Internacional

Igualdade de gênero é uma meta distante

Em Ladakh, na Índia, o alto desemprego não deixa muitas opções às mulheres, que em sua maioria têm pouca educação formal. Foto: Neeta Lal/IPS
Em Ladakh, na Índia, o alto desemprego não deixa muitas opções às mulheres, que em sua maioria têm pouca educação formal. Foto: Neeta Lal/IPS

Por Neeta Lal, da IPS – 

Nova Délhi, Índia, 11/1/2016 – As mulheres são quase metade dos 1,25 bilhão de habitantes da Índia, mas a igualdade de gênero – na política, economia, educação ou saúde – continua sendo um sonho distante para a maioria, como confirma o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) em seu Informe sobre Desenvolvimento Humano (IDH) 2015.

O Pnud coloca a Índia no 130º lugar entre 155 países em seu Índice de Desigualdade de Gênero (IDG), atrás da maior parte da Ásia, inclusive de países menos industrializados, como Bangladesh e Paquistão, que ocupam os lugares 111º e 121º, respectivamente.

O IDG se baseia em três parâmetros: saúde reprodutiva, empoderamento e atividade econômica. O desempenho desse país, péssimo nos três, é especialmente preocupante quanto à representação das mulheres no poder legislativo. As mulheres ocupam apenas 12,2% das cadeiras parlamentares na maior democracia do mundo, contra 19,7% no Paquistão, 20% em Bangladesh e 27,6% no Afeganistão.

A mortalidade materna da Índia é uma das maiores do mundo, com 190 mortes em cada cem mil nascidos vivos, em comparação com 170 mortes tanto em Bangladesh quanto no Paquistão, segundo o IDH. Somente 27% das mulheres recebem educação secundária, contra 34% em Bangladesh. Quanto à participação feminina no trabalho, a Índia apresenta 27%, contra 57% de Bangladesh.

A Índia apenas supera levemente o restante do sul da Ásia quanto à natalidade entre adolescentes – o número de nascimentos para cada mil mulheres de 15 a 19 anos –, que melhorou marginalmente de 0,61 para 0,563.

As feministas afirmam que a baixa pontuação da Índia no IDG não é de se estranhar, devido à feroz resistência à mudança e à arraigada mentalidade patriarcal que imperam no país. “Há anos que estamos no fundo da pirâmide da igualdade de gênero. Qual a novidade?”, perguntou Ranjana Kumari, diretora do Centro de Pesquisa Social, uma organização sem fins lucrativos com sede em Nova Délhi.

“Apesar de agora a agenda de gênero ter maior visibilidade na Índia, esse impulso positivo não se expressou em maior investimento para as mulheres nos diferentes setores, devido à contínua discriminação e às leis e políticas ineficazes”, apontou Kumari à IPS. Segundo a ativista, um dos instrumentos fundamentais para a mudança, o projeto de lei de Cotas para a Mulher, que pretende outorgar 33% das cadeiras legislativas às mulheres, ainda não foi aprovado pela câmara alta, a Rajya Sabha, embora a câmara baixa, a Lok Sabha, o tenha aprovado em 2010.

“Enquanto esse requisito básico não for abordado, as mulheres indianas não estarão verdadeiramente empoderadas”, destacou Kumari. De acordo com algumas mulheres que se dedicam à política, os partidos as excluem baseados na percepção comum de que as mulheres não têm capacidade para ganhar. “Aquelas que conseguem ganhar as eleições, têm que trabalhar o dobro para demonstrar seu valor em comparação aos homens”, afirmou uma política que conversou com a IPS sob a condição do anonimato.

Isso acontece apesar de a Constituição consagrar o princípio da igualdade de gênero. O marco jurídico, bem como as políticas e os planos de desenvolvimento apontam para a promoção e a igualdade das mulheres. A Índia, como signatária da Declaração do Milênio, aprovada na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em setembro de 2000, reafirmou seu compromisso com a promoção da igualdade de gênero.

“Esses objetivos não são apenas desejáveis em si mesmos, mas são fundamentais para se conseguir os demais Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) da ONU”, afirmou Abha Khatri, ex-professora de ciências políticas na Universidade de Nova Délhi. Para ela, “também são necessárias a cota de 33% de mulheres nos órgãos locais, nas legislaturas estatuais e no parlamento; o fim de todas as formas de violência contra a mulher; fazer com que a participação das mulheres na educação seja segura; a eliminação da escolha do sexo antes do nascimento, e acesso universal à saúde sexual e reprodutiva”.

A Índia se transformou na terceira economia da Ásia, depois de China e Japão, mas seu produto interno bruto (PIB) de mais de US$ 2 trilhões não beneficia as mulheres, afirmam os economistas. De fato, a participação feminina no trabalho baixou de 35%, em 1990, para 27%, em 2013. Um informe da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre as tendências mundiais do emprego em 2012, concluiu que muitas mulheres indianas só podiam encontrar trabalhos marginais na economia informal, com salários baixos e pouca ou nenhuma seguridade social.

Embora mais de 60% das mulheres urbanas integrem o setor informal, o desemprego daquelas com diploma de pós-graduação continua sendo de 15,7%, segundo o informe. Aproximadamente 20% das mulheres urbanas trabalham como empregadas domésticas, faxineiras, vendedoras ambulantes ou em lojas. Quase 43% têm um emprego autônomo e a mesma proporção um emprego remunerado, segundo dados da Organização Nacional de Pesquisas correspondentes a 2011.

Aproximadamente 46% das mulheres urbanas assalariadas não recebem pagamento da previdência, nem benefícios trabalhistas, enquanto 58% carecem de contratos de trabalho escritos.

Um exemplo é Archana Desai, de 35 anos. Essa mulher de Nova Délhi perdeu seu emprego em uma rede varejista multinacional devido a cortes orçamentários. Embora tenha diploma em administração de empresas, ela agora trabalha com professora em tempo parcial em uma escola onde ganha uma fração de seu salário anterior. “Embora tecnicamente esteja qualificada para ocupar a posição de gerente, tenho que me conformar com algo que não gosto. Por que o governo não pode dar empregos às mulheres como eu?”, perguntou.

Resolver os problemas do desemprego feminino pode ser algo profundamente transformador para a economia do país, segundo o informe O Poder da Paridade: O Avanço da Igualdade das Mulheres na Índia, da consultoria norte-americana McKinsey Global Institute. A melhoria na paridade de gênero no local de trabalho na Índia agregaria a arrepiante quantia de US$ 2,9 trilhões ao seu PIB até 2025, ressalta o documento.

As mulheres constituem quase 30% do total de trabalhadores do país. Falta adotar políticas mais rígidas para cumprir o princípio de igualdade de oportunidades trabalhistas e salariais reconhecidas pela lei sobre igualdade de remuneração, de 1976. Algumas medidas procuram paliar a iniquidade de gênero. O governo anunciou uma cota de 33% para as mulheres nas forças policiais, para os postos de agente de polícia até subinspetores, a fim de tornar a polícia mais sensível ao gênero.

“A chave para conseguir a igualdade de gênero está nos recursos. Necessitamos orçamento e dinheiro que seja destinado e gasto efetivamente na obtenção desses objetivos com perspectiva de gênero”, afirmou Kumari. Envolverde/IPS