Por Jeffrey Moyo, da IPS –
Harare, Zimbábue, 4/9/2015 – A África vive uma luta por terras virgens, mas desta vez não são britânicos, portugueses, franceses, nem outros colonialistas que buscam ocupar áreas não cultivadas, mas sim a população das cidades, que se volta para a agricultura urbana em um contexto de escassez de alimentos.
Os magros salários agravaram a situação de muitas pessoas, como Agness Samwenje, que vive no subúrbio densamente povoado de Mufaokose, nesta cidade, capital do Zimbábue, e descobriu que se dedicar à agricultura urbana é uma forma de complementar sua alimentação.
Esta professora de pré-escola que ocupou um terreno perto de uma granja, disse à IPS: “Esta mini-horta me ajuda a alimentar minha família, pois os US$ 200 que ganho por mês não são suficientes para dar comida a todos, já que meu salário é a única renda após a morte do meu marido há quatro anos, quando fiquei sozinha com três crianças em idade escolar. Gasto pouco dinheiro com comida, porque os cultivos do meu pequeno terreno complementam nossa alimentação”.
Para outros, como a moçambicana Silveira Sinorita, de 34 anos e desempregada, a agricultura urbana se tornou um trabalho com o qual procuram alimentar suas famílias. “Sem emprego, descobri que a agricultura nesta cidade é uma solução para minhas dificuldades de levar comida para casa porque cultivo minhas próprias batatas, verduras, feijões e milho fresco, e vendo o excedente”, contou à IPS, da cidade de Mutare, no Zimbábue, onde reside.
Forçados pela crescente carência de alimentos, agricultores urbanos em vários países africanos foram além do cultivo. Em cidades como Kampala, capital de Uganda, ou Yaundé, nos Camarões, muitos moradores criam aves, gado leiteiro e porcos. A agricultura urbana prolifera em muitos povoados e cidades da África, justo quando a Organização das Nações Unidas exorta todas as nações a erradicarem a extrema pobreza e a fome, seguindo os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM).
Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), mais de 800 milhões de pessoas no mundo praticam a agricultura urbana, amortizando o aumento do preço dos alimentos e a insegurança. Mas esta agência alerta que o número de pessoas que passam fome também aumentou para mais de um bilhão, sendo os “pobres urbanos particularmente vulneráveis”.
O problema é que a agricultura urbana na África costuma se chocar com a oposição das autoridades municipais que possuem terras. Os especialistas afirmam que é uma política que não tem sentido diante da insegurança alimentar. “A pobreza não perdoa nem os moradores de cidades pela escassez de emprego no continente e, portanto, a agricultura urbana se torna rapidamente uma tendência, porque as pessoas são obrigadas a complementar sua alimentação, apesar de a atividade ser proibida em povoados e cidades”, explicou à IPS Norman Hwengwer, funcionário do Departamento de Agricultura. No Zimbábue a agricultura está proibida em terrenos baldios.
A FAO também assinala que as hortas comerciais sofrem a maior ameaça, devido ao crescimento acelerado do continente e também por não costumarem estar reguladas nem contar com apoio governamental. De fato, na pesquisa Potencial de Crescimento: Agricultores Urbanos da África, realizada em 2011 pela estudante de doutorado da Universidade Colégio de Londres, Anna Plyushteva, afirma que é necessária uma participação maior do governo para superar a marginalidade e a ilegalidade, a fim de conseguir maiores benefícios sociais e ambientais.
“Sem regulamentação, a agricultura urbana pode acarretar problemas graves. Atualmente, os agricultores informais e sua produção ficam expostos à contaminação de produtos orgânicos e inorgânicos, o que significa um grave risco para a saúde pública”, pontuou Plyushteva.
Para o especialista em desenvolvimento, Mulubwa Nakalonga, de Zâmbia, quanto mais pessoas emigram para as cidades, mais pressão agregam aos limitados recursos existentes. “Há uma crescente migração do campo a cidade na África, porque as pessoas buscam melhores oportunidades de trabalho que, no entanto, raramente encontram, e acabam se voltando para a agricultura em espaços abertos para poderem sobreviver, pois não têm dinheiro para comprar comida”, afirmou.
“Frequentemente, quando as pessoas emigram do campo, em qualquer lugar da África, se aferram ao seu patrimônio de práticas agrícolas se dedicando à agricultura urbana, e muitas pessoas a estão praticando para evitar passar fome”, disse Nakalonga. Em Dar es Salaam, capital da Tanzânia, por exemplo, as hortas urbanas em algumas comunidades se parecem com as que se vê nas zonas rurais, de onde as pessoas emigram.
Porém, algumas cidades apoiam as iniciativas de agricultura urbana. As autoridades da Cidade do Cabo, na África do Sul, por exemplo, aprovaram sua primeira política a respeito em 2007, se concentrando na importância da atividade para o alívio da pobreza e a geração de empregos.
A FAO projeta que haverá 35 milhões de agricultores urbanos na África em 2020, por isso apoia programas em alguns países a fim de capitalizar os benefícios. De fato, na República Democrática do Congo, o Programa de Horticultura Urbana da FAO aproveita as capacidades dos agricultores que emigraram para as cidades.
O programa começou em resposta ao êxodo do campo para as cidades após cinco anos de conflito, e agora ajuda os agricultores a produzirem cerca de 330 mil toneladas de verduras por ano, enquanto oferece empregos e renda a 16 mil produtores de pequena escala em povoados e cidades. Os agricultores venderam 90% de sua produção em mercados e supermercados, segundo a FAO, o que ajuda a alimentar uma população urbana que cresce porque as pessoas abandonam o campo em busca de segurança.
Em Nairóbi, no Quênia, várias organizações e agências ajudam a popularizar o conceito de “horta vertical em sacos”, que muitas pessoas nas cidades praticam, plantando em sacos com terra.
Como a fome golpeia tanto a população rural quanto a urbana na África, cada vez mais pessoas acreditam que a solução reside na agricultura urbana. Envolverde/IPS