Por Lyndal Rowlands, da IPS –
Nações Unidas, 28/4/2016 – Os 134 integrantes do Grupo dos 77 mais a China (G-77) deixaram sua marca no Acordo de Paris sobre mudança climática e agora devem adotar um programa de ação para implantá-lo, afirmou Ahmed Djoghlaf em entrevista à IPS.O argelino Djoghlaf, que foi um dos presidentes do Grupo de Trabalho Especial sobre a Plataforma de Durban para a Ação Melhorada, junto com o norte-americano Daniel Reifsnyder, pôde acompanhar de perto as negociações que levaram ao Acordo de Paris.
“Tendo presidido um dos comitês, posso dizer que o G-77 foi um destacado ator durante as negociações e que colaborou para o sucesso da conferência de Paris”, assegurouDjoghlaf.O G-77 deixou sua marca no Acordo de Paris após conseguir mobilizar numerosos países e subgrupos para “defender os interesses comuns das nações em desenvolvimento”, explicou.
O G-77 ajudou a encontrar um equilíbrio no texto “entre as questões de mitigação, importantes para os países ricos, e as de adaptação, que tocam de perto às nações em desenvolvimento”, acrescentouDjoghlaf.Segundo ele, “os que sofrem atualmente são os que menos contribuíram para a crise da mudança climática e utilizam seus próprios limitados recursos econômicos para enfrentar, adaptar-se e ajustar-se às consequências criadas por outros”.
“Espero que o G-77, sob a liderança da Tailândia, envie aos seus sócios, na próxima conferência das partes de Marrakesh, um rascunho do programa para construir capacidades que permitirão implantar o Acordo de Paris”, ressaltouDjoghlaf.A 22ª Conferência das Partes (COP 22) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC) acontecerá na cidade marroquina de Marrakesh entre os dias 7 e 18 de novembro deste ano.
Djoghlaf pontuou que “seria importante que as nações em desenvolvimento pudessem identificar suas próprias necessidades em matéria de construção de capacidades e que deixaram que outros o fizessem por elas. Também seria bom ter um marco para coordenar a cooperação Sul-Sul em matéria de mudança climática, semelhante ao Plano de Ação de Caracas sobre a cooperação Sul-Sul ou o Plano de Ação de Buenos Aires sobre a cooperação econômica e técnica”.
Citando Victor Hugo, Djoghlaf afirmou que “nenhum exército do mundo pode deter uma ideia para a qual chegou o momento, e creio que a cooperação Sul-Sul sobre a mudança climática é uma ideia para a qual chegou o momento.Dentro do G-77 há países emergentes que lideram no setor das energias renováveis e têm a responsabilidade de compartilhar sua experiência e permitir que outros países da mesma região ou mesmo grupo se beneficiem dela. Chegou a hora de o G-77 começar seu próprio programa de ação sobre mudança climática”.
Djoghlaf contou que, durante as negociações da COP 21, em Paris, muitos países do Sul tinham apenas um contato e às vezes aconteciam 15 reuniões ao mesmo tempo e algumas, inclusive, duravam até a noite. Ele propõe que uma forma de enfrentar essa carência é criar comitês nacionais, integrados por representantes de diferentes ministérios. “Não há um setor de atividade que não sinta o impacto negativo da mudança climática”, afirmou.
Porém, muitos ministérios dos países do Sul em desenvolvimento não podem se concentrar no tema porque têm outras prioridades. No entanto, há provas a favor de um enfoque mais transversal. Por exemplo, Djoghlaf citou uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde (OMS) segundo a qual cerca de sete milhões de pessoas morrem por ano devido à poluição do ar, o que prova que a mudança climática também deve ser uma prioridade dos ministérios da Saúde.
O Acordo de Paris, que é universal, ao contrário do Protocolo de Kyoto, é “muito equilibrado” e vai durar anos, porque leva em conta a evolução das capacidades e das responsabilidades dos países, explicou Djoghlaf, ressaltando que “necessitamos de uma solidariedade climática mundial Norte-Sul e Sul-Sul”. “Sem julgar o passado, quem é responsável agora, quem será amanhã, quem foi ontem. Estamos no mesmo barco, no mesmo planeta e temos que contribuir segundo nossas capacidades”, explicou.
Djoghlaf descreveucomo “sem precedentes a assinatura do Acordo de Paris, no dia 22, quando 175 países o fizeram e 15 aportaram seus instrumentos de ratificação”.“Isso nunca havia ocorrido”, ressaltou, se referindo aos países em desenvolvimento que ratificaram o acordo. “É uma mensagem política contundente e uma demonstração de liderança. Está claro que o Acordo de Paris entrará em vigor antes da data originalmente prevista de 2020. Começou a contagem regressiva e não podemos nos permitir nenhum atraso”, destacou.
Djoghlaf também disse que não preocupam as mudanças na política interna dos Estados Unidos. “Quando faz parte do Acordo de Paris, um Estado não pode se retirar antes de três anos após sua entrada em vigor. Além disso, creio que no longo prazo esse histórico tratado é de interesse de todos, incluídos os Estados Unidos”, em parte porque chegará um momento em que os combustíveis fósseis desaparecerão, ressaltou.
Djoghlaf observou que o investimento em energias renováveis aumentou seis vezes entre 2014 e 2015.Um dos aspectos notáveis do Acordo de Paris é o que Djoghlaf citou como um “artigo completo sobre educação e geração de consciência”. “Trata-se de garantir que cada cidadão do mundo, em particular dos países em desenvolvimento, tenham plena consciência das consequências da mudança climática e que é preciso cada um dar sua contribuição para enfrentar a mudança climática”.
Segundo Djoghlaf, “também é necessário educar a população mundial sobre a necessidade de se levar um estilo de vida sustentável. Essa sociedade do descarte não pode continuar existindo para sempre e precisamos estabelecer um modelo sustentável de produção e consumo”.Porém, Djoghlaf, que foi secretário executivo do Convênio sobre a Diversidade Biológica, se preocupa pelo fato de as negociações de 2015 não refletirem de forma adequada a relevância dos ecossistemas e da biodiversidade.
“Os ecossistemas e a biodiversidade saudável têm um papel fundamental na luta contra a mudança climática”, enfatizouDjoghlaf, acrescentando que as florestas absorvem 30% do dióxido de carbono e os oceanos outros 30%.“Cada respiração nossa devemos às florestas, e também aos oceanos. Os mangues também podem dar uma grande contribuição, assim como as terras e os solos férteis têm um enorme papel a cumprir. A biodiversidade é parte integral da resposta climática mundial”, concluiu. Envolverde/IPS