Internacional

Índia luta contra a má nutrição

IndiaPor Stella Paul, da IPS – 

Dharni, Índia, 16/11/2015 – Na penumbra de sua choça, na aldeia de Berdaballa, Babita Mavaskar observa uma paramédica que examina seu bebê recém-nascido até que sai e diz: “Está tudo bem, o peso, a temperatura e a altura. Tudo está normal”. Os conhecidos que aguardavam do lado de fora respiram aliviados. A comunidade tribal do oeste da Índia luta, com ajuda de médicos e paramédicos, contra dois males que perturbam sua vida há décadas: a fome crônica e a má nutrição severa. É uma saga interminável de pobreza crônica e fome extrema.

Berdaballa é uma das 312 aldeias tribais da reserva de tigres Melghat, um dos destinos turísticos mais populares da Índia, a 610 quilômetros de Mumbai. Mas, desde o final da década de 1990, centenas de crianças morrem por ano, a maioria por má nutrição aguda. Um informe do Instituto de Ciências Médicas Mahatma Gandhi estima que, nessa região, morrem 460 crianças por ano, e que 75% das menores de cinco anos sofrem má nutrição, proporção bem acima da média nacional de 42,5%.

“Têm uma má e inadequada qualidade alimentar. Sua dieta consiste principalmente em pão e lentilha, que não oferecem nutrientes suficientes, explicou o médico Ashish Satav, diretor da Mahan Trust, uma organização que dá assistência médica gratuita e capacitação para populações indígenas. Satav realiza, desde 1997, estudos nas populações tribais para determinar as causas e a dimensão da má nutrição na região e encabeça uma equipe de médicos e paramédicos que procura evitar a má nutrição severa em 15 povoados indígenas.

Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), a Índia reduziu a pobreza extrema pela metade dentro dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), passando de 49,4%, em 1994, para 24,7%, em 2011. Mas os avanços na erradicação da fome são lentos. O país ainda concentra 25% da população mundial subalimentada, mais de um terço dos menores de baixo peso e quase um terço das pessoas que sofrem insegurança alimentar.

O médico Ambadas Adhav, que trabalha para a Mahan Trust em Melghat, disse que 90% dos moradores não podem viver de suas hortas, porque dependem das chuvas. Por isso, de novembro a junho há uma maciça migração de pessoas em busca de trabalho nas cidades. “Mas, como têm pouca ou nenhuma formação, os moradores das florestas costumam sofrer exploração trabalhista na cidade”, ressaltou.

Em agosto, o marido de Babita, Kashiram Mavaskar, passou a ser diarista em Akola, cidade a 150 quilômetros da aldeia, para poder sustentar seus pais idosos e sua mulher grávida. Mas, com as 50 rúpias (US$ 0,70) que ganha por dia, bem abaixo do salário mínimo de 366 rúpias (US$ 5,5), tem dificuldade de economizar para voltar para casa. “Agora que chegou o bebê, quero que meu marido esteja em casa. Mas ele diz que não será possível porque ainda não tem dinheiro”, contou Babita, de 28 anos.

O círculo vicioso de fome e pobreza crônica se agrava com o casamento precoce, outra das razões da generalizada má nutrição em Melghat. “As meninas costumam casar antes dos 15 ou 16 anos. Quando têm filhos, os bebês nascem com baixo peso, causando uma grave má nutrição e doenças relacionadas, que podem ser causa de morte”, pontuou Adhav.

Suman Madhu, da vizinha aldeia de Semadoh, casou em 2014 aos 16 anos, e teve um aborto espontâneo aos 17, quando estava com seis semanas de gravidez. Desde então se encontra muito fraca até para se levantar da cama. “Seus braços parecem o punho de um menino. Os médicos disseram que se casou muito jovem, mas em nossa comunidade todas as meninas se casam nessa idade”, explicou sua tia, Sindhu Bai.

Na vizinha Maharashtra, a prevalência do baixo peso em menores de cinco anos é de 37%, segundo dados oficiais. “O governo tem como prioridade os assuntos de má nutrição e implementa vários programas e mecanismos, como intervenções diretas”, afirmou Maneka Sanjay Gandhi, ministra do Desenvolvimento para a Mulher e a Infância. Entre os programas, destacam-se os Serviços Integrados de Desenvolvimento Infantil (ICDS) e o Esquema para o Empoderamento das Adolescentes Rajiv Gandhi (RGSEAG).

Os painéis incluem informação sobre como a má alimentação e o casamento precoce complicam o parto e prejudicam a saúde do bebê. Além disso, ensinam a preparar complementos alimentícios caseiros, explicam a importância do cálcio e do ácido fólico e apresentam os programas estatais de atenção a mães e filhos. Por fim, incentivam as famílias a terem sua própria horta.

Graças a todo esse trabalho, as 15 aldeias onde a Mahan Trust trabalha não têm casos de má nutrição severa, que caiu de 75% para menos de 4%, o que não é ruim segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), destacou Adhav.

Na medida em que o país entra na era dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), deve haver melhor relação entre a erradicação da pobreza e os êxitos em matéria de saúde, afirmam os especialistas. “Não podemos pôr fim às mortes por má nutrição sem relacionar todos os fatores do desenvolvimento social que a causam, como pobreza, alimentação, escassez de água e falta de alternativas para ganhar a vida”, apontou Satav. “Também devemos gerar maior conscientização, oferecer mais informação e motivar os prestadores de saúde a melhorar seus serviços”, acrescentou. Envolverde/IPS