Nova Délhi, Índia, 10/4/2015 – Um em cada cinco idosos sofre abusos físicos e/ou emocionais quase diariamente na Índia, um em cada três, uma vez por semana, e um em cada cinco, uma vez por mês, segundo uma pesquisa que mostrou como uma estrutura social que diz valorizar a família, despreza um crescente setor dela.
Uma pesquisa da organização HelpAge India, dedicada a atender os idosos, concluiu também que, a cada segundo, um idoso (toda pessoa de 60 anos ou mais) sofre abusos por parte de sua própria família, um problema que ocorre igualmente em todas as classes sociais e em todo o país. O estudo Estado dos Idosos na Índia 2014, realizado em 12 cidades desse país, concluiu que uma das causas do abuso é que dependem economicamente de seus descendentes.
Alguns especialistas explicam que o desprezo pelas pessoas mais velhas, antes reverenciadas e idolatradas na sociedade indiana, pode ser atribuído em grande parte à mudança na conjuntura social na terceira maior economia da Ásia, onde vivem cem milhões de maiores de 60 anos.
“A rápida mudança de valores e estilos de vida, os empregos exigentes, a migração do campo para a cidade, a mudança para uma estrutura familiar nuclear e a redefinição de prioridades desembocam nessa indesejável situação”, explicou à IPS o professor visitante Veena Puirhoit, na Universidade Jawaharlal Nehru, de Nova Délhi.
O segundo país mais populoso do mundo, com 1,25 bilhão de habitantes experimentou uma transição demográfica drástica nos últimos 50 anos, quando quase triplicaram os maiores de 60 anos, segundo estatísticas oficiais. O padrão se manterá, pois os especialistas projetam que a proporção de pessoas com mais de 60 anos aumentará de 7,5% da população, em 2010, para 11,1%, em 2025.
Em 2050, a Índia terá 48 milhões de pessoas maiores de 80 anos e 324 milhões com mais de 60, segundo a Divisão de População das Nações Unidas (UNPD), mais do que a população dos Estados Unidos em 2012. A população acima dos 80 anos é a que cresce mais rápido, a um ritmo de 700%, estima a HelpAge. Isso é atribuído ao aumento da expectativa de vida, que disparou de 40 anos, em 1960, para 68,3, atualmente.
Isso “causou mudanças fundamentais na pirâmide de idade do país, que registrou o envelhecimento de sua população”, apontou à IPS a presidente da Anurgraha, Aabha Choudhury, organização dedicada a atender idosos. A demanda não satisfeita por serviços e instalações especiais para esse setor da população piora a situação, acrescentou.
“Os benefícios detalhados na política estatal para idosos ainda não chegam aos seus beneficiários. Há uma carência de infraestrutura na atenção geriátrica e uma falta de consciência entre o grupo-alvo e os provedores de serviços”, explicou Choudhury. O irônico é que, apesar de ter uma expectativa de vida maior e um rápido crescimento econômico, a maioria dos idosos continua sendo pobre. Menos de 11% têm algum tipo de pensão, segundo pesquisas nacionais, e suas economias são baixas.
As próximas décadas ameaçam se converter em um desafio sem precedentes de morbidade e mortalidade em todo o país, segundo o estudo Saúde dos Idosos: Desafios de Acesso e Acessibilidade. Segundo o UNPD, 13% dos idosos entrevistados têm algum tipo de incapacidade que os impede ter uma atividade cotidiana. Mais de um quarto do grupo etário tem baixo peso e quase um terço sofre hipertensão. Além disso, aproximadamente 60% vive em lugares sem saneamento.
A participação no mercado de trabalho desse setor da população é alta, especialmente nas áreas rurais, segundo uma pesquisa sobre famílias. Muitos não só trabalham para ganhar a vida, como alguns inclusive ajudam seus filhos adultos que vivem em suas casas e trabalham em suas fazendas. O governo da Índia investe nos jovens com a esperança de que contribuam com a economia, mas a ajuda para os mais vulneráveis continua sendo ruim.
O Programa Nacional Indira Gandhi de Pensão para a Velhice concede US$ 5 por mês aos maiores de 60 anos pobres, o que muitos consideram um insulto. “Os indianos têm de trabalhar o mais possível para se manter”, explicou um empregado da Life Insurance Corporation. “Os programas de seguro e pensão só acolhem 9% dos homens do meio rural e 41,9% do setor formal nas cidades. Entre as mulheres, os números são ainda menores”, disse o funcionário.
Na Índia, os seguros oferecem poucas alternativas e cobrem poucas pessoas. As pesquisas nacionais de família e saúde indicam que apenas 10% delas têm pelo menos um integrante da família coberto por algum tipo de seguro-saúde.
“É urgente que a atenção médica de qualidade esteja à disposição e seja acessível para os idosos. Também devem ser oferecidos a eles reabilitação, apoio domiciliar ou comunitário para deficientes e cuidados paliativos para atender problemas de saúde entre os idosos”, afirmou Vinod Kumar, integrante do Grupo para a Proteção e o Bem-Estar dos Idosos, criado pela Comissão Nacional de Direitos Humanos em 2009.
Também deve ser acelerada a criação da Comissão Nacional para os Idosos, prevista para supervisionar o respeito dos direitos desse setor da população, explicou Kumar. Sugan Bhatia, vice-presidente da Confederação de Pessoas Idosas Todo Índia, lamentou que o governo não ofereça atenção médica a esse setor da população.
Como signatário do Plano de Ação Internacional de Madri sobre o Envelhecimento e outras declarações das Nações Unidas, o governo promulgou em 2007 a Lei sobre Manutenção e Bem-Estar dos Pais e Pessoas Idosas, que converte em obrigação para filhos e herdeiros cuidarem de seus idosos. No entanto, o problema é muito mais do que econômico ou legal, é também emocional. Envolverde/IPS