4,5 milhões de pessoas vivem em zonas de difícil acesso, incluídas 400 mil em 15 localidades assediadas que não têm acesso à ajuda humanitária que necessitam urgentemente.
A organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) denunciou que o cerco a Madaya é “um sítio de estrangulamento total”, e acrescentou que “cerca de 20 mil residentes sofrem a privação, com risco para suas vidas, dos elementos básicos para a sobrevivência, e 23 pacientes no centro de saúde apoiado pela MSF morreram de fome desde 1º de setembro”.
“A MSF recebe com satisfação as informações de que o governo sírio permitirá o fornecimento de alimentos na região, mas insiste que a entrega imediata de remédios que possam salvar vidas também deve ser uma prioridade”, e pede que “seja permitida a evacuação médica de urgência dos pacientes para lugares seguros de tratamento”.Das 23 pessoas que morreram de inanição, seis eram menores de um ano de idade, cinco tinham mais de 60 anos e os 12 restantes estavam na faixa etária entre os 5 e 60 anos, detalhou a MSF.
A cidade recebeu ajuda pela última vez em outubro, quando vários caminhões entregaram suprimentos médicos. Algumas pessoas foram evacuadas em dezembro, mas, apesar dos reiterados pedidos, não era permitido o acesso humanitário desde então.Segundo o comunicado da ONU, “o conflito continua criando obstáculo à resposta humanitária e a liberdade de movimento está restrita pela presença de atores armados e minas terrestres”.
O novo titular do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), Filippo Grandi, no dia 7afirmou que, com o número sem antecedentes de refugiados e pessoas deslocadas em todo o mundo, é necessário maior esforço diplomático para encontrar soluções para os conflitos e os abusos que expulsam as pessoas de suas casas.
“O Acnur navega por águas extraordinariamente difíceis”, afirmou o italiano Grandi em sua primeira entrevista coletiva desde que assumiu o cargo, no dia 1º deste mês. “Devemos pensar, antes de tudo, nos próprios deslocados pela força, mas também devemos pensar nos Estados que buscam desesperadamente soluções para as situações que implicam refugiados. Mesmo nas circunstâncias mais desesperadoras, temos que pensar na solução dos deslocamentos”, afirmou.
Grandi insistiu em que os países que abrigam um grande número de refugiados, como o Líbano, onde há mais de um milhão de sírios, precisam de maior ajuda. Também destacou que o reassentamento, os vistos humanitários e a reunificação familiar são ferramentas que podem permitir aos refugiados encontrar a segurança em outros países, “não pelo tráfico, mas pelo que chamamos de vias legais”.
O Programa Mundial de Alimentos (PMA) informou na semana passada que tem dinheiro suficiente para dar assistência alimentar a 526 mil refugiados sírios na Jordânia, durante os primeiros cinco meses deste ano. “Esta é a primeira vez, desde dezembro de 2013, que recebemos fundos suficientes para garantir a assistência durante os cinco meses seguintes”, destacou Shaza Moghraby, porta-voz do PMA na Jordânia. Envolverde/IPS